Jornal Estado de Minas

Ferrovias em Minas: janela de oportunidade que se fecha?

Luiz Eduardo Pereira de Oliveira
Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental

André Tenuta
Ferroviarista
 
A história de Minas Gerais tem um forte vínculo com o desenvolvimento ferroviário, principalmente a partir da segunda metade do século 19 até 1930, quando as rodovias foram adquirindo proeminência, até se tornarem o principal modal de transporte das últimas décadas. Vale destacar que as ferrovias mineiras interligavam núcleos urbanos já constituídos, centros de produção e mercados já existentes, colocando em contato os principais centros urbanos da região com as capitais estadual e federal. Em muitos casos, geravam novas comunidades, a partir de estações construídas ao longo da malha.





O início da década de 1960 marca o auge da ferrovia em Minas Gerais, quando 8.854 quilômetros de linhas férreas eram ativas. Por ocasião da privatização, em 1996, restavam apenas 5.850 quilômetros, e hoje, 27 anos depois, nas mãos das concessionárias, restam, com algum trânsito, cerca de 3.500 quilômetros. Este massacre de linhas prontas ocorreu sob o olhar complacente de todos os governos estaduais desde então, que apenas assistiram ao que o federal e as concessionárias quiseram fazer. Vale destacar que, nesse processo, o transporte ferroviário privilegiou as cargas destinadas à exportação, em detrimento do transporte de passageiros e o movimento de cargas intercidades, como havia no passado.

Os contratos de concessão ferroviária assinados a partir de 1996 valeriam por 30 anos, porém, com o advento da Lei Federal 13.448/2017, abriu-se a oportunidade para a renovação antecipada, como já aconteceu com a Rumo Malha Paulista, Estrada de Ferro Vitória-Minas, Estrada de Ferro Carajás, e a MRS Logística. O mote principal seria a realização de investimentos não contemplados nos contratos originais, o que poderia ser vantajoso para Estado e sociedade. Na realidade, o novo modelo não conseguiu mitigar os problemas do risco de diminuição da malha, nem do subaproveitamento devido ao monopólio de uso das concessionárias.

No caso das malhas que cortam Minas Gerais (Vitória-Minas e MRS), o Estado perdeu uma grande oportunidade de atrair investimentos obrigatórios para a malha ferroviária estadual, garantindo tão somente algumas obras vinculadas à mobilidade urbana. Vale aqui destacar o trabalho da Comissão Pró-Ferrovias Mineiras, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que atuou fortemente em favor do ferroviarismo estadual, cujo esforço acabou resultando na elaboração do Plano Estratégico Ferroviário de Minas Gerais, e, indiretamente, resultou na criação da Superintendência de Ferrovias, da Secretaria Estadual de Infraestrutura e Mobilidade, hoje reduzida a uma diretoria.





A próxima concessionária submetida ao processo de renovação antecipada é a VLI/FCA. Existe a perspectiva de devolução de cerca de 1 mil quilômetros de linhas prontas no estado, além dos quase 500 quilômetros já devolvidos pela Resolução ANTT no 4131/2013. A este propósito, haverá uma Audiência Pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no dia 10/8/23, às 9h, onde serão discutidas as possibilidades de investimentos na malha estadual, como contrapartida ao aditamento contratual.

Alguns projetos despontam como prioritários, como é o caso da reativação do trecho Cataguases/MG a Três Rios/MG. O potencial econômico vai desde o transporte de bauxita e de produtos agroindustriais da Zona da Mata, ao transporte de passageiros, cujo projeto está sob responsabilidade da OSCIP Amigos do Trem. Outrossim, seria vantajoso o reaproveitamento do trecho Lavras a Varginha, no Sul de Minas, para transporte de cargas e passageiros, conectando aos portos de Santos e/ou Tubarão, no Espírito Santo.

Concluindo, sob a égide dos contratos de prorrogação já assinados (Vitória-Minas e MRS), existe ainda a possibilidade de investimentos em Minas Gerais com recursos da chamada outorga livre, ou seja, aquela que é paga ao Tesouro Nacional, sem vinculação específica. Também, há que se explorar os recursos previstos para patrimônio histórico ferroviário/desenvolvimento técnico do transporte ferroviário dos contratos renovados.

Enfim, a discussão sobre investimentos obrigatórios, e dos recursos adicionais acima citados, deverão ser objetos de debate na Audiência Pública envolvendo a renovação antecipada do contrato de concessão da VLi/FCA.