A professora aposentada Carmem Morales foi morta por um homem que trabalhou como jardineiro para ela. Depois, ele enterrou o corpo da vítima e colocou plantas em cima para esconder o crime. Essa foi a conclusão da Polícia Civil sobre a morte da professora aposentada.
Carmem tinha 62 anos e morava sozinha em Ubatuba, no litoral norte de São Paulo. Ela desapareceu em agosto de 2013. Anos mais tarde, em janeiro de 2021, uma família que havia alugado a residência dela encontrou a ossada da mulher enterrada no jardim do imóvel.
No fim de julho, a BBC News Brasil contou sobre esse caso. Na reportagem anterior, a família que encontrou a ossada pediu que os nomes fossem alterados no texto porque a apuração sobre o crime ainda não havia sido concluída. Desta vez, os nomes reais serão citados.
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Após ser indiciado pela Polícia Civil, o homem foi denunciado pelo Ministério Público Estadual de São Paulo por latrocínio — roubo com morte — e ocultação de cadáver. Ele se tornou réu pela morte de Carmem.
Essa não é a primeira vez em que o homem se torna alvo da Justiça. Ele já foi preso por roubo antes da morte de Carmem e depois, em 2016.
A BBC News Brasil tentou contato com ele, um familiar negou que o homem tenha cometido o crime, mas disse à reportagem que ele não se pronunciará no momento, porque ainda não tem um advogado para representá-lo.
A investigação do crime
O mistério sobre o desaparecimento de Carmem foi esclarecido em janeiro deste ano, quando a ossada dela foi encontrada pelo analista de sistemas Glauber Duma e o filho mais velho dele.
Havia pouco mais de dois anos que a família do analista de sistemas tinha alugado a casa, que está sob a responsabilidade de um irmão de Carmem desde que a professora aposentada sumiu.
Glauber e o filho Leonardo estavam retirando as plantas do jardim da casa, para depois colocar grama, quando avistaram um pedaço de tecido embaixo da terra, desenterraram e viram que era um edredom.
"Fiquei sem reação. Foi horrível, você não quer acreditar que aquilo tá acontecendo contigo. Parece que o tempo congela. Passa um milhão de coisas na cabeça. Perde o chão", disse Glauber à BBC News Brasil em julho, sobre o momento em que descobriu que havia uma ossada humana no edredom.
Um laudo confirmou posteriormente que se tratava de Carmem Morales. A Polícia voltou a investigar o caso, que tinha sido arquivado anteriormente.
Na época em que Carmem desapareceu, a falta de comprovação de que ela realmente estava morta impediu o avanço da investigação policial. Suspeitas como a de latrocínio não seguiram adiante por falta de provas.
Desde que a investigação sobre o caso foi reaberta, Rafael foi considerado o principal suspeito. Alguns elementos da apuração sobre o desaparecimento dela foram fundamentais neste ano: o acusado prestou serviços de jardinagem para Carmem, o homem sabia que ela vivia sozinha e ele foi apontado por testemunhas como o responsável por fugir com o carro da mulher no período em que ela desapareceu.
No jardim da casa da vítima, um ponto chamou a atenção após a ossada ser encontrada: havia lírios-da-paz plantados especificamente na parte em que o corpo foi enterrado. Para as autoridades policiais, foi um forte indicativo de que o crime foi cometido por alguém com conhecimento sobre jardinagem.
Em agosto de 2013, conforme a polícia, o acusado ficou dois dias na casa da vítima. Nesse período, ele teria matado Carmem de forma violenta porque queria "obter vantagem econômica". Segundo o inquérito, ele enterrou a vítima no jardim "visando garantir a impunidade do delito".
A perícia não conseguiu apontar a forma como ela foi morta, mas segundo a polícia não há indícios de tiros ou facadas, por isso uma das suspeitas é de que ela tenha sido estrangulada.
De acordo com a apuração da Polícia Civil de Ubatuba, ele fugiu com o carro de Carmem após enterrá-la no jardim. No veículo da vítima, havia objetos da residência dela, como um violão e uma cafeteira, e a bicicleta do acusado.
Dois homens estavam perto da casa de Carmem no momento da fuga e relataram que o acusado fugiu do local "cantando pneu". Pouco depois, segundo a polícia, ele deixou o automóvel cair em uma valeta em uma rodovia e fugiu na bicicleta, carregando o violão da vítima.
Nessa fuga, conforme a investigação, um guarda civil encontrou o suspeito carregando o violão na bicicleta. O acusado chegou a ser parado e revistado, mas, segundo o guarda, ele não carregava nada de ilícito e não figurava como procurado pela Justiça. "Naquele momento também não havia notícia do desaparecimento de Carmem ou alguma queixa referente ao seu veículo, razão pela qual o denunciado foi liberado", detalha o inquérito policial.
Posteriormente, o automóvel de Carmem, com diversos objetos da vítima, foi encontrado por guardas civis e policiais militares.
O vizinho de Carmem reconheceu o homem que saiu com o carro dela na época em que a idosa desapareceu, segundo o inquérito policial. O guarda civil também reconheceu o suspeito como o homem que estava em uma bicicleta após o carro da vítima ser encontrado.
O processo sobre a morte de Carmem
Quando concluiu a investigação, em 4 de agosto, a Polícia Civil de Ubatuba encaminhou o inquérito ao Ministério Público Estadual de São Paulo, que dias depois ofereceu denúncia contra o suspeito por latrocínio e ocultação de cadáver, além de pedir a prisão preventiva (antes do julgamento, por tempo indeterminado) dele.
"No caso dos autos, o denunciado ceifou a vida da vítima e ocultou o corpo para garantir a impunidade do crime patrimonial, o que denota sua extrema periculosidade, personalidade violenta e marcadamente deturpada, além de total desprezo pela vida humana, sendo o cárcere cautelar imprescindível para resguardar o corpo social e também para garantir a aplicação da lei penal", assinalou o promotor de Justiça Fernando Fietz Brito, ao solicitar a prisão preventiva do acusado.
Ao aceitar a denúncia contra o suspeito, por considerar que há elementos suficientes para iniciar um processo criminal, o juiz Eduardo Passos Bhering Cardoso, da comarca de Ubatuba, negou o pedido de prisão preventiva contra o acusado. O magistrado argumentou que essa medida, usada quando há urgência para a prisão, deve ser determinada quando envolve um fato recente.
"O presente crime ocorreu em 2013, há 08 (oito) anos, prazo este não compatível com o requisito da contemporaneidade. Além disso, não há notícias de fatos novos a justificar a decretação da prisão preventiva para garantir a ordem pública e a aplicação da lei penal", assinalou em meados do mês passado.
O juiz ainda destacou que uma análise inicial do caso indica que o acusado roubou o carro e outros bens da vítima. Porém, ressaltou que não há, ao menos por ora, "indícios de autoria suficientes para decretar a prisão preventiva do investigado".
Segundo o magistrado, não há elementos suficientes para determinar previamente, antes do aprofundamento do caso e do avanço do processo, "que o investigado matou a vítima". Como o processo ainda está em fase inicial, não há prazo para julgamento. Ao menos por enquanto, o réu responderá à Justiça em liberdade.
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