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Estado de Minas PENSAR

Às armas: guerras foram cruciais para manutenção de território continental

Fundado com área que ia do 'Rio da Prata ao Rio Amazonas', Brasil teve batalhas que definiram sua unidade como um só Estado


02/09/2022 04:00 - atualizado 02/09/2022 01:13

Ilustração
As guerras que se seguiram à proclamação da independência constituíram o instrumento para a consolidação territorial do Império do Brasil em sua dimensão continental, em princípio, do Rio da Prata ao Rio Amazonas. Entre 1822 e 1823, os confrontos mobilizaram mais de 60 mil soldados e levaram à morte de 3 mil a 5 mil pessoas, segundo registra o historiador Hélio Franchini Neto, especialista nesses teatros de guerra, detalhados na obra “Redescobrindo a Independência – Uma história de batalhas e conflitos muito além do 7 de Setembro” (Benvirá, 2022).
Disputadas entre Brasil e Portugal, as guerras concentraram-se em três grandes porções do território, estratégicas para a navegação. A primeira, na Província da Bahia, ao centro da costa litorânea, da qual as embarcações transitavam ao norte e ao sul. A segunda, na Província Cisplatina (atual Uruguai) e do Rio Grande, foco de disputa secular (1680-1828) com a Espanha, desembocadura de três grandes rios, entre os quais o Prata, forma mais eficiente de se alcançar as províncias centrais do Mato Grosso e Goiás, além do Pacífico, evitando-se o Estreito de Ma- galhães. E a terceira, ao Norte (atual Norte-Nordeste), por onde se chegava a Lisboa mais rapidamente do que a Salvador; cinco províncias se envolveram diretamente nas guerras: Ceará, Piauí, Pernambuco, Mara- nhão e Grão-Pará. 

Diferentemente do que se passou na Bahia, em que as batalhas se mantiveram nos limites das províncias, no Norte, a dinâmica foi outra, conforme aponta Hélio Franchini Neto.  “Após ter se iniciado no Piauí, os combates se espalharam pelas fronteiras, numa dinâmica marcada pela disposição das então províncias do Grão-Pará, Maranhão e alguns grupos do Piauí, defensores do Vintismo, terem empregado o uso da força para defender a causa de Lisboa”, afirma Franchini Neto.  Em contraposição, os grupos que gradualmente passaram a apoiar Dom Pedro não eram fortes o suficiente para se impor apenas no plano político. “A guerra entraria, então, em cena a partir do Piauí”, considera o historiador. 

Território em disputa com a Espanha, com presença constante de tropas portuguesas, que procuravam garantir a instável fronteira sul, a Cisplatina foi um teatro bem distinto daquele que se desenhou no Norte-Nordeste ao longo do processo de independência do Brasil. “Era zona permanentemente em conflito, precariamente vinculada ao Reino do Brasil”, aponta Franchini Neto. Foi o mais longo na sucessão de conflitos que se seguiram à proclamação da independência e viria a se transformar na primeira guerra internacional do Império do Brasil, a Guerra da Cisplatina (1825-1828), opondo o Brasil Império às Províncias Unidas do Prata, atual Argentina. Levaria à criação do Uruguai. 


BAHIA, CONFRONTO CENTRAL


Tanto para o Rio de Janeiro quanto para Lisboa, a Bahia era consi- derada a mais estratégica das províncias em disputa. Rica, populosa e situada ao centro da costa do Atlântico, Salvador – colônia ultramar entre 1549 e 1763 – era, à época, fundamental para o controle da navegação entre províncias ao norte e ao sul. Na avaliação de Hélio Franchini Neto, caso Portugal tivesse vencido a guerra na Bahia, a formatação continental do Império do Brasil  teria sido outra. “Se Lisboa ganhasse a Bahia, conseguiria reverter Pernambuco, que se colocou, naquele momento, condicionalmente ao lado de Dom Pedro. Isso  significaria cortar o Norte do Sul do Brasil”, explica ele. 

Palco da mais inclusiva das conjurações, a Baiana (1798), e local onde republicanos e federalistas da Revolução Pernambucana de 1817 ficaram presos, na Bahia, a articulação contra o “centralismo” do Rio de Janeiro havia aflorado com força em fevereiro de 1821, quando ali chegou a notícia da Revolução do Porto. Três tendências se afunilam àquela altura contra o Rio de Janeiro:  o grupo batizado de “partido eu- ropeu”, que defendia a estreita união com Portugal; e dois grupos, de visões diferentes, formados por senhores de engenho, servidores públicos e eclesiásticos, que se dividiam num partido de inspiração “aristocrata” e outro de viés “democrata”.  Enquanto “aristocratas” pregavam um “governo independente de Portugal, com uma Constituição e duas Câmaras”  – que poderia ser uma república ou monarquia constitucional, o segundo, defendia  o  federalismo, expresso em “governos pro- vinciais independentes”. 

Entretanto, o curso dos acontecimentos na Bahia favorável a Portugal se alteraria em fevereiro de 1822, quando Manoel Pedro de Freitas Guimarães, personagem-chave do movimento em defesa das Cortes Constituintes de Portugal, foi substituído em benefício de Ignacio Luiz Madeira de Mello no importante cargo de governador das Armas da Bahia. O Rio de Janeiro soube explorar a dissensão interna do movimento baiano, que emergiu fortemente com o preterimento de Manoel Pedro de Freitas pelo além-mar. Com a promessa de convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, Dom Pedro atraiu os partidários dele. Um ano antes, Manoel Pedro de Freitas Guimarães, então governador, declarara na Câmara Municipal em Salvador o auto de aceitação do sistema constitucional proposto por Lisboa. Dessa forma, aquela que nascera como uma guerra civil local entre dois grupos partidários de Lisboa, incorporou a dimensão nacional das guerras de Independência que se armaram entre o Rio de Janeiro e as Cortes Constituintes de Portugal.

Houve um cenário militar específico da cidade de Salvador e a disputa acirrada pelo controle da Baía de Todos os Santos, com Lisboa enviando tropas regulares e, da mesma forma, o Rio de Janeiro, afirma o historiador Hélio Franchini Neto. 

Pierre Labatut, militar francês veterano das guerras de libertação espanhola, assumiu a organização do chamado Exército Pacificador de Dom Pedro. “O Rio de Janeiro conseguiu o apoio de batalhões pernambucanos, uma companhia da Paraíba que tinha soldados mineiros e soldados do Espírito Santo.  Em 1823, o batalhão do imperador, com 200 soldados, foi enviado do Rio de Janeiro”, descreve Hélio Franchini. Foi um teatro de operações muito intenso e equilibrado, entre novembro de 1822 e 2 de julho de 1823, até a  decisiva Batalha de Pirajá, quando uma nova esquadra organizada pelo Rio de Janeiro rompeu a comunicação por mar das forças de Lisboa, com o desenlace do impasse e a fuga das tropas portuguesas. 

Para saber mais

 
Redescobrindo a Independência – Uma história de batalhas e conflitos
muito além do 7 de Setembro
Autor: Hélio Franchini Neto
Editora: Benvirá, 2022
Páginas: 384
Preço: R$ 50,92

A outra Independência – Pernambuco 1817-1824
Autor: Evaldo Cabral de Mello
Prefácio: Heloísa M. Starling
Editora: Todavia, 2022
Páginas: 288
Preço: R$ 94,90 E-book: R$ 54,90

Ser republicano no Brasil – A história de uma tradição esquecida
Autor: Heloísa Starling
Editora: Companhia das Letras, 2018
Página: 376
Preço: R$ 77,90 E-book: R$ 39,90


Independência do Brasil – As mulheres que estavam lá
Organizadoras: Heloísa M. Starling e Antonia Pellegrino
Editora: Bazar do Tempo, 2022
Páginas: 224
Preço: R$ 62,90

O sequestro da Independência – Uma história da construção do
mito do Sete de Setembro 
Autores: Carlos Lima Junior, Lilia Moritz Schwarcz e Lúcia Klück Stumpf
Editora: Companhia das Letras, 2022
Páginas: 378
Preço: R$ 99 E-book: R$ 44,90

Ideias em confronto – Embates pelo poder na Independência do Brasil (1808-1825)
Autora: Cecilia Helena de Salles Oliveira 
Editora: Todavia, 2022
Páginas: 272
Preço: R$ 74,90 E-book: R$ 48,90

Brasil uma biografia
Autoras: Lilia M. Schwarcz e Heloísa M. Starling
Editora: Companhia das Letras, 2015
Páginas: 694
Preço: R$ 84,90 E-book: R$ 39,90

Adeus, senhor Portugal – Crise do absolutismo e a Independência do Brasil
Autores: Rafael Cariello e Thales Zamberlan Pereira
Editora: Companhia das Letras, 2022
Páginas: 416
Preço: R$ 99  E-book: R$ 44,90

Racismo brasileiro – Uma história da formação do país
Autora: Ynaê Lopes dos Santos
Editora: Todavia, 2022
Páginas: 336
Preço: R$ 79,90 E-book: R$ 49,90


As guerras da Independência do Brasil – O processo de criação de um Estado nacional nos trópicos
Autor:  Leonencio Nossa
Editora: Topbooks, 2022
Páginas: 445
Preço: R$ 84,90 


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