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Estado de Minas artigo

Lá vai o Brasil descendo a ladeira

Não é novidade que, há anos, cultura e educação são relegadas no Brasil


06/08/2021 04:00




Álamo Chaves
Presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia 
6ª Região de Minas Gerais e Espírito Santo

Em 1979, o cantor e compositor baiano Moraes Moreira lançou o álbum “Lá vem o Brasil descendo a ladeira”, com single homônimo. Embora não se saiba exatamente a motivação de Moreira para escrever a canção título do álbum, muitos a interpretam como uma crítica mordaz ao país. Partindo desse ponto de vista, nota-se que, passadas mais de quatro décadas, o Brasil continua descendo a ladeira. O incêndio na Cinemateca Brasileira, o recente apagão no CNPq e a perigosa intenção da Fundação Cultural Palmares de descartar parte de seu acervo ilustram bem esse cenário.

Não é novidade que há alguns anos, cultura e educação são relegadas no Brasil. No entanto, isso não é exclusividade do governo atual. Em 2016, o então presidente Michel Temer decidiu congelar por 25 anos os investimentos, entre outras áreas, justamente na educação. Já a gestão atual ceifou o Ministério da Cultura, transformando-o em secretaria especial que integra o Ministério do Turismo.

As consequências disso foram terríveis. Em 2018, por exemplo, a pane em um ar condicionado foi a responsável pelo incêndio no Museu Nacional, no Rio de Janeiro. Por sorte, não houve morte, contudo, as perdas históricas e culturais foram uma das maiores da história brasileira. Estima-se que 90% do acervo foi consumido pelas chamas.

Três anos antes, em 2015, o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, também pegou fogo. Com o acidente, o segundo e terceiro andares ficaram invalidados, o teto desabou e um bombeiro civil morreu.

Era fato que a Cinemateca estava fadada a ter o mesmo destino. Não se pode dizer que o incêndio do último dia 29 pegou os gestores do local desprevenidos, afinal, órgãos como o Ministério Público Federal, pesquisadores, ex-funcionários e a própria imprensa já haviam alertado para o risco de uma nova tragédia. Mesmo assim, a Cinemateca continuou ignorada pelo poder público. A instituição vive a maior crise desde sua fundação, sem recursos para o básico – chegou a encerrar contrato com a brigada de incêndio e com a equipe de segurança. Uma síntese perfeita do desleixo.

Desmazelo que também pôde ser visto no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Por 10 dias consecutivos, pesquisadores relatam dificuldades para acessar o currículo Lattes e diversos sistemas de informática do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). De acordo com a pasta, um componente dos computadores onde estão hospedados os sistemas pifou e precisará de reposição.

Para completar o cenário mórbido, a Fundação Cultural Palmares anunciou, em junho, que iria expurgar pelo menos 5.300 livros de seu acervo. Entre os autores excluídos, H. G. Wells, Simone de Beauvoir, Hobsbawm, Marilena Chauí, Durkheim, Gramsci, Rosa Luxemburgo, Carlos Marighella e até a obra “Dicionário do Folclore Brasileiro”, do poeta e cronista potiguar Câmara Cascudo. Não houve justificativa plausível para a retirada dos títulos.

Observando tudo isso com certo distanciamento, nota-se que são poucas as vozes que se levantam no intuito de chamar a atenção para esses problemas. E, assim, lá vai o Brasil, descendo a ladeira.


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