Jorge Calazans
Advogado, especialista na área criminal, conselheiro estadual da Anacrim, sócio do escritório Calazans & Vieira Dias Advogados
Não é de hoje que casos de golpes e fraudes financeiras praticados na formação de pirâmides, envolvendo milhões de vítimas dentro e fora do país, repercutem nos órgãos de imprensa numa velocidade maior do que aquela que se deseja no âmbito da Justiça. Somente em um desses casos amplamente divulgados, o da Atlas Quantum, que tem à frente e como mentor Rodrigo Marques dos Santos, o golpe de aproximadamente R$ 5 bilhões afetou cerca de 40 mil pessoas de mais de 50 países, o que demonstra a dimensão do estrago que esse tipo de crime tem.
Diante de número tão expressivo de vítimas, não resta dúvidas do delito. Contudo, entre sua comprovação, a condenação dos mentores e operadores desta pirâmide e o ressarcimento de quem caiu no golpe do enriquecimento, existe uma longa e desafiadora estrada a se percorrer. Isso porque, na esfera criminal federal, onde tramita o processo de investigação, o crime pesa contra o sistema financeiro e precisa seguir um grande rito para que somente ao final, dentro dos efeitos da condenação, o juiz defina e assegure os direitos dos lesados. Trata-se de uma jornada extensa demais para quem confiou uma boa parte – em alguns casos, uma vida toda de economias.
Com o objetivo de reduzir esse trajeto, uma ponte entre vítimas e a Justiça está sendo construída na esfera criminal estadual. Entende-se assim que, por se tratar de crime contra o patrimônio, os réus envolvidos no caso, para se livrar da denúncia criminal, tida no momento em que o Ministério Público toma conhecimento, acolhe e inicia o processo, optam em ressarcir as vítimas, nessa esfera consideradas os investidores, e não o sistema financeiro. Esse pode ser um caminho vantajoso pelo fato de poder resolver o imbróglio o mais breve possível.
Esse foi o caminho escolhido por um grupo de vítimas da Atlas Quantum em 5 de julho último, quando entregaram uma representação de notícia de fato criminal na Polícia Civil do Estado de São Paulo. O documento narra os fatos que configuram delitos contra o patrimônio, como também contra as relações de consumo e contra a economia popular, e é um passo importante para que a autoridade policial tome as providências legais no sentido de se averiguar se os relatos contêm o mínimo de indícios condizentes com o contexto fático e, a partir daí, desencadear o procedimento investigatório.
O caso da Atlas nesse grande esquema lesivo e ilegal de pirâmide financeira cada vez mais praticado no país é emblemático pela proporção das cifras alcançadas. Estima-se que Rodrigo Marques dos Santos teria vertido para sua esfera de disponibilidade a quantia de R$ 4 bilhões. Não há, assim, justificativa plausível ou que possa convencer ter a vultosa quantia desaparecido dos cofres ou contas mantidas sob a administração do grupo Atlas Quantum.
Não bastasse isso, após inúmeras tentativas de saques dos valores mantidos junto à plataforma da Atlas Quantum por vários clientes em todo o Brasil e no mundo, a empresa foi a público e justificou a impossibilidade de movimentação pela enorme solicitação dos saques e por estar passando por dificuldades de operacionalização.
Enquanto a empresa e seu líder se escoram nessas justificativas, seus clientes/investidores/consumidores não tiveram devolvidos os valores aplicados na plataforma, muito menos tiveram respeitados o direito ao ressarcimento que fora exigido por determinações judiciais. Mais além, Rodrigo Marques dos Santos saiu do país e continua a operar no mercado de moedas digital com o dinheiro dessas inúmeras pessoas lesadas.
A essas pessoas vítimas do golpe, momentaneamente cabe justamente fazer o que estão fazendo. Caminhar nessa longa jornada buscando os caminhos diversos para um único objetivo, qual seja, a Justiça, com o ressarcimento de suas economias e a condenação do líder e demais envolvidos nesse tipo de crime.