O Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu nesta quarta-feira (23/2) o julgamento de dois recursos para definir se a lista de procedimentos de cobertura obrigatória para os planos de saúde, instituída pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), é exemplificativa ou taxativa. Na prática, os ministros devem definir se as operadoras são ou não obrigadas a cobrir o que não está no rol de procedimentos da ANS.
Leia Mais
TST decide não cobrir tratamentos de COVID-19 para servidores não vacinadosHomens armados param trânsito em Brasília para 'dama de vermelho' passarJulgamento de planos de saúde tem protesto e mobilização nas redes sociaisSTJ analisa pedido de pensão alimentícia para pets; especialista explica Integrantes de clube de tiro protagonizam cena de faroeste cabocloHomem esfaqueia três pessoas para ouvir música de Pabllo VittarO ministro Villas Bôas Cueva pediu vista (mais tempo para decidir). A definição da Corte sobre o tema impacta quase 49 milhões de usuários de planos.
O entendimento dos tribunais nos últimos 20 anos é de que a interpretação deve ser mais ampla. Assim, a justiça considera que a lista de procedimentos deve ser uma referência mínima ou exemplificativa, e em geral, entende que a obrigatoriedade de cobertura está além do rol.
O caso chegou ao STJ após uma divergência entre turmas do tribunal sobre o tema. A decisão é importante porque servirá como precedente para instâncias inferiores.
O julgamento teve início no ano passado, com o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, pela taxatividade da lista da ANS. Ele alegou que a elaboração do rol tem o objetivo de proteger os beneficiários de planos, garantindo a eficácia das novas tecnologias adotadas na área da saúde. Porém, o ministro ressalvou hipóteses excepcionais em que seria possível obrigar uma operadora a cobrir procedimentos não previstos na lista.
O julgamento foi interrompido pelo pedido de vista da ministra Nancy Andrighi, que discorda de Salomão. Ela considerou abusiva qualquer norma infralegal que restrinja a cobertura de tratamento para doenças listadas na Classificação Internacional de Doenças (CID), da Organização Mundial de Saúde. Ela foi a primeira a votar nesta quarta-feira.
Risco para tratamento de pessoas autistas e com outras doenças
Se o entendimento do STJ for pela taxatividade do rol da ANS, haverá mudança na jurisprudência em vários tribunais, com repercussões sobre ações em curso contra operadoras de saúde para garantir a cobertura de terapias e procedimentos negados.
Além disso, a mudança daria às operadoras de planos de saúde o direito de negar aos pacientes tratamentos que ainda não façam parte da lista da ANS, mesmo que tenham sido prescritos por médicos e com eficácia comprovada.
Exame diagnóstico para diferentes tipos de câncer, imunoterapia, cirurgia intrauterina para fetos, terapia que ensina habilidades específicas para pessoas com autismo (ABA) - com custos entre R$ 8 mil e R$ 10 mil por mês - além de canabidiol para casos de epilepsia refratária são alguns dos procedimentos que não seriam mais obrigatórios de cobertura para os planos de saúde.
Mobilização nas redes sociais
O apresentador Marcos Mion começou uma mobilização nas redes sociais para pressionar os ministros a decidirem pela interpretação exemplificativa.
No Instagram e no Facebook, Mion, que tem um filho autista, chamou a atenção para os riscos ao tratamento de pessoas na mesma condição, além de pacientes de várias outras doenças que têm procedimentos e terapias negados pelas operadoras.
Além dele, pais e mães de crianças com doenças raras e que precisam desses tratamentos estão protestando na frente do tribunal. Eles estão acorrentados às grades do STJ.
Voto da ministra
O julgamento foi retomado na tarde desta quarta-feira com o voto da ministra Nancy Andrighi. Ela se posicionou pelo entendimento de que o rol de procedimentos da ANS deve ser interpretado de maneira exemplificativa, discordando da fundamentação do voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão.
“Negar a natureza meramente exemplificativa do rol de procedimentos e eventos em saúde ou reconhecer a sua natureza taxativa é aceitar a exorbitância do poder regulamentar exercido pela ANS e, por conseguinte, a usurpação da competência legislativa da União. Implica, em síntese, demandar do consumidor um conhecimento técnico que ele, por sua condição de vulnerabilidade, não possui e nem pode ser obrigado a possuir”, disse Nancy.
“Ademais, importa na criação de um impedimento inaceitável de acesso do usuário às diversas modalidades de tratamento das enfermidades cobertas pelo plano de saúde e as novas tecnologias que venham a surgir, simplesmente por que ele não tem como prever a ocorrência dessas enfermidades ou a aparição dessas tecnologias e tampouco tem como conhecer os tratamentos possíveis no momento da tomada de decisão para a celebração do contrato”, completou a ministra.