Maria Inês Vasconcelos
Advogada, escritora e professora
A sala de aula da contemporânea idade revela que os professores estão no laboratório. Ministrar aulas on-line se tornou um negócio de risco, já que o conteúdo fica gravado e pode ser visto diversas vezes, inclusive comercializado. A aula é um ativo de enorme valor. Por isso, a sua comercialização transcende do campo jurídico trabalhista, passa pelos direitos da personalidade, exigindo análises intrincadas.
Hoje, a sala de aula, sem sombra de dúvida, é um local de risco. As alternativas tecnológicas causam uma opressão absurda sobre o professor, a falta de mentoria digital, de infraestrutura, juntamente com as diferenças sociais no acesso à tecnologia e dificuldades com a aula remota. Esse é o palco do trabalho do docente. O trabalho, que pela Constituição brasileira deveria ser prestado de forma livre, humanizada – isso é invasão das esferas psicológicas –, está transmutado para uma verdadeira cadeia.
Temendo o desgaste de sua identidade, seja no campo profissional, seja outras esferas, o professor hoje trabalha com medo. A sala de aula é uma arma apontada para a cabeça, haja vista que os desvios na utilização da tecnologia, em tese emancipadora, etiquetaram a pior forma de alienação sobre o professor. O medo de falar, o medo de transferir conhecimento e ser julgado pelas próprias ideias, o medo de ser o que se é.
Basta que o aluno dê um clique e encaminhe para o grupo infinito de pessoas no WhatsApp, que o professor pode ser crucificado por suas ideias. Avanços na legislação, como a Lei Geral de Proteção de Dados, instituiu o conceito de cidadania digital e disciplina a proteção de dados pessoais, bem como em violabilidade da intimidade, da honra e da imagem. Mas a lei ainda engatinha em tentar solucionar conflitos de ordem trabalhista. Ela é completamente claudicante.
O teletrabalho não está regulado, então um pouco o movimento sindical consegue acudir o que de fato acontece com o professor: ele trabalha muito mais do que antes, sem qualquer tipo de blindagem, estando completamente vulnerável e doente. Aliás, nesse aspecto, o número de afastamentos em razão de depressão, síndrome do pânico e Burnout é impressionante.
Transformada em laboratório, a sala de aula é uma verdadeira guilhotina. O medo domina a agenda. E ainda que a tecnologia seja ressurreição do mundo pós-pandemia, o professor não pode pagar sozinho esta conta. Fica aí o recado: professores doentes são um sinal de que a sociedade caminha em sentido contrário, e que o Estado democrático, na realidade, está afundado. Uma democracia se faz de muitas formas, mas sobretudo com a valorização daquela classe que irá não só educar, mas formar os nossos futuros líderes públicos. A continuar dessa forma, olharemos com tristeza para o futuro, não teremos artistas, escritores e juízes, pois não teremos quem os eduque.