O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), afirmou nesta segunda-feira, 26, que a estátua a Borba Gato será restaurada, com os custos pagos por um empresário de identidade não divulgada. Criticado por homenagear um bandeirante que "caçava" indígenas, o monumento foi incendiado no sábado, 24, por cerca de 20 pessoas.
- O Brasil maltrata o Brasil. Não foi o Borba Gato que queimou; fomos nós
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Grupo neonazista vandaliza estátua de George Floyd em Nova YorkEstátua de escravocrata derrubada em Bristol será o foco da exposição Black Lives MatterComo mito de estátuas gregas brancas alimentou falsa ideia de superioridade europeiaSabará, ''Terra de Borba Gato'', reage à polêmica com bandeiranteJuíza decreta prisão preventiva de suspeito de atear fogo à estátua de Borba GatoO motorista de caminhão que teria transportado os pneus até o local chegou a ser detido no domingo, 25, por policiais do 11º DP. "As investigações seguem para identificar e responsabilizar os demais envolvidos no caso", informou a Secretaria da Segurança Pública (SSP) em nota.
"Classificamos como lamentável e um ato de vandalismo. Não é fazendo um ato de vandalismo que vai poder discutir questões, mesmo que sejam dívidas do passado", disse Nunes a jornalistas em agenda pública nesta segunda. "É preciso ter bastante tranquilidade, respeitar a democracia, (ter) tolerância."
Uma técnica do Departamento de Patrimônio Histórico (DPH), vinculado à Secretaria Municipal de Cultura, acompanhou a limpeza da obra, que segue de pé. Nesta semana, uma avaliação sobre o estado do monumento será realizada por um especialista.
A partir do resultado da análise, será possível avaliar o custo e a duração do restauro. "Só não vou dizer aqui quem é (o empresário que pagará pela restauração) para não fazer propaganda da pessoa", acrescentou Nunes.
Em nota, a gestão municipal informou ainda que será reforçada a segurança no entorno do monumento, que está isolado por fitas. "A GCM (Guarda Civil Municipal) informa que irá aumentar o número de rondas pela praça Augusto Tortorelo de Araújo", apontou.
O monumento é criticado desde a inauguração, em 27 de janeiro de 1963, em meio aos festejos do IV Centenário de Santo Amaro. Na data, pessoas também desfilaram vestidas de bandeirantes e indígenas, com carros de boi, canoa e outros elementos.
O artista Julio Guerra, falecido em 2001, utilizou trilhos de bonde e pedras coloridas de basalto e mármore para executar a obra, que levou seis anos para ficar pronta. O monumento tem 13 metros de altura e 20 toneladas, estando sobre um pedestal revestido de granito rústico, de cerca de 2 metros de altura.
Entenda quem foram os bandeirantes e por que eles são homenageados em São Paulo
Homenagens a figuras históricas como os bandeirantes, no Brasil, ou de traficantes de escravos têm passado por uma revisão de seus significados na história - como perpetuadores do racismo estrutural - e levantado o debate em torno da representatividade em espaços públicos. Elas são frequentes também na cidade de São Paulo, em monumentos, nome de ruas, rodovias e até dão nome ao palácio do governo estadual.
Os bandeirantes eram homens que trabalhavam na região sudeste com a exploração de minérios, escravização de indígenas e captura de escravos fugitivos no século 17. São Paulo estava na margem da colônia brasileira; foi, por muito tempo, uma região indígena e jesuítica, e veio a se urbanizar com maior intensidade apenas no final do século 19.
Não eram, contudo, conhecidos como "bandeirantes" durante a época em que atuaram. O termo foi cunhado por historiadores contemporâneos, como Affonso Taunay, que dirigiu o Museu Paulista a partir de 1917. Até então, eram conhecidos apenas como "paulistas" ou sertanistas.
Nem sempre foram figuras celebradas. Eram, inclusive, vistos de maneira negativa até o século 17, quando tinham fama de mercenários e representavam um perigo para os aldeamentos.
Essas narrativas, contudo, acabaram por apagar todo um histórico de violências cometidas pelos bandeirantes. Além das invasões e saques a aldeamentos, escravizavam comunidades indígenas e violentavam as populações originárias, principalmente as mulheres, reforça Angatu.
A escultura do Borba Gato já foi alvo de protestos de grupos indígenas contrários à manutenção das peças em espaços públicos./COLABOROU BRENDA ZACHARIAS