Felizmente, o presidente Jair Bolsonaro retornou a Brasília curado e, ao que tudo indica, disposto a fazer andar o seu governo. Nas mais de duas semanas em que ele esteve internado, praticamente nada andou. Temas relevantes, como a reforma da Previdência, provocaram mais ruídos do que consenso e mostraram uma base parlamentar fragmentada demais para aprovar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) tão polêmica. As tarefas esperadas por Bolsonaro são imensas.
Para retomar o controle do governo, contudo, Bolsonaro terá que começar o trabalho em casa. Precisa, urgentemente, explicar aos filhos que eles não têm cargos na administração federal e não podem misturar posições pessoais com as do Palácio do Planalto. A discussão pública entre Carlos Bolsonaro e o ministro da Secretaria-Geral, Gustavo Bebiano, abriu a mais séria crise dentro do governo num momento em que tudo o que o presidente precisa é de tranquilidade.
Bolsonaro deve, urgentemente, aparar as arestas que podem detonar problemas inadministráveis. Seu poderoso ministro da Economia, Paulo Guedes, está sob ataque em várias frentes. Primeiro, porque resolveu brigar por uma ampla reforma da Previdência, pondo fim a privilégios que transformaram o sistema de aposentadorias em um grande foco concentrador de renda. Segundo, porque decidiu acabar com a farra de subsídios e derrubar barreiras protecionistas, inclusive no agronegócio.
O presidente sabe que Guedes é o grande fiador da política econômica. Se deixá-lo sozinho no ringue, poderá incentivar uma onda de desconfiança que minaria as perspectivas de retomada da economia. As bases para um avanço mais forte do Produto Interno Bruto (PIB) estão criadas, com a inflação abaixo da meta e os juros nos menores níveis da história. É preciso, porém, reformar a Previdência para ajustar as contas públicas e abrir a economia para ampliar a produtividade e a competição em setores que, ao longo do tempo, viram no Estado um escudo para se manter ineficientes.
O que se pode chamar de segunda posse de Bolsonaro, agora com a saúde restabelecida, precisa ser marcado pelo pulso forte do presidente, indicando que o governo tem rumo. É natural que, num começo de mandato, desencontros aconteçam. Mas o chefe do Executivo já teve tempo suficiente para entender como a máquina pública funciona e o que é preciso fazer para que projetos essenciais para o Brasil possam sair do campo das promessas para a ação.
Até aqui, os investidores têm se mostrado pacientes com o governo e mantendo o voto de confiança na capacidade do presidente de cumprir o que prometeu durante a campanha. Mas alguns sinais de descontentamento já foram enviados. A Bolsa de Valores de São Paulo não consegue embalar e o dólar, aos poucos, está recuperando as forças ante o real. Tudo isso, no entanto, pode mudar e o otimismo voltar com força se Bolsonaro fizer o que tem que ser feito: apresentar uma proposta robusta de reforma do regime previdenciário, organizar a base no Congresso, fazer andar o pacote anticrime de Sérgio Moro, afastar os filhos das confusões do governo e cacifar seu ministro da Economia.
Não é pouca coisa. Mas é o que tem que ser feito de imediato. Se o presidente titubear em suas decisões, corre o risco de ver seu governo sair do rumo para o qual foi eleito. Todos estão de olho. O Brasil tem pressa.