Marco Túlio da Silva
Auditor fiscal da Secretaria de Fazenda de Minas Gerais e membro da Comissão Tributária da Federação Brasileira das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)
Sara Teixeira
Vice-presidente da Associação dos Funcionários Fiscais do Estado de Minas Gerais (Affemg)
Uma reforma ampla da tributação sobre o consumo, como a apresentada pela PEC 110, tem consequências diversas que impactam de forma distinta os cidadãos, empresas e governo. Do ponto de vista da arrecadação e do financiamento dos serviços públicos, uma das mudanças mais significativas que a PEC pode trazer é a redução da sonegação de tributos.
Estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) estima que o país deixa de arrecadar R$ 417 bilhões por ano em consequência da sonegação de impostos. Abstraindo do debate quanto à metodologia e números do estudo, é fato que várias análises convergem para uma sonegação de impostos superior a 10% do PIB tributável no país.
Diversos são os fatores que contribuem para a sonegação: percepção do imposto como mero elemento de custo, baixa confiança da sociedade no governo, baixas ou pouco efetivas penalidades aplicáveis ao sonegador, alta carga tributária e limitações e custo para auditar e fiscalizar.
Para piorar, o atual sistema tributário, em especial de tributação sobre o consumo, incorpora complexidades que favorecem comportamentos tendentes a reduzir o pagamento de impostos.
Por exemplo, a diversidade de alíquotas e de tratamentos tributários específicos, cuja aplicação depende de identificação do produto e até de sua utilização, acaba justificando mudanças nos produtos ou no enquadramento tributário para possibilitar pagamento menor de imposto.
Também, a apropriação de créditos de imposto não recolhido na origem, seja por renúncia fiscal ou por serem oriundos de empresas de fachada, estruturadas com a finalidade de emitir documentos fiscais sem que as operações tenham ocorrido e o imposto pago, implica pagamento menor de imposto.
Esses e diversos outros desvios de comportamento, inclusive a sonegação de impostos, suprimem recursos que poderiam ser empregados em saúde, segurança e educação, além de elevar os esforços e custos de fiscalização e auditoria.
A propósito, estudo de Felippe Clemente e Viviani Silva Lírio, “Evidências internacionais de sonegação fiscal: Uma análise a partir do modelo de Graetz, Reinganun e Wilde”, aponta que o alto índice de sonegação eleva os custos de auditoria e fiscalização e que “o custo de auditoria impacta na probabilidade do agente de sonegar. Por isso, políticas que diminuam esse custo são bem-vistas para mitigar o problema da evasão fiscal”.
Mas alguns dos problemas aqui apontados, inclusive a sonegação, podem ser mitigados com a reforma tributária, em tramitação no Senado Federal.
Para isso, é fundamental que a reforma seja implementada com alíquota única ou poucas alíquotas, e mais, que o crédito do imposto seja condicionado a que o pagamento tenha sido efetivado anteriormente.
Essas soluções vão eliminar a “fabricação de créditos do imposto”, desestimular a criação de empresas de fachada com a finalidade de fabricar créditos de imposto, e o uso de uma ou poucas alíquotas reduzirá as manobras de enquadramento tributário. Com isso, é possível reduzir custos da administração tributária com auditoria e fiscalização e aumentar a capacidade de combate a subterfúgios infracionais, reduzindo a sonegação.
Referidas medidas serão boas para o cidadão, pois haverá mais recursos disponíveis para a prestação dos serviços públicos; para o Brasil, que modernizará a tributação sobre o consumo, reduzirá o déficit de fiscalização e auditoria tributárias e aproximará a arrecadação potencial da efetiva; e para o mercado, que terá um sistema mais simples e com menor sonegação, possibilitando uma concorrência mais leal e efetiva, o que também é bom para o consumidor.