Jornal Estado de Minas

Tudo que você queria saber sobre depressão e ninguém te contou

Renan Cola 
Psicanalista  
 
“Não é só uma tristezinha!” A doença neuropsicológica chamada popularmente de depressão é a principal causa de incapacidade no mundo, atingindo 300 milhões de pessoas. Ainda, de acordo com estatísticas recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), quando comparado aos demais países da América Latina, o Brasil lidera, com 5,8% de sua população deprimida.





Entretanto, será que todo mundo sabe o que causa a patologia? Para a psicanálise, ciência que estuda os fenômenos inconscientes da mente humana, a depressão vai muito além do simples estado cinzento de ver a vida. Na visão de Freud e companhia limitada, tudo começa quando o aparelho psíquico de uma determinada pessoa, por algum motivo, entra em processo de cisão.

Nesta quebra, sequela bem comum nos grandes episódios traumáticos, como, por exemplo, na perda de um familiar querido, o psiquismo se divide em múltiplos pedaços. Muitos deles, por conta das emoções negativas que causam ao portador da enfermidade, são jogados para fora da psique, dando origem à sensação de perseguição que é facilmente observada na paranoia.

Já outros permanecem, mesmo que fragmentados, presos dentro do psiquismo, iniciando um ataque autodirigido em direção às partes que ainda permanecem unificadas. É por este motivo que o depressivo se martiriza tanto. Afinal, dentro dele existe uma luta constante: a parte boa, tentando salvar a homeostase orgânica e mental, e a ruim, castigando-o pelas suas ações.





Como consequência desta arapuca psicológica, alguns sintomas que fogem ao conhecimento do indivíduo leigo podem ser revelados e explicados. O primeiro deles é a desconexão. Sabe aquele hobby que você tanto gostava e que nem dá mais bola? Tudo culpa da falta de inteireza psíquica. Quanto mais em pedaços a mente está, menos conectada com o mundo ela ficará.

E o que dizer da constante falta de disposição? Quando os objetos que fazem parte da psique de um determinado sujeito não estão todos interligados, ocorre uma espécie de curto-circuito. Ou seja: a informação “A” terá que fazer mais força para chegar até “C”, uma vez que “B” está fora de operação, gerando uma sobrecarga elétrica que drena a energia de todo o sistema.

Sabe aquele cidadão que vive irritado? Outra manifestação clara de depressão. Desde a mais tenra idade, é comum a raiva estar associada à ideia de perda: “não tenho o seio da mamãe na hora que quero, dou-lhe uma dentada”. Neste estado melancólico prolongado, portanto, como a pessoa perdeu a ligação com o todo, é natural que ela esteja para lá de odiosa: “rrrrrrrrr”.





O apetite sexual sumiu? Fique atento. Sendo a potência genital de um ser humano dependente de um fluxo energético estabelecido nas fases psicossexuais do desenvolvimento infantil, que vão da gestação até a vida adulta, quando há uma ruptura, uma ou mais etapas podem ficar prejudicadas, impedindo que a libido chegue até os órgãos sexuais com a força necessária.

Para o deprimido, tudo está sempre ruim. Por que será? Conforme o mecanismo de introjetar continuamente as partes psíquicas destruídas avança, pode ser que projetar também seja um recurso para aliviar a angústia que causam as boas. É por isso que esta pessoa nunca consegue ver o copo meio cheio, pois o externo está sempre contaminado com a escuridão do interno.

A insônia está batendo à porta? A culpa é da depressão. Sentir-se ansioso demais, o que incide diretamente na qualidade do sono, é mais um sintoma que os objetos divididos causam ao psiquismo, deixando-o próximo de uma sensação real de aniquilamento. É por esta razão que o depressivo não dorme, já que o seu cérebro o deixa em um estado de alerta constante.





Está sempre passando por eventos negativos? Talvez seja por conta de uma culpa melancólica. Os fragmentos internos danificados, além de preocupação rotineira, geram igualmente culpa, uma vez que a psique irá punir quem causou a dissociação de seus componentes. O resultante será uma cadeia de situações desagradáveis destinadas a castigá-lo até que a morte os separe.

Por fim, dependendo da gravidade em que se encontra instalada a depressão, é possível que a sua raiz esteja nas gerações que antecederam o nascimento do ser em questão. Neste caso, a mente tentará se identificar com qualquer parte disponível, nem que sejam as já deterioradas. É aí que a doença passa para o corpo, gerando complicações bem mais graves para o portador.