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Férias e o dilema dos voos cancelados

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Weverton Vilas Boas
Professor de direito do consumidor e proteção de dados. Mestre em direito público

O mês de julho chegou e com ele muitas histórias de frustração dessa época de férias, que deveria ser o momento de regozijo familiar ou mesmo de descanso e lazer solitários.





Não são raros os relatos de passageiros vítimas das companhias aéreas, que causam os mais diversos transtornos aos viajantes. Entre os problemas enfrentados, há uma grande incidência de cancelamentos de voos sem aviso prévio.

As situações mais comuns envolvem a aquisição de passagens para determinados trechos de ida e volta, em períodos predeterminados, escolhidos em promoções anunciadas ou ainda por decisão do próprio consumidor, de acordo com a sua disponibilidade e programação financeira.  

Imagine que nessa situação o consumidor planeje todo o seu roteiro, com reservas das diárias em hotel, pagando antecipadamente até os ingressos para atrações turísticas e passeios. Mas, no dia do itinerário original, quando no balcão do aeroporto para a realização do check-in, tem a grata surpresa de que seu voo foi adiado para outra data.

E, mesmo com a ausência da informação sobre a mudança, com a reprogramação de voos para datas posteriores, o que se apresenta é a falta de apoio na assistência por parte das companhias. Tais situações sujeitam os passageiros, muitos oriundos de outras localidades ou em trânsito, a tomarem o caminho de volta ou escolher pernoitar no chão dos aeroportos ou em hotéis, assumindo novos gastos, todos sob sua responsabilidade exclusiva.





Em primeiro lugar, nota-se que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) adota a teoria finalista, na medida em que considera consumidor todo aquele que adquire ou utiliza um produto ou serviço como usuário final prático e econômico. Nesse sentido, o passageiro é o destinatário final de fato e, logo, a relação jurídica é de natureza consumerista claramente entre fornecedor e consumidor.

Ainda nos termos do CDC, todo o arcabouço da defesa do consumidor é desenhado para garantir a proteção do consumidor contra métodos e práticas desleais de fornecedores e condutas consideradas abusivas, principalmente em razão da posição de vulnerabilidade dos consumidores.

Além disso, fica evidente o descumprimento de suas obrigações por parte do fornecedor – neste caso, a companhia aérea – no fornecimento de informações claras, suficientes, precisas e oportunas sobre os serviços prestados e todas as circunstâncias que os envolvam, inclusive com práticas consideradas abusivas.





Outro direito fundamental do consumidor é a efetiva prevenção e reparação dos prejuízos causados, inclusive os danos morais. O CDC é claro ao estabelecer que quando o serviço prestado pelo fornecedor for defeituoso, inclusive por insuficiência de informação, que constitua um fato do serviço, o dano sofrido deve ser reparado, sendo importante configurar que a responsabilidade do fornecedor é objetiva, cabendo a ele comprovar sua isenção, se for o caso.

Especificamente em relação aos serviços aéreos de passageiros, a Resolução Anac 414 estabelece que a transportadora é obrigada a notificar qualquer cancelamento programado de um voo, e as razões para tal, pelo menos 72 horas antes da hora de partida.

Quanto aos danos materiais, a indenização deve incluir a perda efetiva do passageiro lesado, bem como as perdas e danos que razoavelmente deixou de lucrar e o valor dos danos deve ser medido pela extensão do prejuízo, conforme estipula o Código Civil.





Nas ocorrências descritas, os atrasos de voos correspondem a um cancelamento programado e a não garantia da devida informação, constituindo-se em flagrante abuso de autoridade e violação da obrigação de notificar do fornecedor, com quebra evidente de uma relação de confiança e a violação do princípio da boa-fé objetiva.

Além dos danos materiais, é inegável que as falhas na prestação dos serviços também geram danos extrapatrimoniais. O dano moral é cristalino e pode ser sucintamente qualificado como violação do direito da personalidade, que inclui os direitos à dignidade, à intimidade, à vida privada e à honra, como os previstos no art. 5, X, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, quando frustra as expectativas do cliente de realizar a viagem planejada, causando transtornos prévios e prejudicando a atmosfera e a harmonia do tão sonhado período de férias. 

Portanto, não há que se duvidar do direito do passageiro lesado à reparação de todos os seus danos morais e materiais, esses últimos devidamente comprovados, devendo os passageiros lesados, na condição de consumidores, buscarem a responsabilização judicial para que as companhias aéreas possam ser devidamente punidas com o pagamento de indenizações efetivas e na extensão dos danos causados.