Na tarde desta quarta-feira (11/8) duas entidades ligadas ao movimento negro entraram na Justiça contra o supermercado Assaí Atacadista, onde um homem negro foi obrigado a tirar a roupa para provar que não tinha roubado produtos do local. O caso aconteceu no interior de São Paulo, em Limeira.
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Homem negro é obrigado a ficar de cueca em supermercado; veja Carrefour fecha acordo e vai pagar R$ 115 milhões após morte de Beto FreitasPolícia indicia seis pela morte de João Alberto em Carrefour de Porto AlegreRacismo e injuria racialPoliciais se enganam e dão voz de prisão ao juiz que expediu o mandadoAs entidades são as mesmas que processaram o Carrefour no ano passado, após um episódio de racismo contra um homem negro, que foi morto pelos seguranças de uma unidade localizada em Porto Alegre.
A vítima da vez é o metalúrgico Luiz Carlos da Silva, de 56 anos, que foi abordado por dois seguranças suspeitando que ele teria furtado produtos da loja na última sexta-feira (9/8). Um vídeo gravado no momento, mostra o homem chorando e rodeado de seguranças.
Segundo o advogado Márlon Reis, sócio do Escritório de Advocacia Márlon Reis & Estorilio, a ideia da ação é impor medidas de reparação que modifiquem a conduta do supermercado e não só indenizar em dinheiro.
"A ideia é, a partir do caso trágico envolvendo a humilhação do senhor, mostrar a necessidade de se despertar para o racismo estrutural no Brasil. Então, para que a rede Assaí, não só repare os danos dessa ação, como se atente para a importância de mudanças em suas políticas", disse.
"A ação tem um monte de requerimento de mudanças de padrões, com protocolos, treinamentos, relações com fornecedores e favorecimento da transparência, com permissão expressa para que hajam filmagens de quaisquer pessoas dentro da área do supermercado. Além disso, o pagamento de uma indenização por danos morais coletivos, que estamos propondo que seja na ordem de R$ 100 milhões".
O valor proposto não será encaminhado para a vítima ou entidades que moveram a ação. Os recursos serão usados em projetos sociais. "Esse valor não vai para as entidades que estão propondo ou advogados. O recurso vai para a sociedade, pelo Fundo de Diretos Difusos, que é previsto em lei, ou ele já pode ir direto para projetos sociais".
Racismo estrutural
No processo as autoras "requerem por meio da presente Ação Civil Pública a prestação de tutela jurisdicional para reparação de dano moral coletivo e dano social infligido à população negra e ao povo brasileiro de modo geral, em razão de abordagem ilícita e vexatória cometida por agentes das rés em desfavor de consumidor negro".
A atitude dos seguranças no Assaí Atacadista é descrita como parte de um racismo estrutural, segundo o advogado. "Racismo estrutural se combate com uma postura antirracista. Isso significa a adoção de medidas concretas, pré-orientadas à esta finalidade. Não se pode encarar o racismo estrutural fingindo que não existe. Ele existe e precisa ser combatido e a melhor maneira de se fazer isso é estabelecer novos padrões de comportamento que vão ajudando a remodelar as ações", afirma Márlon.
Ao todo, 21 medidas foram propostas no processo, entre elas: inserir cláusulas antirracistas em todos os contratos com fornecedores e prestadores de serviço; permissão a todos os clientes e terceiros para que filmem abordagens realizadas no interior ou nas imediações dos prédios da empresa; revisão imediata dos protocolos de abordagem de segurança no interior das lojas; contratação de pessoas negras respeitando a representatividade racial da população de cada estado do país.
"Nós acreditamos na ideia de uma grande união em torno dessas causas. Não se trata de afetar uma pessoa negra, mas afetar a negritude brasileira. E precisamos construir a igualdade efetiva. Existe uma antiga percepção social, que uma pessoa negra num supermercado é suspeita e isso se repetiu no Carrefour e agora no Assaí. Nós sabemos que isso acontece com muita frequência e essa cultura precisa acabar", finaliza o advogado.
O que é racismo?
O artigo 5º da Constituição Federal prevê que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.”
Desse modo, recusar ou impedir acesso a estabelecimentos, recusar atendimento, impedir ascensão profissional, praticar atos de violência, segregação ou qualquer outra atitude que inferiorize ou discrimine um cidadão motivada pelo preconceito de raça, de etnia ou de cor é enquadrado no crime de racismo pela Lei 7.716, de 1989.
Desse modo, recusar ou impedir acesso a estabelecimentos, recusar atendimento, impedir ascensão profissional, praticar atos de violência, segregação ou qualquer outra atitude que inferiorize ou discrimine um cidadão motivada pelo preconceito de raça, de etnia ou de cor é enquadrado no crime de racismo pela Lei 7.716, de 1989.
Qual a diferença entre racismo e injúria racial?
Apesar de ambos os crimes serem motivados por preconceito de raça, de etnia ou de cor, eles diferem no modo como é direcionado à vítima. Enquanto o crime de racismo é direcionado à coletividade de um grupo ou raça, a injúria racial, descrita no artigo 140 do Código Penal Brasileiro, é direcionada a um indivíduo específico e classificada como ofensa à honra do mesmo.
Penas previstas por racismo no Brasil
A Lei 7.716 prevê que o crime de racismo é inafiançável e imprescritível, ou seja, não prescreve e pode ser julgado independentemente do tempo transcorrido. As penas variam de um a cinco anos de prisão, podendo ou não ser acompanhado de multa.
Penas previstas por injúria racial no Brasil
O Código Penal prevê que injúria racial é um crime onde cabe o pagamento de fiança e prescreve em oito anos. Prevista no artigo 140, parágrafo 3, informa que a pena pode variar de um a três anos de prisão e multa.
Como denunciar racismo?
Caso seja vítima de racismo, procure o posto policial mais próximo e registre ocorrência.
Caso testemunhe um ato racista, presencialmente ou em publicações, sites e redes sociais, procure o Ministério Público e faça uma denúncia.
*Estagiária sob supervisão do subeditor Eduardo Oliveira