Gustavo Falcão e Thiago Rocha
Advogados do Manucci Advogados
No primeiro dia de 2023, o novo governo editou o Decreto 11.374/2023, promovendo, com isso, alterações importantes e imediatas na legislação tributária brasileira.
Um dos destaques foi a revogação do Decreto 11.322/2022, que previa redução pela metade das alíquotas de PIS e Cofins incidentes sobre receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa.
Em termos práticos, as alíquotas de PIS e Cofins sobre tais receitas financeiras, que por meio do Decreto 11.322/2022 estariam reduzidas para 0,33% e 2%, respectivamente, retornaram às alíquotas originais de 0,65% e 4%, ocasionando imediato aumento da carga tributária suportada pelos contribuintes.
Situação semelhante ocorreu com o Decreto 11.321/2022, também revogado, que em sua redação original previa desconto de 50% (cinquenta por cento) nas alíquotas do AFRMM – Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante, resultando na manutenção da alíquota de 8% na navegação de longo curso, de cabotagem, fluvial e lacustre para transporte de granéis sólidos e outras cargas nas regiões Norte e Nordeste, bem como da alíquota de 40% na navegação fluvial e lacustre para transporte de granéis líquidos nas regiões Norte e Nordeste.
Ocorre que, não obstante haver a possibilidade de revogação ou redução de benefícios por meio de ato do Poder Executivo, o Decreto 11.374/2023 prevê o início da sua vigência na data de publicação no Diário Oficial, ocorrida em 2 de janeiro de 2023, de forma que os contribuintes foram surpreendidos com o repentino restabelecimento de alíquotas.
Contudo, o artigo 150, inciso III, alíneas b e c da Constituição Federal garante que a instituição ou a majoração de tributos depende da observância dos princípios constitucionais da anterioridade nonagesimal e/ou da anterioridade geral, de forma que a nova espécie tributária não seja exigida antes de decorridos 90 (noventa) dias da data em que haja sido publicada a respectiva alteração, e nem no mesmo exercício financeiro desta, a depender do caso.
Sobre o assunto, importante mencionar que o Supremo Tribunal Federal possui entendimento favorável à aplicação do princípio da anterioridade quando há restabelecimento de alíquotas, como aquela promovida por meio do Decreto 11.374/2023, definindo tais situações como “majoração indireta da carga tributária”, como se verifica no recente julgamento da ADI 7.181 e em diversos precedentes que tratam sobre o tema (vide RE 1.272/485/SC; RE 1.343.737/SP; RE 1.152.944/RS, bem como Tema 1.108 da Repercussão Geral, ainda pendente de julgamento).
Vale lembrar que o restabelecimento de alíquotas determinada pelo Decreto 11.374/2023 produz efeitos imediatos, sujeitando todos os contribuintes ao recolhimento dos tributos considerando as novas alíquotas previstas, de forma que a judicialização da questão é necessária para garantia dos princípios constitucionais da anterioridade, bem como da não surpresa.
Diante disso, entendemos que são grandes as chances de êxito dos contribuintes em caso de eventual propositura de ação judicial visando ao afastamento da cobrança imediata das novas alíquotas de PIS e Cofins incidentes sobre as receitas financeiras, bem como do AFRMM, de forma que essas sejam majoradas apenas após decorridos, no mínimo, 90 (noventa) dias da publicação do Decreto 11.374/2023 no Diário Oficial.