“Nossa compreensão de como as coisas funcionam no espaço tem dado saltos incríveis, permitindo que a astronomia evolua de uma ciência baseada sobretudo em observações empíricas para uma ciência assentada no conhecimento profundo do comportamento físico de objetos e fenômenos que observamos no céu". Essa é uma das reflexões da astrônoma britânica Jo Dunkley em seu primeiro livro, “Nosso universo: a história do cosmo e seus mistérios”, que foi publicado no Brasil pela Editora Todavia.
Leia Mais
Clube do Livro BH: encontro gratuito celebra 10 anos de amor à leitura Miguilim faz lançamento duplo com Líria Porto e Jorge Fernando dos SantosDublinense prepara dois lançamentos de Rogério PereiraVitor Colares lança livro para ajudar a meninada a perder o medoFelipe Charbel lança 'Saia da frente do meu sol' em BH
Em seu texto, a professora de física e ciências astrofísicas da Universidade Princeton nos conduz em uma viagem pelos séculos de história da astronomia, destacando como era o trabalho ainda amador no surgimento dessa área até as mais recentes descobertas de pesquisadores, com enfoque especial para mulheres como Williamina Fleming, Vera C. Rubin e Jocelyn Bell Burnell.
Leia: Editora Peabiru abre caminhos da literatura latino-americana no Brasil
A autora, que já recebeu prêmios da Royal Astronomical Society, do Institute of Physics e da Royal Society por suas contribuições ao estudo da origem e da evolução do cosmo, detalha as características e curiosidades dos planetas conhecidos e presume que ainda existem muitos outros a serem descobertos. Jo Dunkley sobe uma longa “escada cósmica”, indo de sistemas solares a vizinhanças estelares, galáxias, grupos ou aglomerados de galáxias e por fim os superaglomerados, para mostrar por que o espaço está se expandindo há 14 bilhões de anos.
“As detecções de planetas são abundantes hoje, e a próxima década promete trazer milhares de outras descobertas graças aos novos telescópios espaciais. O campo de planetas extrassolares, ou exoplanetas, é atualmente uma área nova e importante da astronomia, repleta de perguntas fascinantes, como aquela sobre quão única é a Terra e quão singular é a vida nela”, diz a escritora. Não é à toa que a astronomia é uma das ciências mais antigas e está no centro das investigações filosóficas desde a Grécia Antiga, pois estuda o que está para além da atmosfera terrestre e tem o objetivo de entender por que essas coisas são como são.
Leia: Editora Tabla abre janela para literatura árabe e de Índia, China e Irã
A Lua, nossa vizinha mais próxima no espaço, também ganha atenção especial no livro, afinal, sua existência define a vida como a conhecemos. Sem ela, não teríamos marés, os dias seriam mais curtos e as estações do ano ficariam desreguladas. Jo Dunkley imagina que, num futuro distante, quando a Lua estiver muito longe de nós, a Terra provavelmente irá oscilar muito mais, inclinando-se de maneira imprevisível enquanto viaja em torno do Sol.
“Se imaginarmos a Terra reduzida ao tamanho de uma bola de basquete, a Lua seria do tamanho de uma laranja, viajando ao nosso redor numa trajetória mais ou menos circular”. A professora destaca que alguns planetas possuem mais de 60 luas, enquanto outros não têm nenhuma. Saturno, por exemplo, tem uma lua chamada Encélado, que é considerada por cientistas o lugar mais habitável do sistema solar depois da Terra.
Leia: Saraiva: 'Europeus eram rigorosos com a entrada de carne e não com madeira'
Outro ponto interessante é entender sobre a vida do Sol: como nasceu, suas características e como ele será daqui a bilhões de anos. “O Sol crescerá tanto que provavelmente engolirá as órbitas de mercúrio e Vênus, assim como talvez a da Terra”, sentencia a professora, que ainda lança mão de outras hipóteses, como a perigosa aproximação do globo terrestre com o astro-rei, o que mudaria completamente a vida como a conhecemos.
Mas Jo Dunkley não se prende ao cenário apocalíptico e descreve o que é conhecido entre os cientistas como “Zona de Cachinhos Dourados”, ou seja, a área envolta de uma estrela onde os planetas têm chances reais de possuir água em estado líquido na superfície.
“Esta é uma época de ouro para a astronomia, repleta de interesses e de possibilidades. Uma das coisas mais emocionantes é que há, sem sombra de dúvida, novos achados logo ali na esquina. Novos planetas continuarão a ser descobertos em ritmo acelerado, e talvez em breve apareçam sinais de condições que indiquem a possibilidade de existência de vida extraterrestre. Nos próximos anos, vamos detectar muitos outros sinais de ondas gravitacionais vindo de buracos negros e de estrelas de nêutrons em colisão no espaço, o que ampliará nossa visão e nosso conhecimento do universo”.
“Nosso universo: a história do cosmo e seus mistérios”
- Jo Dunkley
- Tradução: Alexandre Bruno Tinelli
- Editora Todavia
- 293 páginas
- R$ 67 (livro) e
- R$ 44,91 (e-book)
TRECHO
“A Galáxia, um enorme disco de estrelas e gás inserido numa auréola muito mais ampla de matéria escura invisível, gira suavemente. Olhamos para nossa galáxia vizinha, a majestosa e espiralada Andrômeda, vindo devagar em nossa direção pelas profundezas do espaço. Em volta de nós, há inúmeras outras galáxias, espalhadas pelo espaço e agrupadas em grupos menores ou em aglomerados maiores. Dentro deles, nascem e morrem estrelas. Mais adiante, encontramos mais galáxias em seus grupos e aglomerados até onde nossa vista alcança. Se olharmos longe o suficiente, veremos esses objetos agrupados em estruturas ainda maiores, os superaglomerados, ao estilo de megalópoles cósmicas. As galáxias e os aglomerados de galáxias são as luzes brilhantes no esqueleto do universo, a rede de matéria escura.”
Entrevista // Jo Dunkley
“É importante investir em ciência”
Quando você decidiu estudar física e ciências astrofísicas e o que a motivou? Por quê?
Eu amava matemática no ensino médio e percebi que poderia usá-la para entender como o mundo ao meu redor funcionava. Foi quando me interessei pela física pela primeira vez. Depois, na universidade no Reino Unido, fiz um curso sobre a relatividade especial e achei fascinante. E, em parte, a inspiração para continuar com a astrofísica surgiu quando eu estava mochilando pela América do Sul após a faculdade e estava lendo um livro sobre teoria das cordas, ao mesmo tempo em que tinha tempo para ver os céus bonitos. Era atraente para mim que a astrofísica combinasse a resolução de problemas matemáticos com a beleza estética do que podemos ver no espaço.
No livro você cita mulheres como Williamina Fleming, Vera C. Rubin e Jocelyn Bell Burnell. Qual a importância dessas cientistas e como elas podem inspirar novas gerações de jovens astrônomas?
Todas elas fizeram descobertas importantes e enfrentaram uma variedade de desafios, e não são tão famosas quanto deveriam ser! Eu acho que é muito importante para as jovens sentirem um senso de pertencimento em uma comunidade, e ajuda poder ver pessoas que elas possam imaginar sendo no futuro. Fleming também é um exemplo da longa história de mulheres que construíram os fundamentos da astronomia moderna.
Este é o seu primeiro livro. Qual foi a sua principal preocupação durante a escrita e o que mais gostou durante esse processo? Pretende escrever outros livros sobre o universo?
A coisa mais difícil foi que eu estava tentando encaixá-lo na minha 'rotina' normal de fazer pesquisa e dar aulas. Então eu tinha que encaixar isso, o que eu fazia escrevendo algumas horas por dia, às vezes à noite em casa, ou eu parava em uma cafeteria a caminho do trabalho e escrevia. Eu amei a criatividade de escrever um livro, porque no meu trabalho habitual escrevemos artigos científicos que são mais técnicos. Eu dependi muito do meu agente de livros fantástico, que se encontrava comigo regularmente para verificar meu progresso. Quanto a escrever outros livros, eu ainda não sei. Espero que sim!
Qual a importância de que países em desenvolvimento, assim como o Brasil, invistam em ciência e tecnologia? Na sua opinião, como o governo do presidente Lula pode contribuir para a produção científica na América Latina e no restante do mundo?
Eu acredito que é muito importante investir em ciência e no treinamento das gerações mais jovens. Além de enriquecer nossas vidas com novos conhecimentos, isso tem aplicações importantes para problemas do mundo real. Se vamos resolver a crise climática, por exemplo, precisamos de cientistas e de novas tecnologias, e precisamos que as pessoas valorizem e confiem nos cientistas.
Se você pudesse escolher, o que preferiria: descobrir um novo planeta habitável ou a existência de vida extraterrestre? Por quê?
Ah, boa pergunta. Acredito que os dois estejam um pouco relacionados, já que podemos encontrar indícios de vida extraterrestre em novos planetas habitáveis. Acho que ficaria mais empolgada em descobrir a existência de vida extraterrestre, pois suspeito que ela exista em algum lugar, mas é claro que gostaria de confirmar. Um planeta habitável seria fascinante, porém estaria orbitando uma estrela distante, então só poderíamos observá-lo com nossos telescópios, ao invés de conseguir visitá-lo.