Jacinda Ardern, primeira-ministra da Nova Zelândia, anunciou, na semana passada, que entregará o cargo em 7 de fevereiro, oito meses antes das eleições que definirão o novo governante. Com a voz embargada, explicou o motivo: “Não tenho mais combustível suficiente para liderar o país”. Nos últimos seis anos, ela enfrentou a pandemia de COVID-19, a consequente recessão econômica, a erupção de um vulcão e o tiroteio em uma mesquita. “Esses eventos têm sido desgastantes”, admitiu Arden, de 42 anos. Mais do que a decisão de deixar o governo, o anúncio da primeira-ministra chama a atenção porque traz à luz um problema que muita gente prefere jogar debaixo do tapete, temendo preconceito e perseguição. Trata-se do esgotamento mental associado ao trabalho.
Não é preciso liderar um país em crise para sentir que o combustível acabou. Reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a síndrome de Burnout afeta um em cada cinco adultos brasileiros, segundo estudo da Universidade de São Paulo. Outro levantamento, da Associação Internacional de Gestão do Estresse, detectou que 44% da população está esgotada física e mentalmente. É mais que nos outros sete países sondados, incluindo Estados Unidos e Índia. O Burnout é, basicamente, um distúrbio psiquiátrico associado ao trabalho. O principal sintoma é a exaustão extrema, mas a síndrome também se caracteriza por alterações no apetite, dor de cabeça, negatividade e dificuldade de concentração, entre outros. Conforme o Ministério da Saúde, o tratamento pode incluir medicamentos e psicoterapia.
Essas são abordagens que também se aplicam a pessoas que sofrem de estresse e esgotamento, independentemente do ambiente de trabalho. Passamos por uma crise sanitária sem precedentes desde a gripe espanhola, há 100 anos. Acompanhamos, há 11 meses, a guerra na Ucrânia, um dos oito conflitos armados mais sangrentos em curso. Sofremos na pele os efeitos do aquecimento global. No Brasil, vivemos uma polarização ideológica que ameaça a democracia e a sanidade de qualquer cidadão.
Já passou da hora de a saúde mental ser tratada com a mesma seriedade dos males que afligem o corpo físico. Não é admissível que doenças psíquicas sejam vistas como frescura ou malandragem. Além da conscientização social e laboral, o país precisa voltar a investir na Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras drogas, em desmonte desde 2016. Criada há oito anos, a campanha Janeiro Branco, de conscientização sobre cuidados com a saúde mental, nunca foi tão bem-vinda. O combustível não acaba porque se quer. Que, em 2023, os brasileiros sintam-se reabastecidos.