Os desafios ainda são muitos para aqueles que tiveram seu ganha-pão impactado em Brumadinho. O primeiro deles, recuperar o prejuízo financeiro. O segundo, reconquistar a clientela. A produtora rural e administradora Carla de Laci, de 46 anos, proprietária da Fazenda Saint 'Etienne na comunidade de Pires, uma das mais atingidas pelo rompimento, tem vários arrendamentos rurais de hortifrutigranjeiros, pecuária, parcerias, aluguéis, empreendimentos e produção rural.
Seus arrendadores foram obrigados a jogar a produção inteira fora porque os clientes acharam que os produtos estavam contaminados. “Eles usam água de nascentes, mas como explicar isso para os compradores? Morreram animais que ficaram sem acesso à água do rio Paraopeba”, relata. A expectativa dela é de que a água que viu sair limpa da Estação de Tratamento de Água Fluvial (Etaf) – uma das obras para recuperar o Paraopeba – e cair no leito do rio chegue logo à sua propriedade e às dos vizinhos, eliminando o risco de contaminação e proporcionando a todos retomar vida normal.
Pires tem 200 moradores, num total de 70 famílias. O Paraopeba corta a comunidade por cerca de 1,5 quilômetro. Além da ETAF, está em funcionamento um reservatório formado por cortinas de estacas - pranchas metálicas para conter os rejeitos. Segundo a Vale,as intervenções devem ser concluídas antes do período chuvoso, a partir de outubro. A recuperação ambiental do Paraopeba depende desse conjunto de obras, que têm como objetivo conter ao máximo os rejeitos que ainda estão sendo carreados para o rio. As intervenções fazem parte de um pacote de investimentos de aproximadamente R$ 1,8 bilhão, a serem aplicados ao longo dos próximos anos, que inclui ainda estabilização das estruturas remanescentes dentro da mina do Córrego do Feijão e a reconstrução de equipamentos públicos de Brumadinho.
As obras de contenção estão divididas em três trechos. O primeiro abrange 10 quilômetros a partir da barragem que se rompeu até a confluência do Ribeirão Ferro-Carvão com o Rio Paraopeba. Nesse local, está assentado o rejeito mais espesso. Estima-se que ali estejam depositados entre 6 milhões e 7 milhões de metros cúbicos do material que vazou da B1. Na área, a mineradora está construindo 23 estruturas,das quais 15 de contenção com altura de até 5 metros, duas barreiras hidráulicas filtrantes e um dique, além do reservató-rio de estacas-prancha e a ETAF, ambos em funcionamento. A água tratada na estação chega com valores acima de 20 mil NTU e é devolvida ao Paraopeba com índices abaixo de 15 NTU, em média. Os padrões de turbidez do Conselho Nacional de Meio Ambiente(Conama) são de até 100 NTU.
As ações de dragagem previstas para o Trecho 2, da confluência do Ribeirão Ferro-Carvão com o Paraopeba ao município de Juatuba, ainda estão sendo discutidas com as comunidades. Já no trecho 3, entre Juatuba e a Usina de Retiro Baixo, no município de Pompéu,em uma faixa de aproximadamente 170 quilômetros do Paraopeba, o foco é reduzir o carreamento de rejeitos mais finos.
“Essa água que está sendo tratada na ETAF chegará também ao meu terreno. Consigo entender que foram feitas barreiras para conter os sedimentos”, conta Carla de Laci. A produtora rural, que é integrante do Conselho Municipal de Desenvolvimento Sustentável e Planejamento de Brumadinho,visitou a ETAF. “O assoreamento existe há muitos anos. Todos os moradores foram convidados para conhecer a estação. A olhos vistos, esse projeto é muito bacana, mas pena que só veio neste momento. A água fica cristalina. É possível ver o fundo, não há turbidez”, conta.
MONITORAMENTO
Paralelamente às obras de contenção, a Vale continua realizando o monitoramento diário no Paraopeba, iniciado no dia seguinte ao rompimento da barragem. Já é possível verificar que a água em alguns pontos do rio começa a voltar à sua condição original, após início do período de estiagem. A área com maior turbidez concentra-se em até 40 quilômetros da barragem B1. A empresa também estima que é muito pouco provável que os rejeitos alcancem o Rio São Francisco. São 66 pontos de monitoramento, cobrindo mais de 2,6 mil quilômetros de extensão.
Os índices de toxicidade estão abaixo dos limites legais para rejeitos de mineração, de acordo com a NBR 10.004, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). O trabalho é conduzido por cinco laboratórios especializados, envolvendo aproximadamente 250 profissionais. A Coordenação de Programas de Pós-Graduação em Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ), foi contratada para validar os dados.