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O ensino de língua inglesa no Brasil

Um projeto de ensino precisa vir acompanhado de um grande planejamento, que passa pela formação de profissionais capacitados


06/11/2021 04:00

Maurício Demichelli
Doutor em língua inglesa pela Universidade de São Paulo (USP) e professor do curso de letras do Centro de Comunicação e Letras (CCL) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)
 
A partir de 2018, quando a BNCC foi introduzida e o ensino de língua inglesa se tornou obrigatório para alunos a partir do 6º ano do ensino fundamental, tornou-se uma urgência preencher os quadros de docentes com professores para essa disciplina. A emergência fez com que professores não qualificados assumissem essas disciplinas sem o devido preparo. Devemos enfatizar que os profissionais formados em letras não são todos iguais, há habilitações dentro da carreira que devem ser respeitadas. Não basta apenas ser formado em letras, é necessário que uma das habilitações seja em língua inglesa para poder lecionar a disciplina de forma competente, crítica e reflexiva. Muitas escolas, na falta de profissionais habilitados em inglês, enviaram professores de outras áreas para ocuparem essas cadeiras, e o resultado é catastrófico.
 
Quando a BNCC determina que o inglês se torne uma disciplina obrigatória, há todo um pensamento educacional e de formação humanística e cultural sobre essa diretriz. A ideia do inglês como língua global foi, durante muito tempo, vista como um projeto neoimperialista, mas precisamos compreender a nova dinâmica que o inglês global impõe.
 
Em primeiro lugar, precisamos observar que os movimentos culturais, hoje, não são mais vistos como unidirecionais. Uma cultura nacional pode transformar outra cultura e ser transformada por ela, isto é, falar uma língua estrangeira é trazer a cultura do estrangeiro para a cultura doméstica, mas também levar para a língua estrangeira elementos de nossa cultura de origem e de nossa forma de pensamento e percepção de mundo. Essa afirmação torna-se verdadeira quando percebemos que, com a globalização e o multilinguismo, países de língua inglesa estão enfrentando um problema relacionado à questão da identidade nacional, pois uma língua e, consequentemente, uma cultura não conseguem se manter de forma pura.
 
Em segundo lugar, precisamos compreender que qualquer inovação, como a obrigatoriedade do ensino de inglês, pode intensificar as desigualdades sociais. Alunos de classes mais privilegiadas e de grandes centros urbanos tendem a se beneficiar ainda mais das inovações, que chegam primeiramente a eles. O diferencial do domínio da língua inglesa só amplia a diferença entre aqueles que tiveram a oportunidade de um aprendizado de qualidade daqueles que foram educados em escolas que, por exemplo, precisaram cobrir a disciplina de inglês com profissionais não qualificados.
 
A chave para a implementação da língua inglesa está na forma pela qual os países implementam estrategicamente seu ensino. Essa gestão pode se transformar em um grande sucesso ou um grande desastre. Um projeto de ensino de língua inglesa precisa vir acompanhado de um grande planejamento, que passa pela formação de profissionais capacitados em número suficiente para as demandas educacionais do país e um sistema de apoio, suporte e atualização para o amplo desenvolvimento da prática docente. Pensar apenas em incluir o inglês como disciplina obrigatória não significa que os objetivos educacionais previstos pelo BNCC serão atendidos. É necessário pensar a sua implementação e investir na formação e qualificação dos professores que irão exercer essa prática. 
 
 


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