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Estado de Minas

Modernismo contemporâneo

Catorze artistas-poetas brasileiros e portugueses lançam neste sábado a e-plaquete 2022, série de trabalhos conceituais em homenagem à Semana de Arte Moderna


12/02/2021 04:00

(foto: tchello d%u2019barros/divulgação)
(foto: tchello d%u2019barros/divulgação)

Há 99 anos, em 13 de fevereiro, começava a Semana de Arte Moderna, que se tornaria um divisor de águas na arte brasileira. Apesar do nome semana, foram apenas três dias de eventos, o que mostrava que não se queria seguir regras. Agora, um ano antes do centenário do movimento revolucionário de 1922, 14 artistas-poetas (10 brasileiros e quatro portugueses) lançam amanhã, com publicação em redes sociais, revistas e sites, a e-plaquete 2022, segunda dentição, com trabalhos poéticos e conceituais de várias vertentes, numa homenagem contemporânea e subversiva à moderna semana de três dias.

Editada pelos mineiros Carlos Barroso e Jairo Fará – autor do projeto visual da e-plaquete – participam da 2022 os poetas Ana Caetano, Ana Hatherly, Carlos Barroso, Fernando Aguiar, Guilherme Mansur, Jairo Fará, João Diniz, João Evangelista, Jorge Vicente, Luís Turiba, Noélia Ribeiro, Nuno Rau, Silvana Guimarães e Tchello d’Barros
(foto: silvana guimarães/divulgação)
(foto: silvana guimarães/divulgação)

Cartografia de imagens 
(im)precisas, peregrinas

“A e-plaquete 2022, desde o seu primeiro número, não buscou meramente a efeméride, a simples homenagem ao evento que demarcou o Modernismo no Brasil, e sim a discussão poética e artística por meio da poesia, em formas variadas e acepções, do tempo em que vivemos – marcado por vírus, não só sanitários e pandêmicos, mas também políticos e sociais. Época em que a arte, a literatura, a poesia, mesmo sendo colocadas contra a parede, até vilipendiadas, buscam a criatividade, a irreverência e a criticidade entre outros movimentos demarcados pela estética, como possíveis saídas ou desafogo”, explica Carlos Barroso. 

Além da coincidência programada (13 de fevereiro), “a publicação tem como proposta se apropriar do espírito contestador do Modernismo e de sua principal vertente artística, o Movimento Antropofágico”, lembra Jairo Fará. Relembrar grandes nomes da 1922, como Villa Lobos, Manuel Bandeira, Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Vitor Brecheret, Oswald de Andrade e Mário de Andrade. Agora, homenageados por nomes de 2022, já em 2021.

Tida Carvalho* / Adolfo Cifuentes**
(foto: ana hatherly/divulgação)
(foto: ana hatherly/divulgação)

Toda obra de arte desenvolve uma lei, mas não começa com uma, não começa conceitualizando-a. Assim podemos pensar essas datas: 1922, 2021, 2022, sequências fragmentadas da matéria textual, um percurso não linear e intermitente. O pensamento plástico que orienta as composições/poemas da Plaquete 2022, segunda dentição, organizada por Carlos Barroso e Jairo Fará, em aproximações temporais elásticas e antecipatórias, palavras e linhas são (re)organizadas numa arquitetura de concisão, que valoriza tempo e espaço em branco da página – herança de Mallarmé – e o registro visual do texto como mancha, incisão, grafia, ruído. E assim podemos vislumbrar a dimensão plástica da escrita, do pensamento, do déjà-vu visto de novo, com formas novas.

Percebemos a materialidade das palavras e gestos em paisagem, uma forma cênica do texto, segundo os poetas que fazem parte desta dentição, dentes de leite com 100 anos de idade e 100 flores em poemobjetos. A coletânea, encabeçada por Ana Caetano, poeta inconteste, permeada por Marcelo Dolabela, uma flor exalada nos textos, desenha uma tendência literária em que há procedimentos formais compartilhados pelos po- etas, ainda que com diferenças de dicção e de mitologia pessoal, trazem o uso constante da elipse, a ruptura sintática, o desenvolvimento não linear da composição, a fragmentação do discurso em uma sintaxe do descontínuo, do simultâneo, do inacabado que engendra tempos e espaços numa linha que nunca termina.

A maquinaria inventiva, surpresas de imagem, sonora ou sintática, novas linhas prosaicas, dissonâncias, tensões sociais e individuais, em relâmpagos, em vertigens de denúncias, sociais ou existenciais, a aproximação inusitada de referências, que podem pertencer a realidades diferentes, como em Lautréamont em Os cantos do Maldoror, que imagina “o encontro fortuito de um guarda-chuva e uma máquina de costura sobre uma mesa de dissecação”, formulação que descende das metáforas de agudeza da poética barroca.

Retratos de artistas quando jovens, quando velhos ou envelhecidos, a poesia modernista de 1922, Mários e Oswalds, os mais inventivos entre tendências estéticas – minimalismo, neobarroco, poesia visual, etnopoesia, surrealismo, dolabelismo, entre outras. Nesta Plaquete 2022, segunda dentição percebemos a poesia que vive em conflito com o tempo e o pensamento, manifestada pela tensão na linguagem, projetos coletivos e individuais que afirmam uma identidade híbrida como artefato estético em múltiplas dimensões sonoras, imagéticas, verbais, visuais, em muros e extramuros, em poemobjetos em formas cênicas do texto, em fragmentos que se compõem em paisagem, um estranho extramuro.

Como continuar sendo vanguardista e moderno numa era na qual as vanguardas viraram período histórico e a modernidade virou pós-modernidade, alter modernidade, modernidade líquida e contemporaneidade? Existiram os pioneiros vanguardistas avant la lettre, mas continuar sendo um vanguardistas après la lettre, em meio a uma modernidade já fechada, não seria, paradoxalmente, uma forma de conservadorismo démodé e ultrapassado? Hal Foster (Funeral para um cadáver errado) Boris Groys (Sobre o novo), Antoine Compagnon (Cinco paradoxos da modernidade), Peter Burger (Teoria da vanguarda) e muitos outros se depararam, a partir de diversos pontos de vista, sobre esse grande enigma colocado pela esfinge da história ou, melhor, pelo anjo da história, para lembrar a Benjamin, um dos insígnes heróis/mártires dessa rica e fundacional herança moderna.

*Pesquisadora, pós-doutora em poesia com estudos sobre Haroldo de Campos e Roberto Bolaño pela UFMG, professora de literatura da Unimontes e poeta. Autora de O catatau de Paulo Leminski (Editora Cone Sul)

**Artista visual e pesquisador, vice-diretor da Escola de Artes (EBA/UFMG), professor de Fotografia Cinema (EBA). Graduado em letras pela Universidade de La Sabana (Bogotá). Especialização em língua e literatura russa pelo Instituto Pushkin (Moscou)  
(foto: jairo fará/divulgação)
(foto: jairo fará/divulgação)

E-plaquete 2022, segunda dentição
Edição: Carlos Barroso e Jairó Fará
Trabalhos: Ana Caetano, Ana Hatherly, Carlos Barroso, Fernando Aguiar, Guilherme Mansur, Jairo Fará, João Diniz, João Evangelista, Jorge Vicente, Luís Turiba, Noélia Ribeiro, Nuno Rau, Silvana Guimarães e Tchello d’Barros
Como acessar: https://issuu.com/jairo.faria/docs/plaquete_2020_segunda_denti__o_final 


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