Alexandre Silveira
Ex-secretário estadual de Saúde de Minas Gerais e suplente ao Senado Federal
A pandemia que resultou da infecção pelo novo coronavírus já impactou milhões de pessoas em todo o mundo, com centenas de milhares de mortes. Contudo, ela pode deixar um saldo ainda mais trágico se as pessoas, movidas pelo pânico de contaminação pelo vírus, deixarem, por exemplo, de se vacinar contra outras doenças, interromper tratamentos ou se negar a fazer exames preventivos e de diagnóstico.
As sociedades médicas alertam que, se não houver uma conscientização sobre essa questão, o Brasil poderá ter uma onda de casos de pacientes com doenças em estágios mais graves e que poderiam ter sido evitados se o diagnóstico tivesse ocorrido em tempo hábil.
Desde o início da pandemia, segundo os especialistas brasileiros, houve uma redução em pelo menos 50% no número de biópsias enviadas para análise, porque os pacientes optaram por não comparecer aos procedimentos para a coleta da amostra. Pela mesma razão, houve uma redução em 49% no número de mamografias de rastreamento e de 26% no de mamografias de diagnóstico de câncer de mama, comparando números de 2020 e 2019. Isso também ocorreu com a realização de exames de patologia clínica, com queda de 90%, de 36% nas colonoscopias para diagnóstico de câncer de intestino, e quase 70% na realização de cirurgias oncológicas. É absolutamente incrível saber que quase 6% dos pacientes do Sistema Único de Saúde interromperam os tratamentos de quimioterapia ou radioterapia contra diversos tipos de câncer, unicamente por receio de se contaminarem com a COVID-19, conforme dados divulgados pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca) e pelo Radar do Câncer.
Postergar a prevenção e o diagnóstico de doenças graves, ou mesmo negligenciar o acompanhamento de doenças crônicas como o diabetes, hipertensão, problemas com a visão ou cardiológicos, pode comprometer a assistência dos próprios familiares aos doentes, com quadros mais graves e com possibilidade de um tratamento mais longo e difícil.
A pandemia não pode ser uma desculpa para deixar de cuidar da saúde. O Inca recomenda que, ao visitar clínicas e hospitais, os pacientes oncológicos sejam acompanhados por uma única pessoa, preferencialmente com menos de 60 anos de idade e que permaneçam somente o tempo necessário em clínicas e hospitais, evitando o contato físico direto, mesmo com médicos ou equipes de saúde. Tudo isso é importante, além do que já se sabe sobre a prevenção, como o uso de máscaras e a lavagem adequada das mãos, a higienização dos medicamentos e a limpeza da residência. A pandemia vai passar, mas os cuidados com saúde precisam ser permanentes.