Miguel Abuhab
Engenheiro e empresário. Fundador do movimento Destrava Brasil
O debate sobre o impacto da tributação sobre o consumo na atividade econômica brasileira ganhou corpo no último mês, a partir da discussão sobre o ICMS que incide sobre o preço dos combustíveis.
A alteração dessa alíquota é mais uma das milhares de minirreformas que o Brasil realizou nos últimos anos, tornando seu pesado sistema tributário ainda mais parecido com um manicômio.
A verdadeira reforma tributária, capaz de fomentar o desenvolvimento, destravar a economia e trazer igualdade social, permanece na agenda de prioridades, e a ela deveria ser dada a devida atenção pelo governo e o Legislativo.
Ao confrontar a suposta complexidade dessa reforma e as premissas que ela deve atender para ser uma unanimidade do ponto de vista político – não mexer na partilha da União, estados e municípios – e socioeconômico – não permitir o aumento da carga tributária para a sociedade –, muitos analistas e observadores desconsideram a aplicação de um fator que hoje está à disposição para tornar o sistema tributário mais simples e sem efeitos indesejáveis, como a inadimplência, a informalidade e a sonegação. Estamos falando de tecnologia, a chamada tecnologia 5.0 aplicada ao mercado financeiro, na qual o Brasil se tornou um dos maiores especialistas mundiais.
A tecnologia permite que a visão ortodoxa hoje predominante na cobrança de impostos seja substituída por uma abordagem que se adapta ao federalismo brasileiro.
Ortodoxia é tudo que fazemos, não sabemos por que fazemos, mas continuamos fazendo. As ortodoxias têm origem nas restrições tecnológicas. Quando tínhamos restrições tecnológicas, criamos as regras de negócio, mas quando as restrições deixaram de existir, as regras continuaram as mesmas. Isso aconteceu com o sistema tributário brasileiro.
Quando o meio de pagamento era cheque ou cartão de crédito com relevo, podíamos fazer um débito e apenas um crédito. Portanto, o consumidor pagava o imposto sobre o consumo ao comerciante, que, por sua vez, faria o recolhimento ao Tesouro.
Hoje, com os servidores na nuvem, podemos fazer um débito e vários créditos; ou seja, quando um consumidor paga ao comerciante com um cartão, será feito um débito ao consumidor, um crédito ao comerciante e o imposto será creditado diretamente ao governo.
Nos boletos de cobrança, passará a constar o valor da mercadoria e o valor do imposto. O valor da mercadoria vai para o fornecedor e o valor do imposto ao governo. No final do dia, será feito um netting (compensação), devolvendo ao contribuinte os valores pagos na etapa anterior.
Entre todas as propostas de reforma tributária que tramitam no Congresso, a PEC 110, do Senado, não é apenas aquela que demandou maior tempo de discussão e maturação (visto que ela se origina de texto elaborado ainda na década passada pelo ex-deputado Luiz Carlos Hauly, criador do Simples), mas também aquela que soube incorporar a tecnologia à sua proposição. A ideia é que, em complemento à simplificação e modernização proporcionadas pela unificação de cinco impostos em um, seja também implantada a cobrança automática e eletrônica do tributo sobre consumo sempre que houver a quitação de uma nota fiscal. Será o fim de inúmeras mazelas que atravancam o sistema e impedem que o Brasil volte a crescer.
A tecnologia se tornou um dos pilares para a simplificação tributária. E não se trata de reinventar a roda. As soluções tecnológicas já existem. O que se propõe é uma nova forma de utilizá-las – e a iniciativa de adotá-las como aliadas do crescimento econômico.