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Tire a capa de Mulher-Maravilha

Precisamos quebrar a fala de que as mulheres são multitarefas, isso nos prejudica nas nossas relações pessoais e profissionais


12/09/2020 04:00

Carine Roos
Especialista em desenvolvimento de mulheres e cofundadora da Elas, escola  focada em liderança feminina no Brasil
 
Nós mulheres não somos multitarefas, somos sobrecarregadas. O excesso de atividades e a ideia de "temos que" fazem com que nossa saúde mental fique abalada. E eu sempre digo: somos perfeitamente imperfeitas.
 
O mito é que somos multitarefas. É errado falar que somos multitarefas, existe algo por trás disso que é o essencialismo biológico, que significa atribuirmos vantagem biológica em função do sexo. Um exem- plo é falar que as mulheres dão conta de várias atividades ao mesmo tempo: os filhos, a casa, o trabalho e ainda dar apoio para quem precisa dela.
 
Atribuímos vantagens competitivas em função do marcador de sexo. Se formos olhar as consequências para as mulheres, há, além da saúde mental, violência psicológica. Quem nunca ouviu que a culpa é sua quando alguém a paquera usando saia à noite? E aqui o essencialismo é que os homens têm impulsos se- xuais incontroláveis e nós mulheres precisamos nos conter para não ''atiçá-los''.
 
Quem nunca ouviu também o estereótipo de que mulher não é boa com números, com lógica, com     exatas? Tudo isso envolve machismo e essencialismo biológico. Isso faz com que as mulheres se afastem de carreiras na área. Existem vários estudos que defen- dem que é impossível você fazer duas atividades que demandam intelectualidade com a mesma qualidade e ao mesmo tempo. É impossível ler este artigo enquanto conversa com alguém, por exemplo, com atenção. A gente faz uma atividade e depois executa a outra. Você pode ter se acostumado a se maquiar dirigindo, por exemplo, mas você não faz nenhuma das duas com 100% de foco.
 
É muito comum as empresas levantarem bandeiras de que querem mulheres em cargo de lide- rança porque elas são mais produtivas e conseguem fazer várias atividades ao mesmo tempo. Precisamos questionar isso porque, historicamente, o grande dilema é que nós assumimos esse papel de multitarefeira: eu tenho que cuidar da minha casa, eu tenho que performar bem no trabalho, eu tenho que cuidar do meu filho, eu tenho que cuidar dos meus pais quando envelhecerem. Por isso, assumimos uma sobrecarga mental absurda e precisamos começar a questionar esse tipo de fala. Homens e mulheres não são multitarefas. Se endossamos esse discurso, vamos assumir esse papel e, obviamente, não daremos conta de tudo.
 
É fato que desenvolvemos mais jogo de cintura, mas porque não nos foi dada outra opção senão a      responsabilidade integral pelo cuidar.
 
Outra consequência negativa é o excesso de con- trole: somente eu cuido da minha casa, dos meus fi- lhos, somente eu posso performar no ambiente de trabalho e, assim, eu não deixo outros protagonizarem. Os demais são colocados como coadjuvantes. Vestimos nossa capa de Mulher-Maravilha e nos cobramos o dia inteiro para dar conta de tudo.
 
Isso também tem a ver com autorresponsabilidade. Retirar o protagonismo das pessoas é colocá-las como coadjuvantes. Se estamos em um contexto de liderança, minha equipe se torna medíocre porque sou sempre eu que tenho as ideias brilhantes e não deixo as pessoas evoluírem. A mesma coisa acontece em casa e nas relações afetivas: se você acredita que somente você sabe lavar a louça, cozinhar, cuidar da criança e fazer a lista do supermercado, você está transformando a pessoa com quem se relaciona afetivamente em coadjuvante.
 
A cada quatro mães, uma não volta mais ao mercado de trabalho porque elas acreditam que não vão dar conta de cuidar da casa, do filho, de performar no ambiente do trabalho. Da mesma forma, a diretora de operações do Facebook,        Sheryl Sandberg, em seu livro Faça acontecer, traz um exemplo: quando ela estava tentando contratar mais mulheres, as que pretendiam engravidar já estagnavam as suas carreiras um ano antes, acreditando que não dariam conta de trabalhar e de cuidar da casa e dos filhos.
 
Isso tem consequências drásticas na nossa saúde mental e no nosso reconhecimento como mulher e profissional. Vamos quebrar esses paradigmas e refletir sobre a nossa potência! Nem sempre vamos dar conta de tudo e está tudo bem!
 
Precisamos ressignificar o mito do equilíbrio: a vida profissional, com a casa, com a vida amorosa. Na prática, o que acontece são escolhas. Precisamos de autorresponsabilidade para entender o que é prioridade para nós e assumir que talvez em determinado momento eu queira me dedicar mais ao meu filho; talvez o trabalho eu foque mais em outro. É uma escolha consciente. Acreditamos na compensação. Assim como em uma fase priorizamos o filho, na próxima podemos priorizar o trabalho.
E precisamos assumir essa responsabilidade de que em um contexto de equipe, quando eu dou a solução sempre e estou sempre disponí- vel, eu estou tornando as pessoas medíocres. Quando você está disponível para o mundo, você não está disponível para você porque você não se prioriza, e isso impacta nosso trabalho, nossa vida e principalmente nossa saúde mental.
 
E isso não é simples de ser colocado em prática. Eu, por exemplo, acho que minha casa poderia estar mais arrumada, com certeza estou com louça na pia neste exato momento. Mas posso deixar essa responsabilidade para outra pessoa. Isso parte de entendermos que a pessoa não vai fazer do jeito que eu faria, mas ela vai fazer. Isso é inovação, diversidade e respeito. E, por isso, precisamos quebrar a fala de que as mulheres são multitarefas, isso nos prejudica nas nossas relações pessoais e profissionais. E se eu endosso essa prática, o discurso se propaga de uma maneira completamente errada e inadequada.
 
Você não vai crescer se quiser controlar tudo. Queremos saber se as pessoas vão entregar tudo nos mínimos detalhes com os quais nos importamos e isso não vai acontecer. E você terá que aprender com essa pessoa, ela tem um estilo diferente do seu e precisamos celebrar essa diversidade para ter resultados melhores.
 
E a mulher sempre quer melhorar, evoluir. Eu acredito que buscamos mais a perfeição porque existem os estereótipos e uma sociedade que lucra com a nossa insegurança. Uma vez que eu te- nho consciência de que não há pessoas multitarefas, os compromissos que eu faço comigo mesma para mudar isso são essenciais. A pessoa vai fazer do jeito dela e do estilo dela e está tudo bem.
Mulher, pode tirar a capa e dizer aos outros e a si mesma: "Não somos multitarefas". 
 
 


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