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Inflação esfria no verão

Se o IPCA de fevereiro vier abaixo de 0,8%, poderá confirmar a dinâmica inflacionária moderada para 2022 e o fim do ciclo de aperto dos juros


18/01/2022 04:00

Joaquim Levy*
Diretor de Estratégia Econômica e Relações com Mercados 
no Banco Safra e ex-ministro da Fazenda
 
A divulgação do IPCA de dezembro de 2021 deu sinais encorajadores de que o verão de 2022 será de menos inflação. Assim como o tempo, a inflação sempre guarda surpresas. Mas, depois de fechar muito acima do limite superior do intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual em torno da meta, a inflação apresenta perspectivas melhores no ano que começa.

Como o Banco Central enfatizou na carta aberta publicada em 11 de janeiro, o aumento do preço do petróleo explica muito de por que a inflação ficou tão acima do teto em 2021. Alguns problemas em insumos internacionais, como chips para automóveis e a falta d’água no Brasil, também empurraram os preços de forma excepcional.

O preço da gasolina e do gás de cozinha contribuiu, junto com o do etanol, com mais de 3 pontos percentuais para o aumento do IPCA. A energia elétrica com 1 ponto e os automóveis, com três quartos de ponto. Comida e serviços, por seu lado, cresceram bem menos que a média dos preços. O risco de a inflação ultrapassar em muito a meta de 2021 só foi percebido na metade do ano passado.

Como o presidente do BC notou, a previsão do Copom em setembro de 2020 era de que os preços subiriam menos de 3% em 2021, quando eles acabaram subindo 10,06%.

O preço do petróleo avançou ao longo de grande parte de 2021, à medida que a economia mundial se recuperou da primeira onda de COVID-19, graças à vacinação e renovados impulsos fiscais. Esse preço se acomodou apenas mais para o fim do ano, com a onda da variante Ômicron.

A variante também deve ter contribuído para a moderação dos preços dos itens de serviços, refletida na surpresa baixista nos itens de alimentação fora de casa e consertos de automóveis. Com isso, a variação do IPCA em dezembro de 2021 ficou em 0,73%, a menor variação mensal no segundo semestre, apesar de a inflação tradicionalmente acelerar no fim do ano. Assim, os principais núcleos da inflação caíram mais de 1 ponto percentual na sua média de três meses dessazonalizada e anualizada, indo de 9,53% para 8,43%, abrindo nova perspectiva para os próximos meses.

A queda de alguns preços administrados e de serviços, além da permanência de vários preços em nível alto, mas estável, pode levar a inflação de janeiro a ficar abaixo de 0,5%, valor bastante baixo quando se leva em conta a variação do IPCA na maioria dos começos de ano. A equipe de macroeconomia do Banco Safra já identificou que o item passagens aéreas deve cair, assim como as prestações dos planos de saúde.

Alguns itens vão aumentar, como o IPVA e a própria gasolina, que sofreu reajuste na refinaria na segunda semana do mês. A transmissão desse reajuste, porém, deve impactar apenas parcialmente o IPCA de janeiro, ficando o resto para o índice de fevereiro. O preço dos bens industriais também deve aumentar moderadamente, enquanto a alta dos alimentos in natura dependerá dos efeitos das chuvas excessivas em algumas localidades e da falta delas em outras. Mas, no conjunto, o primeiro mês sinaliza mais um mês de inflação relativamente branda.

Olhando para o verão como um todo, os preços no setor de educação terão destaque em fevereiro. O item cursos regulares sofreu reajuste pequeno em 2021 e poderá trazer surpresas altistas com a normalização das aulas, ainda que os dados preliminares não corroborem essa preocupação.

O aumento do salário mínimo no começo do ano também pode afetar o preço de outros serviços, apesar da fragilidade do mercado de trabalho, com nível de ocupação ainda menor do que antes da pandemia, e da fraqueza da renda média real do trabalho, mesmo depois do reajuste dos salários.

Assim, e considerando o aumento do endividamento das famílias nos últimos 18 meses, é prová- vel que o poder de compra dos consumidores caia, freando a inflação e permitindo um aumento do IPCA de apenas 0,8% em fevereiro. A inflação de março está projetada em 0,46%, levando a variação mensal média do IPCA no primeiro trimestre a apenas 0,57%. Esse número ainda parece bem acima do necessário para viabilizar uma inflação dentro do intervalo de tolerância em 2022.

Mas, considerando os padrões sazonais, esses são números de um primeiro trimestre de baixa inflação, que poderá ser seguido por um segundo trimestre com inflação mensal média próxima a 0,25% e uma segunda metade do ano de 0,37%. Nesse cenário, a variação acumulada do IPCA sobre 12 meses converge para 4,7% ao fim de 2022, se não houver disparada do preço do petróleo para US$ 100/barril ou forte desvalorização cambial por razões domésticas.

O esfriamento da inflação nesse verão pode não estar evidente ao tempo da primeira reunião do Copom em 2022, que deve ocorrer em 2 de fevereiro, quando apenas as prévias do IPCA de janeiro estarão disponíveis. Mas ele poderá ser confirmado se a variação do IPCA de fevereiro, a ser divulgada nas vésperas da segunda reunião, em 16 de março, vier abaixo de 0,8%. Nesse caso, aumentaria a convicção de uma dinâmica inflacionária moderada para todo 2022, sugerindo que a decisão de anunciar o fim do ciclo de aperto da política monetária estaria madura.

*Com Matheus Rosignoli 


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