Jornal Estado de Minas

PENSAR

Em 'Menos ainda', Ana Elisa Ribeiro mostra poesia 'cheia de agudezas'

 Antônio Ursine 
Especial para o EM

 “Menos ainda” é a nona e a mais recente publicação da poeta mineira Ana Elisa Ribeiro (vencedora do Prêmio Jabuti em 2022). O tom espirituoso que marca a sua trajetória de 25 anos de persistência (ou insistência) na poesia é justamente o que nos conduz por meio do principal tema de “Menos ainda”: “a profissão poeta”; ou “o que é ser poeta?”; ou, ainda mais especificamente, “o que é ser uma poeta?”. Isso sem, contudo, deixar totalmente de lado a seriedade – esse predicado tão supervalorizado em matéria de literatura.





Como não poderia deixar de ser, são várias as possibilidades apresentadas pelos versos de diferentes fases da produção poética da autora, que selecionou entre poemas antigos – publicados em revistas e antologias – e poemas novos aqueles que melhor se atrevem a controverter perguntas tão impertinentes. Cabe então à perspicácia do leitor apreender dos escritos de Ana Elisa Ribeiro o maior número de respostas. 

As pistas são dadas a todo o momento, começando pelo título do livro, que, como indicado por Patrícia Lavelle (PUC/RJ) no posfácio, “radicaliza o Poetamenos de Augusto de Campos”. Partindo para a leitura, as referências a Carlos Drummond de Andrade, Torquato Neto, Adélia Prado, Paulo Leminski, editores caretas, mestres de “estimulante estreiteza” e outras personagens, compõem o zodíaco elencado para traçar o mapa-literal da poeta. As referências metalinguísticas dão parte desse tom humorado, que perpassa praticamente toda a obra. 

O lado espirituoso também se faz presente no belíssimo projeto gráfico, elaborado por Elza Silveira e executado pela sempre excelente Impressões de Minas. Pensado para apresentar a obra como uma espécie de “pasta empresarial” para a o exercício da profissão e com elementos paratextuais não convencionais – como a “Ficha do hotel onde se hospeda a poeta” e a sua “Carteira de trabalho” –, o projeto gráfico deixa ainda mais evidente a intenção de “gozar” com o glorioso ofício. 





Afinal, que poeta que se preze nunca se afastou ou foi afastado do ofício por “extremo desânimo” ou por “cancelamento” da classe artística? Assim, “Menos ainda”, com suas doses de ironia e as suas críticas e homenagens ao universo da poesia, é um agradável e bem-humorado passeio pelos caminhos “cheios de agudezas”, como as , da poeta Ana Elisa Ribeiro. 

Ao ler os poemas, confirmamos mais uma vez: as poetas e os poetas podem não estar lá muito bem das pernas (ou da cabeça); mas para a tristeza geral da crítica especializada, independente dela e dos editores, a poesia continua muito viva, talvez justamente por não ter sido decodificada como ofício, e vai bem (poderia ser mais bem remunerada, mas tudo bem), obrigada. 

Por fim, é recomendada uma advertência ao leitor que sentir-se estimulado a embrenhar-se na obra, acreditando que desta mata vasta, sairá brandindo brilhantes respostas. Como a própria autora diz em “Desditos”:

não direi
para que o poema 
não diga
não serei
explícita
a implicitude
não me denuncie
não transbordarei
pela escrita
para que a palavra
não me aponte
como fonte.

*Redator, revisor e diagramador, Antônio Ursine é bacharelando em Letras no CEFET-MG.  
 

“Menos ainda”

  • Ana Elisa Ribeiro
  • Impressões de Minas
  • 80 páginas
  • R$ 55