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O tempo da quaresma

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Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)


O tempo da quaresma é oferta da delicadeza de Deus, que chama seus filhos e filhas a buscarem novos modos de viver, para qualificar a vida – que é sempre dom. Importante lembrar: o tempo da vida corre aceleradamente, indomável, fazendo chegar novamente o período quaresmal, qualificado de espiritualidade e vivência da fé.  Momento que interpela todos a buscarem a conversão, pela aceitação humilde de que é preciso mudar direções, alcançar novas respostas no horizonte do amor de Deus, desdobrado em fraternidade universal. A quaresma é uma oportunidade para renovação pessoal e comunitária, neste momento de eclosão de guerras e outros conflitos que comprometem a paz mundial, ferindo a dignidade humana. O rumo novo sonhado e que precisa ser urgentemente trilhado, mais condizente com os propósitos da fraternidade solidária e universal, depende de mudanças no coração humano, que precisa de conversão. 





Nessa perspectiva, dedicar-se ao bem é tarefa existencial, e o caminho da quaresma, pela força do anúncio da Palavra de Deus, pelas celebrações e atos de piedade, particularmente emoldurados pelo silêncio e sobriedade de gestos, é oportunidade educativa de recuperação da qualidade humana perdida em razão do pecado, de atitudes e convicções que estreitam a interioridade na mesquinhez do egoísmo, produzindo comprometimentos com incidências maiores e menores – das desavenças familiares aos grandes e preocupantes conflitos entre países, ferindo ainda mais a história da humanidade. As práticas quaresmais têm propriedades educativas para curar as maléficas consequências da ganância e da soberba, raízes de males que vão empurrando a humanidade rumo à destruição. Sem acolher as lições deste tempo, deixando-se contaminar pelo orgulho, abre-se a porta para o fracasso. Importante é reconhecer o essencial exercício de avaliar os próprios conceitos e convicções, para superar juízos não raramente equivocados sobre pessoas, situações e instituições. 

O convite à conversão, que vem especialmente do tempo quaresmal, indica sempre a necessidade de se investir na recuperação de uma bela verdade: mais do que buscar acumular bens e posses, egoisticamente, o segredo para semear o bem e partilhá-lo é aprender a doar. E este tempo favorável convida ao desenvolvimento da consciência de que é o momento para uma semeadura nova, com valores e princípios indispensáveis, contando com qualificados semeadores. O chamamento é para cultivar o bem, pensando na importância da esperada colheita.  Inspira o que Paulo Apóstolo diz aos coríntios, sublinhando que quem semeia pouco, também pouco há de colher, mas quem semeia com generosidade, com generosidade também colherá. 

Colhe-se o que se planta e, por isso mesmo, acentua-se a responsabilidade de cada semeador, que deve assumir a sua condição de filho de Deus, buscando qualificadamente cooperar com o Pai. Conta, pois, semear, antes de tudo, o bem, para tê-lo como fruto. Também Paulo Apóstolo recomenda que não se canse de fazer o bem, cuidando para não se enjaular em um egoísmo individualista, fecundado pelas desilusões e sonhos desfeitos, diante dos sofrimentos, refugiando-se na indiferença. O grande propósito é dedicar-se à caridade. Não se deve evitar quem passa necessidade, inclusive aqueles que precisam de uma boa palavra. No horizonte largo do tempo favorável da quaresma, a Igreja no Brasil, pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), promove a Campanha da Fraternidade há seis décadas – uma tradição na vida da Igreja. Neste ano, a Campanha apresenta o tema “Educação e fraternidade”, para que sejam assumidos compromissos mais efetivos e qualificados em relação à educação formal, determinante no desenvolvimento integral da sociedade brasileira. 





A Campanha da Fraternidade 2022 procura consolidar, em sua missão, o sentido ampliado do processo educativo, mais abrangente que as dinâmicas vividas no contexto escolar. Esse processo precisa envolver todos os segmentos em um efetivo investimento educativo para edificar a cultura da paz, da justiça e da solidariedade. O convite amplo e irrestrito à conversão, uma necessidade do coração humano, é acentuado no objetivo geral da Campanha da Fraternidade, quando sublinha a oportunidade inadiável de se promoverem diálogos a partir da realidade educativa do Brasil, à luz da fé cristã, e propor caminhos em favor do humanismo integral e solidário. 

Acolher o rico e bem-articulado horizonte desenhado para a Campanha da Fraternidade 2022, seguindo o exemplo do Mestre e Senhor Jesus – o Educador por excelência, inigualável no amor – é assumir o propósito-compromisso de “falar com sabedoria e ensinar com amor” (Pr 31,26). Percorrer esse caminho de aprendizado é acender luzes de esperança para dissipar espectros sombrios da contemporaneidade, agora emoldurado pelo benfazejo e oportuno tempo da quaresma. Urgente é investir nos processos educativos adequados, assumindo a tarefa de ensinar e aprender – aprendendo ao ensinar e ensinando ao aprender. Assim, é possível ajudar a construir um momento novo, conforme a vontade de Deus, aproveitando bem as oportunidades deste tempo – o tempo da quaresma.