"Meus alunos estão passando na UNIFESSPA! É escola pública, amiga! Só a gente sabe!", diz a professora Florência Pinto aos pulos e chorando de felicidade, no vídeo que viralizou na internet essa semana.
A professora é carinhosamente chamada de Flor e leciona em duas escolas na pequena cidade de Canaã dos Carajás, no Pará. Ela acredita que a educação é o único caminho.
"Sigo a docência porque eu acredito que a educação é o único caminho, foi ela que mudou a minha vida, que me tirou lá do interiorzinho do Maranhão, da pobreza, da roça, para estar hoje aqui, com uma vida confortável."
Lecionando em uma escola pública e em outra privada, ela fala da diferença de realidades. "Na rede particular, eu tenho toda a estrutura da escola que eu preciso. Tem livros à vontade, material didático, climatização, data show nas salas, acesso à impressão". E compara com a rede pública. "Já na escola pública, eu só tenho a liberdade de trabalho. Porque eu estou em uma sala que não tem porta, que o ventilador não presta, que a energia não presta. Canaã é uma região muito quente, tenho uma sala com mais de 40 alunos. Na pandemia triplicou a quantidade de alunos da escola, por conta das aulas remotas. Eu não tenho equipamento necessário", denuncia. Mas esclarece. "As realidades são diferentes, mas a professora é a mesma, o amor é o mesmo."
Para a educadora, as condições de trabalho do professor no Brasil são vergonhosas. "Não tem condições. O que a gente tem é resistência, coragem, força. Quando você olha para aquele aluno que está em uma situação mais difícil que um dia você passou, ou aquele aluno que tenta buscar alguma coisa e tem que ir ultrapassando todos os limites, você se sente na obrigação".
Sobre a valorização da categoria, Flor esclarece que não se trata apenas de um retorno financeiro. "Não é só aumentar o salário. Eu posso receber R$ 1 milhão, mas eu não tenho condições para trabalhar, como que faz?", se questiona. "Dá uma pequena porcentagem de aumento achando que está tudo bem e não está. Eu não tenho uma fotocopiadora, uma atividade legal que eu possa fazer, não tenho um espaço de atendimento", continuou.
Flor aponta de onde vem a maior valorização do trabalho do professor. "De todas as valorizações, o que mais me conforta é o carinho, o abraço e você ir dar aula on-line, por exemplo, e o menino está lá, botou o uniforme, ligou a câmera para ver você. É você dar uma palavra de conforto e te parabenizarem, te abraçarem virtualmente. Essa valorização deles, eu tenho. Eu sou extremamente respeitada e valorizada pelos meus alunos", se derrete.
VÍDEO VIRALIZADO
Com milhares de visualizações e compartilhamentos nas redes sociais, a professora diz que o "mico", valeu a pena. Com a voz embargada de emoção, ela relata o momento, revelando que na pandemia houve uma debandada dos alunos durante o período de aula on-line e que a escola criou aulões presenciais aos finais de semana, durante três meses.
"Foram muitas emoções. Foi uma das coisas mais belas que eu pude ter nesse início de ano. Em um momento que eu estava tão triste, diante dos desafios, porque a gente vem de um período de aula on-line, nossos alunos desaparecendo. Aí nossa escola, junto à coordenadora pedagógica Lorena, ao diretor, Renildo e todos outros professores, montamos os aulões e os meninos foram lá e participaram de todos".
"Aquele momento foi um turbilhão, foi o momento de dizer, 'vale a pena ser professor' nesse país com tanta desgraça, tão arrasados como está a educação. E para mim, é o resultado de que todo esforço vale a pena. E eu choro com eles, vibro com eles. Gritei muito, chamei um monte de palavrão, pulei", relembra.
Sobre o motivo de tamanha comoção em torno do vídeo, ela acredita que as pessoas viram um pouco de si nela. "Eu acredito que viralizou porque a gente já está tão sucateado de coisas ruins, tão desacreditados, tão desvalorizados, uma incerteza tão grande de tudo, que as pessoas viram um pouco delas em mim."
Ela conta que recebeu diversas mensagens de alunos lembrando de seus professores e de docentes que se inspiraram nela. "Eu fiquei tão feliz. Alunos lembrando dos seus professores, que eles tinham trilhado o mundo graças a esses professores. Uma educadora que disse que tinha acordado sem nenhum sentido para viver e que o vídeo tinha dado um sentido para ela seguir em frente na docência, que mudou a percepção dela quanto a educação". "Eu acho que estamos precisando disso, de esperança de acreditar. A gente precisa acreditar em uma educação melhor", completou.
Flor finaliza dizendo que valeu a pena. "Se esse vídeo alcançou um professor para ele ser resistência do sistema, no fazer pedagógico dele, valeu a pena o mico. Se esse vídeo serviu para os alunos, ex-alunos, respeitarem e valorizarem ainda mais, seguirem o ciclo de respeito dos seus professores, que aprendeu com seus professores. Se serviu para inspirar outras pessoas a buscarem a universidade, acreditar na educação pública, valeu a pena o mico".
Nas redes sociais, ela agradeceu todas as mensagens enviadas e diz que está tentando responder a todos.