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Entre acertos e sinais de retrocesso

O cenário econômico construtivo passa pela preservação dos pilares macroeconômicos com foco no fiscal e monetário


11/04/2023 04:00

Alessandra Ribeiro
Diretora da área de Macroeconomia e Análise Setorial e sócia da Tendências Consultoria
 
O governo Lula 3 nasce sob a expectativa de restaurar o efeito moderador da democracia, restabelecendo o espaço de diálogos entre os diversos segmentos da sociedade, tendo em vista o desenho de política de governo em ambiente de divisão e polarização política. Assim, esses 100 dias iniciais do governo podem ser caracterizados por um misto de acertos e sinais de retrocesso. De um lado, sinalizações positivas na agenda ambiental, retomada da política externa e foco na reforma tributária e, de outro, visões equivocadas sobre a política monetária, bancos públicos, papel do setor privado e questões regulatórias.

O governo entendeu a importância da agenda ambiental para a retomada da política externa, atração de investimentos e destravamento de potenciais acordos comerciais como entre Mercosul e União Europeia. Isso ficou evidente com a utilização da COP-27 como seu primeiro compromisso internacional direcionado à agenda ambiental. O desafio será trazer os resultados esperados, especialmente com relação às agressivas metas de redução do ritmo do desmatamento, para, inclusive, mostrar ao mundo e avançar em temas de interesse do país.

Na questão da política externa, confirmou-se a expectativa de mudança em relação ao governo antecessor, com aposta no multilateralismo e na diplomacia presidencial, evidente em sua agenda de início de mandato com visitas a países vizinhos como Argentina e principais parceiros comerciais como Estados Unidos e China. O desafio do Brasil é encontrar um espaço de relativa neutralidade e resultados concretos em um contexto de choque entre as grandes potências globais.

Do ponto de vista das apostas na seara econômica, o governo foca na reforma tributária, evidente na criação de uma secretaria extraordinária sob o guarda-chuva do Ministério da Fazenda e a tutela do economista Bernard Appy. Apesar dos desafios importantes para sua aprovação, há concordância entre os diversos segmentos da sociedade sobre sua necessidade e potenciais impactos positivos em termos de produtividade e PIB potencial.

Na seara macroeconômica, os sinais são desencontrados, ainda que o ministro da Fazenda tenha se tornado a referência de ponderação e sensibilidade à percepção de risco dos agentes econômicos. De um lado, o arcabouço fiscal, pelo menos em seu desenho inicial, trouxe limite sobre o crescimento dos gastos públicos que impede a repetição do ritmo expressivo de crescimento do período pré-teto, ainda que com várias indefinições e pontos de crítica, como a ausência de mecanismos de correção para efetiva redução de despesas. De outro, a proliferação de ataques à independência e condução da política monetária pelo Banco Central, que, na prática, tem gerado efeitos danosos à economia, dado o aumento da precificação de risco de intervenção na instituição e a piora das expectativas de inflação que, por sinal, tornam o cenário de redução de juros ainda mais distante.

Na agenda de promoção do crescimento econômico, velhas ideias voltam à tona, como a utilização de bancos públicos como o BNDES para alavancar os investimentos e, consequentemente, o crescimento econômico. Ainda que não existam medidas concretas, a sinalização de aumentar a importância dos desembolsos do banco em relação ao PIB e promoção de alterações na taxa de juros TLP mantêm a incerteza elevada quanto à potencial volta ao passado e seus custos ao orçamento e à economia.

A mesma coisa se verifica com relação à indústria de óleo e gás, que deve assumir papel de destaque na questão dos investimentos e expansão da atividade econômica, dada a diversidade de produtos industriais envolvidos na atividade de exploração e produção do pré-sal e de novas fronteiras de atuação (como a Margem Equatorial). O risco é a utilização da empresa para outros fins que não seu negócio principal, resultando em ineficiência e desempenho abaixo de seu potencial.

Por fim, fica descartada a possibilidade de avanço na agenda de privatização de empresas estatais como há dúvidas em relação à atração do setor privado em projetos de infraestrutura diante de mudanças regulatórias que estão sendo discutidas como é o caso do setor de saneamento, na medida em que discute-se um decreto que facilite a prestação do serviço por empresas estatais por meio de acordos diretos com os municípios e sem a necessidade de licitação e o papel da Agência Nacional de Águas (ANA) na formulação de normas de referência aos reguladores subnacionais. 

Em suma, entre acertos e sinais de retrocesso o cenário econômico construtivo dependerá da preservação dos pilares macroeconômicos com foco no fiscal e monetário e da minimização dos riscos relacionados a mudanças em preços, regulação e ambiente que limitem ou mesmo afastem a atuação do setor privado. Com esse cenário, a aprovação de reformas estruturais, como a tributária, terá efeitos expressivos sobre produtividade e crescimento potencial da economia brasileira.

 


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