Depois de a greve dos servidores do Banco Central impedir por um mês a divulgação de pesquisas e estatísticas, o boletim Focus – Relatório de Mercado foi divulgado com a previsão dos economistas e analistas financeiros prevendo a continuidade das pressões inflacionárias. E, pior, eles já apontam para inflação fora do centro da meta também em 2023. A previsão para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – que mede a inflação oficial do país – para este ano passou de 6,86% há quatro semanas para 7,65% agora, indicando que depois de registrar alta de 10,06% em 2021, a inflação caminha para estourar o teto da meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) por dois anos consecutivos.
Para este ano, a meta inflacionária é de 3,5%, com tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos (2% e 5%). O próprio Banco Central, que elevou sua projeção de inflação para este ano de 4,7% para 7,1%, já admite que a probabilidade de o IPCA ficar acima do teto da meta em 2022 é hoje entre 88% e 97%. No acumulado dos três primeiros meses do ano, o IPCA já chega a 3,2%. Para 2023, o alvo inflacionário é 3,25% e as projeções do mercado financeiro passaram de 3,8% há quatro semanas para 4% agora.
Hoje, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela o IPCA-15, prévia oficial da inflação de abril. Caso esse indicador, que em março teve alta de 0,95%, volte a ficar próximo de 1%, será a senha para que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central eleve a taxa de juros em mais um ponto percentual, jogando a Selic dos atuais 11,75% para 12,75% ao ano, mantendo o Brasil no topo dos países com as maiores taxas de juros reais (descontada a inflação).
Resta questionar a efetividade desse arrocho monetário no momento em que a economia brasileira dá sinais de um desempenho acima do esperado, mas ainda muito fraco. Não resta dúvida de que cabe ao Banco Central o combate à alta generalizada dos preços, que sufoca principalmente a população com menor poder aquisitivo, mas cabe lembrar o que disse no século 16 o médico e físico Paracelso: “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”. Isso mesmo, a taxa de juros é a ferramenta para se combater a alta dos preços, mas como a inflação tem um componente externo muito forte, ao subir os juros o Banco Central não reduz os preços, apenas contribui para que eles não subam também por pressão interna.
É nesse movimento que os diretores do Banco Central devem estar atentos quando se encontrarem na semana que vem para definir a taxa básica de juros da economia. Como os efeitos da alta de juros sobre os preços se fazem sentir depois de seis ou sete meses, é prudente que o ajuste nos juros agora seja dosado para não afetar mais a economia do que conter a inflação. Com a inadimplência e o número de famílias batendo recorde em março e a procura por crédito recuando, a sinalização é para a desaceleração da atividade econômica. Hoje 77,5% das famílias estão endividadas, sendo que 27,8% delas estão inadimplentes e 10,8% admitem não ter mais como pagar contas em atraso.
Com esse quadro, a procura por crédito começou o ano em queda. Dívidas comprometendo o orçamento e taxas de juros elevadas desacelerando o consumo mesmo daqueles com maior renda que, nesse caso, optam por investir em busca de rendimentos. Consumo menor e juros elevados reduzem investimentos produtivos, afetando a geração de emprego. Não se trata de uma equação automática, mas em perspectiva é este o cenário que se apresenta. Mais arrocho monetário agora não aumentará a eficiência no combate à inflação, mas será amargo para a perspectiva de uma melhora da economia no horizonte de curto prazo.