Com o bicentenário comemorado ontem, a Independência do Brasil não se fez da noite para o dia, e a consolidação – a pacificação do Brasil como unidade –, demorou muitos anos ainda após a proclamação de 7 de setembro de 1822. Na sequência, nas chamadas Guerras da Independência, houve sérios conflitos entre as forças que apoiavam Dom Pedro I (1798-1834) e as tropas locais ainda fiéis ao governo português, o principal deles ocorrido na Bahia, entre 1822 e 1823.
Somente em 1825, com o Tratado de Paz e Aliança, foi oficializado o reconhecimento lusitano da emancipação brasileira, mas, “nos 67 anos do período imperial (da Independência à Proclamação da República, em 1889), houve diversos conflitos armados internos no Brasil, políticos e sociais, eclodidos em várias das 19 províncias existentes”, destaca o desembargador Marcos Henrique Caldeira Brant, pesquisador da história da Justiça brasileira e integrante do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG).
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Já em Minas, ocorreram dois importantes conflitos políticos armados: a Sedição de Ouro Preto de 1833 ou Sedição Militar de 1833 (Revolta do Ano da Fumaça), que durou 64 dias e envolveu vários municípios da província mineira, e a Revolução Liberal de 1842, envolvendo também São Paulo.
A BATALHA DE ANTA LUZIA
Para lembrar a Revolução Liberal, a cada 20 de agosto ocorre em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, uma cerimônia cívico-militar para reverenciar a memória dos que morreram na batalha final travada entre as tropas legalistas, comandadas pelo então Barão de Caxias (1803-1880), e as tropas revolucionárias, comandadas por Teófilo Otoni (1807-1869). No local chamado Muro de Pedras/Recanto dos Bravos há um monumento inaugurado no centenário do confronto (20 de agosto de 1942) para marcar o episódio.
Para compreender esse movimento, é necessário esclarecer que o Brasil era uma monarquia constitucional, na qual predominava o bipartidarismo entre os partidos Conservador e Liberal, explica Caldeira Brant. “Ambos tinham a mesma ideologia e eram representados pela elite dominante urbana e rural. Pouco se diferenciavam quanto aos métodos e processos de exercitar a política”, completa.
Na prática, a Revolução Liberal foi um movimento político armado, promovido pelo Partido Liberal e deflagrado nas duas mais importantes províncias do império: São Paulo e Minas Gerais. “Ele tinha como finalidade formar um corpo armado sólido e organizado para pressionar o governo imperial, o qual era composto e dirigido por membros do Partido Conservador e que estavam sendo acusados de violar leis e os princípios da Constituição de 1824, inclusive dissolvendo as assembleias legislativas das províncias.”
Em São Paulo, a revolução durou 30 dias, sendo sufocada rapidamente pelas tropas legalistas. “Já em Minas Gerais, durou 73 dias, pois foi caracterizada pela capilaridade e o grande envolvimento das elites de todos os quadrantes da província. Dos 42 termos (municípios) mineiros, 15 se declararam revolucionários. O movimento foi sufocado em 20 de agosto de 1842 em Santa Luzia, com a batalha final travada entre as tropas legalistas, comandadas pelo Barão de Caxias, e as tropas revolucionárias, comandadas por Teófilo Otoni.”
Vitorioso em Santa Luzia, Caxias consolida sua fama, e segundo descrição do Exército Brasileiro, entra aclamadíssimo em Ouro Preto, em 10 de setembro, “tendo antes, em 29 de agosto, sido promovido a marechal de campo graduado (atualmente general de divisão), aos 39 anos de idade”, segundo descrição do Exército.
Dois meses depois, assumia o Comando das Armas no Rio Grande do Sul, durante a Guerra dos Farrapos, com a missão de pacificar a província, o que aconteceria em 1º de março de 1845. Com uma sequência de campanhas bem-sucedidas que atingiriam o ponto alto na Guerra do Paraguai, receberia vários títulos de nobreza, sendo nomeado duque e chegando a ministro da Guerra, com papel decisivo em outros momentos da história do país. Hoje, o chamado Pacificador é patrono do Exército Brasileiro.
Da Independência à República
» Os conflitos ocorridos no Brasil entre 1822 e 1889
- 1822/23: Guerra da Independência da Bahia ou Independência do Brasil na Bahia
- 1824: Confederação do Equador (Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí)
- 1831/32: Levantes de “exaltados” ou restauradores radicais (Rio de Janeiro, Ceará e Minas Gerais)
- 1831/32: Novembrada, Abrilada (Pernambuco)
- 1832: Setembrada (Maranhão)
- 1832/33: Revolta dos Guanais ou Federalistas Baianos (Bahia)
- 1832/35: Cabanada (Pernambuco e Alagoas)
- 1834/40: Cabanagem (Pará e Amazonas)
- 1835/45: Guerra dos Farrapos ou Revolução Farroupilha (Rio Grande do Sul e Santa Catarina)
- 1837/38: Sabinada (Bahia)
- 1838/41: Balaiada (Maranhão, Ceará e Piauí)
- 1848/50: Insurreição Praieira (Pernambuco)
- 1874/75: Arruaças do Quebra-Quilo (Alagoas, Pernambuco e Paraíba)
» Em território mineiro, ocorreram dois importantes conflitos políticos armados:
- Sedição de Ouro Preto ou Sedição Militar de 1833 (Revolta do Ano da Fumaça) – De caráter restaurador da colônia e da antiga ordem política social, durou 64 dias e envolveu vários termos (municípios) da província mineira
- Revolução Liberal de 1842 – Caracterizou-se por ser um movimento político armado, promovido pelo Partido Liberal e deflagrado nas duas mais importantes províncias do império: São Paulo e Minas Gerais. Tinha como finalidade formar um corpo armado sólido e organizado, a fim de pressionar o governo imperial
Da Inconfidência à Independência
A edição de hoje encerra a série sobre os 200 anos do Grito do Ipiranga, publicada pelo EM desde domingo. Em cinco dias, as reportagens, apoiadas em documentos e depoimentos, demonstraram desde a influência da chamada Conjuração Mineira na emancipação do país à participação de mineiros no movimento que culminou com a proclamação de Dom Pedro I, passando pelo resgate da memória de Tiradentes e pelos marcos do 7 de Setembro pelo estado.