Julia Fernandes
O Sistema de Pagamento pela Qualidade do Leite da CCPR/Itambé completa em 2016, 25 anos de implantação. O sistema é adotado pelas indústrias lácteas para incentivar que os produtores invistam em cuidados que resultem em melhor qualidade da matéria-prima.
“O sistema é uma atividade exercida em todo mundo. Sabe-se que as indústrias que associam ações de educação continuada ao pagamento por qualidade do leite, captam com maior valor agregado, fator que beneficia tanto os produtores como também às empresas, que garantem maior competitividade”, avalia a professora do curso de medicina veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Mônica Cerqueira.
O sistema foi desenvolvido inicialmente para atender aos produtores da Cooperativa Agropecuária de Bom Despacho (Cooperbom) no começo da década de 90, época em que se iniciou no Brasil, a implantação de medidas para refrigeração rápida do leite nas fazendas e a coleta à granel em tanques rodoviários, diretamente das propriedades nas quais o leite era produzido. Neste período também houve a liberação do controle de leite pelo governo, o chamado “fim do tabelamento dos preços”, sem intervenção estatal.
“Quando o sistema começou, a análise era relativamente simples. Avaliávamos somente a redutase, que é a análise que estima a quantidade de bactérias no leite cru e a lactofiltração, que avalia as condições de higiene em que a ordenha foi realizada por meio da quantidade de detritos presentes no leite. Hoje, o sistema evoluiu, já existem instruções normativas do governo que estabelecem os padrões de qualidade (Contagem Bacteriana Total – CBT, Contagem de Células Somáticas – CCS, matéria gorda e proteína) e adotamos um padrão de qualidade que é internacional”, explica o presidente da CCPR, Jacques Gontijo.
Com o tempo, o sistema se tornou mais desenvolvido e se estendeu às demais cooperativas singulares da CCPR/Itambé. De acordo com a analista de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Gado de Leite Letícia Mendonça, a obrigatoriedade da granelização do leite cru refrigerado veio com a publicação da Instrução Normativa 51 (IN 51), em 2002, época em que surgiu a maioria dos sistemas de pagamento por qualidade das empresas de produtos lácteos no país.
O Sistema de Pagamento pela Qualidade do Leite da CCPR/Itambé foi estruturado para oferecer o melhor programa de bonificação aos seus cooperados. A iniciativa, como define o médico veterinário e coordenador de Controle da Qualidade da CCPR/Itambé, Fernando Pinheiro, segue os parâmetros da IN 51, que foram atualizados pela IN 62. As cooperativas e indústrias estabeleceram seus próprios requisitos, que geralmente são mais rígidos que os oficiais.
Em linhas gerais, a IN 51 estabeleceu os critérios mínimos de qualidade físico-quimica, de higiene e sanidade. Já a IN 62, que entrou em vigor no final de 2011, teve como principal objetivo prorrogar, de forma escalonada, os prazos de atendimento aos limites estabelecidos de CCS e CBT do leite, sendo estabelecido como máximo de 300 mil ufc/mL para CBT e 500 mil cél/mL para CCS, até julho de 2016. Pelo sistema de pagamento, os produtores podem receber bonificações pela produção de alta qualidade, mas devem estar cientes de que podem ser incluídas penalizações para o leite de baixa qualidade.
“Para receber a bonificação máxima em CBT, por exemplo, é necessário que o resultado seja inferior a 30.000 ufc/mL, enquanto que o limite oficial é de 300.000 ufc/mL. Mas à medida que o resultado de cada parâmetro melhora em relação ao estabelecido pela normativa, o produtor começa a ser remunerado e se persistir na melhoria, ele pode atingir a bonificação máxima. Por outro lado, se o leite da propriedade apresenta resultados fora do padrão estabelecido, o associado poderá deixar de ganhar a remuneração e até mesmo ser descontado”, analisa Pinheiro.
O coordenador explica que para avaliar o leite de cada propriedade, a CCPR/Itambé preconiza no mínimo a coleta de duas amostras em dias aleatórios, para serem analisadas em laboratórios externos que pertencem à Rede Brasileira de Laboratórios da Qualidade do Leite (RBQL).
“Os resultados são divulgados por meio do vale de recepção do leite, via sms e no boletim enviado ao final do mês, no qual consta, inclusive, o quanto produtor receberá de qualidade por litro de leite”, contextualiza o profissional, que acredita que a principal vantagem do sistema, é incentivar ainda mais os produtores que se esforçam a produzir com qualidade e demonstrar a eles que se pode perder ou ganhar “se não houver o investimento em controles e processos corretos”.
Passado e presente
No período de implantação do sistema de bonificação da CCPR/Itambé, que foi concomitante ao processo de granelização, os produtores enfrentaram muitos desafios. Para a professora do curso de medicina veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Mônica Cerqueira, além do resfriamento nas temperaturas certas, era preciso rever os procedimentos e o manejo correto de ordenha, de limpeza dos equipamentos, verificar a qualidade da água na propriedade e promover treinamentos e capacitação da mão de obra, entre outras práticas, para produzir leite com qualidade.
“A CCPR/Itambé, por exemplo, iniciou a formação de um banco de dados sobre qualidade do leite, analisando a matéria-prima em laboratório próprio e nos laboratórios da RBQL, com o objetivo de implantar um programa consistente de pagamento pela qualidade. Foram feitos manuais sobre qualidade do leite e da água e ministradas palestras técnicas também. A partir do momento em que os produtores eram informados sobre o programa e o que era preciso fazer para atingir as metas, houve um interesse muito grande pela adequação e os resultados demonstram que com orientação técnica, os resultados aparecem”, explica.
Com a modificação no cenário produtivo do leite no Brasil, os produtores têm conseguido melhorar seus parâmetros de qualidade. E o esforço para manter os bons resultados é empenhado pela equipe de Desenvolvimento do Produtor da CCPR/Itambé, que disponibiliza iniciativas como, as “Visitas da Qualidade” e o “Programa de Melhoria da Qualidade (PMQL)”, além dos programas da área de Projetos Agropecuários, como Educampo e Balde Cheio.
“O principal desafio para a atividade leiteira é a gestão da produção como um todo. O produtor, muitas vezes, deixa a fazenda na mão dos funcionários, sem fazer a gestão dos indicadores e avaliação do seu retorno financeiro. É preciso trabalhar com números e metas pré-estabelecidas para conseguir atingir o seu objetivo. Quando um produtor inclui em sua gestão, a melhoria da qualidade, alguns indicadores são monitorados e várias ações passam a fazer parte da rotina da fazenda, como as definições de escala de trabalho, valorização do trabalhador, análise individual do leite das vacas, sanidade do rebanho, etc. Tudo isso gera resultado e bonificação”, analisa Janaína Giordani, coordenadora de Desenvolvimento do Produtor da CCPR/Itambé.
Pioneirismo
O presidente da CCPR, Jacques Gontijo, acredita que a ação pioneira é vista com bons olhos pelo mercado e representa credibilidade. “Nós antecipamos a criação de um sistema que é muito importante para a cadeia produtiva do leite. Ao adotarmos rigorosos padrões de qualidade, conseguimos fazer com que a CCPR/Itambé tenha uma marca de leite respeitada e um produto confiável para o consumidor”, destaca.