A utilização de uma fogueira no interior da caverna usada para treinamento de bombeiros civis em Altinópolis (SP) pode ter iniciado o processo de desabamento que terminou com a morte de nove alunos, no último domingo (31/10). O procedimento, que é de alto risco em cavidades rochosas, consta em fotos de outros cursos da escola.
Leia Mais
População se despede das nove vítimas da tragédia em caverna no interior SPO que se sabe sobre o acidente que matou 9 bombeiros no interior de SPPreso compartilhava no Tik Tok sua rotina de dentro da cadeiaO proprietário da empresa Real Life Treinamentos que ofertou o curso de resgate, Sebastião Francisco de Abreu Neto, confirmou que o líder dos instrutores acendeu uma fogueira na madrugada, mas disse que o procedimento não era padrão.
"Eu tive notícia depois que o menino saiu de que o Celso, comandante na hora, fez uma fogueira na gruta porque estava muito freio e estava esperando passar a chuva para poderem subir de volta, já que tinham cancelado o treinamento", disse.
"Mas a fogueira estava bem baixa, não estava alta. Mas não tinha conhecimento de que ele iria fazer fogueira lá. Esse não é o procedimento padrão da escola. O Celso tem Curso de Busca e Resgate em Áreas remotas e tem todo o conhecimento disso, agora, por quê colocaram, não sei te falar", afirmou Sebastião Neto.
Contudo, a reportagem do Estado de Minas encontrou várias fotografias e vídeos de fogueiras nas mídias sociais da escola que demonstram serem essas práticas dos treinamentos. O fogo era feito no interior de cavernas, sobretudo para inserir fumaça no ambiente e dificultar o treinamento.
Sobre as fotos e filmagens de fogo no interior rochoso, o proprietário tenta se justificar, dizendo que se tratavam de treinamentos no interior de fissuras de rochosas, com "apenas 3 ou 4 metros" de profundidade, o que já configura uma caverna.
"Isso aí (as fotos e vídeos) são do curso de salvametno em mata. Isso aí (a caverna) é uma pedra que dá em torno de 3 a 4 metros (de profundidade). Eles fazem como se fosse um espaço confinado. Então coloca fumaça lá dentro para poderem entrar e retira a vítima", afirma.
De acordo com os técnicos do IPT, essa é uma das causas que explicaria o desabamento do teto da Gruta Duas Bocas sobre os alunos em treinamento. "A questão da fogueira, esse aquecimento chegou no teto, pois é inclinado e bem baixinho", apontam.
"Está em estudo. De fato pode ser um fator agravante essa fogueira, pois antigamente se abria um túnel em rocha esquentando madeira e fogo e jogava água. A rocha trinca e você vai lá e retira o material (rochas que desabavam). A caverna (Gruta Duas Bocas), durante o dia ou a noite, no frio, com aquele fogo, de certa forma pode aumentar uma fratura. Inclusive as horizontais", informam os especialistas do instituto.
"Há a questão até do vapor d'água. As fissuras com água e até a porosidade da rocha, esquentando aquilo aumenta a pressão (e pode ocorrer uma fratura)", acrescentam.
De acordo com o geógrafo e espeleólogo Carlos Frederico de Souza Lott, do Observatório Espeleológico, não fazer fogo dentro de uma caverna é regra básica de conservação e de segurança.
"Fogo em caverna não se faz em hipótese nenhuma. O único tipo de calor, para ter pontos quentes, se faz com o uso de fogareiros adequados, com chamas parecidas com a de um fogão e para evitar hipotermia".
De acordo com Lott, as fogueiras podem causar desabamento e intoxicação. "Era uma técnica antiga aquecer as cavernas para minerar no seu interior. Outro problema da fogueira é que a fumaça pode intoxicar e até sufocar em um ambiente confinado se não for controlada. Isso, sem falar que desequilibra todo esse frágil ecossistema", afirma.
A Polícia Civil de São Paulo informou ter aberto inquérito por homicídio culposo, quando não há intenção de matar, mas que tal desfecho se dá por imperícia, imprudência ou negligência.
Novas perícias serão realizadas a partir desta quarta-feira (03/11) para que se chegue a uma certeza sobre as causas do acidente.