“Sobre estar doente”
Tradução de Ana Carolina Mesquita e Maria Rita Drumond
128 páginas
R$ 35
Quase cem anos depois de sua primeira publicação com o título original “Being ill”, o ensaio de Virginia Woolf reemerge atualíssimo, pela primeira vez traduzido no Brasil a partir do texto originalmente publicado pela Hogarth Press, editora britânica fundada em 1917 pelo casal Leonard e Virginia Woolf. Trata-se da versão revisada por Woolf em seu último trabalho como tipógrafa, compositora e preparadora de texto, à frente de todo o processo de “transformar em livro as palavras que vieram à sua mente”, assinala Ana Carolina Mesquita, que compartilha a tradução com Maria Rita Drumond Viana.
Para além da dor do corpo que emerge “quando as luzes da saúde se apagam”, há beleza na doença, descrita pela autora como uma viagem a “assombrosas terras desconhecidas”, entre “ermos e desertos da alma”, “precipícios e prados salpicados de flores coloridas”, capaz de desenraizar em nós “os carvalhos antigos e obstinados”. Tal é a transformação espiritual que essa circunstância tão comum em nossa existência proporciona, diz ela, nos libertando da escravidão do combate diário em ser produtivos, ao mesmo tempo em que a cabeça deitada nos libera do “exército de eretos”, descortinando paisagens não vistas, uma nova percepção da realidade, que agora mira para cima e para o céu, em um “tempo de presente suspenso”.
Virginia Woolf estranha que “a doença não tenha conquistado, ao lado do amor, das batalhas e do ciúme, seu lugar entre os principais temas da literatura”. Não o faz porque a literatura se esforça em demonstrar a primazia da mente sobre o corpo, diz ela. Entretanto, o que ocorre é justamente o contrário, acredita a autora, lembrando como o corpo intervém sobre a mente, trava grandes guerras, “tendo o pensamento como seu escravo”, contra febres e melancolias, na solidão de um quarto.
Para além da dor do corpo que emerge “quando as luzes da saúde se apagam”, há beleza na doença, descrita pela autora como uma viagem a “assombrosas terras desconhecidas”, entre “ermos e desertos da alma”, “precipícios e prados salpicados de flores coloridas”, capaz de desenraizar em nós “os carvalhos antigos e obstinados”. Tal é a transformação espiritual que essa circunstância tão comum em nossa existência proporciona, diz ela, nos libertando da escravidão do combate diário em ser produtivos, ao mesmo tempo em que a cabeça deitada nos libera do “exército de eretos”, descortinando paisagens não vistas, uma nova percepção da realidade, que agora mira para cima e para o céu, em um “tempo de presente suspenso”.
Virginia Woolf estranha que “a doença não tenha conquistado, ao lado do amor, das batalhas e do ciúme, seu lugar entre os principais temas da literatura”. Não o faz porque a literatura se esforça em demonstrar a primazia da mente sobre o corpo, diz ela. Entretanto, o que ocorre é justamente o contrário, acredita a autora, lembrando como o corpo intervém sobre a mente, trava grandes guerras, “tendo o pensamento como seu escravo”, contra febres e melancolias, na solidão de um quarto.
“Pensamentos de paz durante um ataque aéreo”
Tradução de Ana Carolina Mesquita
80 páginas
R$ 28
Publicado postumamente, foi escrito por Virginia Woolf em 1940 durante um ataque aéreo à Inglaterra. Ela está em sua casa em Rodmell, localizada a apenas seis quilômetros de distância de Newhaven, onde o exército nazista, na frustrada operação Leão Marinho, pretendia atracar. “Os alemães sobrevoaram esta casa na noite passada e na anterior. Aqui estão eles de novo. É uma experiência estranha, ficar deitada no escuro ouvindo o zumbido de uma vespa que a qualquer momento pode matar você com uma ferrroada. É um som que interrompe qualquer pensamento contínuo e racional sobre a paz.
E, no entanto, é um som que – muito mais que as orações e os hinos nacionais – deveria nos impelir a pensar sobre a paz. Se não pensarmos na paz como uma realidade, nós – não este corpo específico nesta cama específica, mas os milhões de corpos que ainda estão por nascer – iremos jazer na mesma escuridão e escutaremos o mesmo estrépito da morte acima das nossas cabeças”, registra a autora, numa profunda reflexão sobre a violência, a guerra e o papel das mulheres no conflito.
A autora intercala a vívida descrição dos aviões que interrompem a quietude da noite, sobre o telhado de sua casa. “Uma bomba cai. Todas as janelas chacoalham”, relata, enquanto reflete sobre como são prisioneiros os homens em seus aviões; as mulheres em suas camas. Todos são escravos e podem acabar mortos. “Tentemos arrastar até a consciência o hitlerismo inconsciente que nos tolhe. Ele é o desejo de agressão; o desejo de dominar e escravizar. Mesmo no escuro podemos enxergar isso com clareza. Podemos ver o esplendor nas vitrines das lojas; e mulheres olhando; mulheres pintadas; mulheres arrumadas; mulheres com lábios carmesim e unhas carmesim. São escravas tentando escravizar. Se pudéssemos nos libertar da escravidão, libertaríamos os homens da tirania. Os Hitlers são gerados por escravas”, afirma a autora, considerando como a emoção do medo e do ódio é estéril e infértil.
“Tão logo o medo se vai, a mente se expande e instintivamente revive, buscando criar. Como o quarto está às escuras, só lhe é possível criar a partir da memória. Ela se expande até outros agostos – em Beirute, ouvindo Wagner; em Roma, caminhando pela Campagna; em Londres”. A autora afirma que são as ideias, os sentimentos criadores que geram felicidade e libertam o ser humano, retiram-no de sua prisão para o ar livre.
E, no entanto, é um som que – muito mais que as orações e os hinos nacionais – deveria nos impelir a pensar sobre a paz. Se não pensarmos na paz como uma realidade, nós – não este corpo específico nesta cama específica, mas os milhões de corpos que ainda estão por nascer – iremos jazer na mesma escuridão e escutaremos o mesmo estrépito da morte acima das nossas cabeças”, registra a autora, numa profunda reflexão sobre a violência, a guerra e o papel das mulheres no conflito.
A autora intercala a vívida descrição dos aviões que interrompem a quietude da noite, sobre o telhado de sua casa. “Uma bomba cai. Todas as janelas chacoalham”, relata, enquanto reflete sobre como são prisioneiros os homens em seus aviões; as mulheres em suas camas. Todos são escravos e podem acabar mortos. “Tentemos arrastar até a consciência o hitlerismo inconsciente que nos tolhe. Ele é o desejo de agressão; o desejo de dominar e escravizar. Mesmo no escuro podemos enxergar isso com clareza. Podemos ver o esplendor nas vitrines das lojas; e mulheres olhando; mulheres pintadas; mulheres arrumadas; mulheres com lábios carmesim e unhas carmesim. São escravas tentando escravizar. Se pudéssemos nos libertar da escravidão, libertaríamos os homens da tirania. Os Hitlers são gerados por escravas”, afirma a autora, considerando como a emoção do medo e do ódio é estéril e infértil.
“Tão logo o medo se vai, a mente se expande e instintivamente revive, buscando criar. Como o quarto está às escuras, só lhe é possível criar a partir da memória. Ela se expande até outros agostos – em Beirute, ouvindo Wagner; em Roma, caminhando pela Campagna; em Londres”. A autora afirma que são as ideias, os sentimentos criadores que geram felicidade e libertam o ser humano, retiram-no de sua prisão para o ar livre.
“A morte da mariposa”
Tradução de Ana Carolina Mesquita
48 páginas
R$ 22
Ensaio clássico, foi escrito no contexto da Segunda Guerra Mundial, já ao final da vida dela, sob o assombramento das bombas, batalhas, mortes e os campos de extermínios que cercam o continente. Embora em momento algum a guerra alcance a superfície do belíssimo texto de Woolf, é sobre esta que a autora reflete todo o tempo. A autora observa numa bela manhã de outono, o entusiasmado voo dessa frágil criatura híbrida, diurna, que não tem a alegria das borboletas nem é sombria como as noturnas de sua própria espécie.
“A mesma energia que inspirava as gralhas, os lavradores, os cavalos e até mesmo, assim parecia, as colinas de costas nuas, fazia a mariposa esvoaçar de um lado para o outro no seu quadrado da vidraça. Era impossível afastar os olhos. Sem dúvida, tínhamos consciência de um estranho sentimento de pena por ela. As possibilidades de prazer naquela manhã pareciam tão gigantescas e tão diversas, que contar apenas com o quinhão de vida que cabe a uma mariposa – e a uma mariposa diurna, ainda por cima – parecia ser um duro destino, e o entusiasmo que ela sentia em aproveitar ao máximo as suas oportunidades minguadas, ridículo”.
Face à iminência da inevitável morte, é precisamente sobre a pulsão da vida que reflete Virginia Woolf, contrastando com ternura a luta do delicado inseto para conservar aquilo que ninguém mais valorizava ou desejava manter: “Só se podia observar os esforços extraordinários das perninhas minúsculas contra uma sina que se avizinhava e que poderia, se quisesse, submergir uma cidade inteira, e não apenas uma cidade, mas massas de seres humanos: nada, eu sabia, tinha a menor chance contra a morte. No entanto, após uma pausa de exaustão, as pernas se agitaram mais uma vez. Esse último protesto foi esplêndido, e tão frenético que ela conseguiu afinal se aprumar. Nossas simpatias, obviamente, estavam do lado da vida”.
“Um esboço do passado”
Tradução de Ana Carolina Mesquita
128 páginas
R$ 48
Último ensaio de Virginia Woolf, foi escrito entre abril de 1939 e novembro de 1940. Sob espectro dos campos de concentração nazista e da Segunda Guerra Mundial, aos 59 anos, em 28 de março de 1941, Virginia Woolf, pressentindo os sinais de um novo colapso mental, encheu os bolsos do casaco com pedras e se lançou ao rio Ouse. “Um esboço do passado”foi publicado postumamente: os textos não foram revisados e preparados pela autora, como costumava fazer; encontram-se preservados em sua qualidade de esboço. “Há dois manuscritos datilografados que foram usados pela pesquisadora Jeanne Schulkind para compilar a versão aqui apresentada: um que se encontra na Universidade de Sussex e outro na British Library”, explica a tradutora da obra, Ana Carolina Mesquita.
Escrevendo a biografia de seu grande amigo, o pintor e crítico de arte Roger Fry (1866–1934), profundamente impactada por mais uma guerra, Virgínia Woolf estava em sofrimento, com dificuldade para dar forma linear aos fatos, emoções e impressões. Considera o conselho de sua irmã, Vanessa Bell, e começa a escrever as próprias memórias. “O que temos é uma autora em sua plenitude, que se debruça sobre o próprio passado: porém de um modo peculiar. Como leitora de diários, memórias e biografias, Virginia aponta que o maior problema desse tipo de literatura era deixar de fora a pessoa de quem se fala, enfatizando apenas aquilo que lhe acontece. Encontra, então, uma forma em que ela se justapõe simultaneamente: presente e passado se intercambiam, mesclando o estilo memorialista e o diarístico”, afirma Ana Carolina Mesquita. Sob a indagação de “quem era eu, então?”,
Virginia Woolf se olha do lugar em que está no tempo, incluindo o presente no passado e vice-versa, em permanente diálogo consigo mesma: “2 de maio… Escrevo a data porque creio que descobri uma forma possível para essas anotações. Isto é, fazer com que incluam o presente – pelo menos o bastante para que ele sirva de plataforma onde se pôr de pé. Seria interessante fazer com que as duas pessoas, a eu de agora, a eu de antes, fossem colocadas em contraste. Além do que, esse passado é muitíssimo afetado pelo presente. O que escrevo hoje não escreverei daqui a um ano. Mas não consigo colocar isso em prática; melhor deixá-lo ao acaso, já que escrevo aos arrancos, para tirar umas férias de Roger”. E assim, a autora, neste derradeiro e impressionante ensaio, de forma magistral e poética, constrói a si mesma em sua escrita, elevando-se sobre um mundo em destroços.
“Os Diários - Volume 1 (1915-1918)”
Tradução de Ana Carolina Mesquita
344 páginas
R$ 70
A partir do ano de 1897, entre os 15 anos até quatro dias antes de se suicidar, em 1941, com algumas poucas interrupções, Virginia Woolf escreveu diários. Foram 33 cadernos, classificados pela tradutora Ana Carolina Mesquita, como algo próximo a um “hub”da produção da autora de romances como “Mrs Dalloway”, “Ao farol”e “As ondas”. “Todas as obras dela convergiam para aquele diário de alguma maneira e também saíam dele. Quando comecei a estudar os manuscritos, percebi que quando ocorria alguma ideia - por exemplo aquela que originou o romance “O quarto de Jacob”(1922) - começava a escrever, trabalhava aquilo, discutia a própria literatura, o que pretendia fazer, e depois dava a nova forma. Eram uma espécie de sketchbook, em que testava personagens, testava a voz dela, testava observar a consciência”, considera Ana Carolina.
Publicado pela primeira vez em 1953 com muitos cortes feitos pelo marido dela, Leonardo Woolf, a edição integral do diário adulto de Virginia Woolf só foi lançada entre 1977 e 1984: cobriram 26 cadernos - englobando o período entre 1915 a 1941 - , a partir de um esforço de pesquisa da estudiosa em literatura Anne Olivier Bell, casada com Quentin Bell, sobrinho da autora.
Esse trabalho de Bell, que teve a ajuda de Andrew McNeillie a partir do terceiro volume, foi a base para a presente edição do primeiro volume dos diários, inéditos em português, agora lançado no Brasil e em Portugal. Até o centenário de publicação de Mrs Dalloway, em 1925, a Nós programa publicar as edições traduzidas dos outros quatro volumes. “Esse primeiro volume dos diários compreende o período em que Virginia Woolf está se formando como escritora. É impressionante a proximidade que alcançamos com ela nessa obra. E é muito bonita a forma como percebemos a autora em busca dessa voz, não achando, e usando o diário para isso, para conseguir se encontrar como escritora. Pelos diários conseguimos acompanhar como, a cada ano, Virginia Woolf vai ficando mais senhora de si, consagrando-se nesta autora que a literatura mundial reverencia”, afirma Ana Carolina Mesquita.