Jornal Estado de Minas

Cooperativismo, governança e gestão financeira

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Manoel Pereira de Queiroz
Superintendente de agronegócio do Banco Alfa e membro do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp

Houve um tempo, não muito distante, em que cooperativa agropecuária era sinônimo de risco, fisiologismo e instrumento de uso político dos seus líderes, que, embora pudessem ser bons agricultores, geralmente eram mal preparados para a gestão de uma instituição maior e mais complexa. 




Cresci, me formei e iniciei minha carreira profissional vendo diversas dessas instituições quebrarem ou jogarem seus prejuízos nas costas do governo e dos credores. Isso mudou, e como mudou! Apenas para se ter uma ideia, atualmente, entre as 10 maiores empresas de capital fechado do Brasil, cinco são cooperativas agropecuárias.
 
Hoje em dia, ao visitar essas instituições, é cada vez mais comum depararmos com profissionais altamente qualificados. São traders, gerentes financeiros, controllers, entre outros, de excelente nível técnico, que há alguns anos só encontrávamos em grandes corporações nas maiores capitais do país. As normas e os processos são descritos, difundidos e respeitados.
 
Ponto particularmente sensível, que serve como exemplo, é a aprovação de crédito dos cooperados. Antigamente, era um processo com forte componente político, em que os diretores concediam crédito de forma discricionária aos seus apaniguados e eleitores. Hoje, na maioria das vezes, trata-se de um processo disciplinado, devidamente estabelecido, que envolve analistas de crédito, ferramentas de rating, alçadas bem definidas e decisão colegiada. Algumas cooperativas já possuem até administradores profissionais (CEOs e CFOs), separando claramente as funções dos órgãos de decisão estratégica dos de execução.




 
Vários são os fatores responsáveis pela mudança. O primeiro, e mais importante, é o próprio crescimento da agricultura brasileira. Maior produção significa maior necessidade de crédito; para obtê-lo é necessário demonstrar aos financiadores capacidade de pagamento, ferramentas para a mitigação dos riscos, além de estratégia clara e bem definida. Dessa forma, a necessidade se impôs. O segundo é o apoio da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e suas entidades regionais, no estímulo à modernização e à boa governança. 
 
Destaco, em especial, o trabalho da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), que, entre outras ações, montou um benchmark de mais de 40 índices (operacionais e financeiros) para medir e comparar as associadas, gerando estímulo para que as políticas e práticas daquelas que se destacam sejam também implementadas pelas demais. O terceiro, e não menos importante, é a democratização do conhecimento e da informação por meio da tecnologia, permitindo a quem está no interior do Brasil ter acesso em igual quantidade, qualidade e velocidade que os profissionais dos grandes centros urbanos ao redor do mundo.
 
É óbvio que o mercado é muito heterogêneo e ainda existem cooperativas atrasadas nesse processo de modernização. Um ponto importante e difícil a ser encarado por esse grupo é a capitalização dessas organizações. Cooperativa forte precisa ter balanço robusto e isso implica reter uma parte importante das sobras cooperativas, proposta nem sempre simpática aos cooperados, justamente aqueles que têm poder para aprová-la em assembleias. 




 
Nesse caso, é fundamental o papel das lideranças no convencimento de que vale a pena trocar um benefício de curto prazo por outro muito maior no longo prazo.
 
O cooperativismo é um importante propulsor do desenvolvimento da agropecuária brasileira, sobretudo nas regiões onde imperam pequenas e médias propriedades. Ele agrega valor ao produto, fornece suporte, dilui custos, difunde tecnologia e fomenta boas práticas, permitindo, dessa forma, que o agricultor participe do mercado globalizado, competindo de igual para igual com grandes players. Seu sucesso, contudo, depende de boa governança e gestão financeira profissionalizada.