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Estado de Minas CELEBRAÇÃO COM DIVERSIDADE

Novo selo aposta em histórias de indígenas e africanos

Editora Aletria, comandada por Rosana de Mont'Alverne, comemora 15 anos com o lançamento do selo Alegriô, voltado para povos indígenas e africanos


30/09/2023 11:02 - atualizado 30/09/2023 11:52
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Ilustrações do selo Alegriô
A Alegriô Edições chega com foco específico na publicação de histórias de povos indígenas e africanos (foto: Aletria/Divulgação)
"A literatura é um poderoso instrumento para promover a diversidade e a riqueza das histórias de origem dos povos originários e africanos, bem como as de autores e ilustradores negros e indígenas do Brasil. A leitura nos humaniza e nos ensina a enxergar o outro com mais respeito por suas diferenças". É assim que Rosana de Mont'Alverne Neto, 63 anos, fundadora e editora-chefe da editora Aletria, anuncia o lançamento de um novo selo editorial: a Alegriô Edições, que será lançado hoje no Teatro Santo Agostinho (Rua dos Aimorés, 2679, Lourdes), em um evento que integra a programação das comemorações dos 25 anos do espaço. A entrada é gratuita. 

A novidade chega quase 15 anos após Rosana começar a publicar livros para crianças e jovens. Durante uma reflexão, a editora percebeu a necessidade de ter um foco específico na publicação de histórias que celebrem as literaturas afro-diaspórica, afro-brasileira, africana e indígena.

"Este ano, a Lei 10.639/2003, que estabelece o ensino de história e cultura afro-brasileira, africana e indígena na educação básica, completa 20 anos. Achamos oportuno nos juntar aos esforços decoloniais da literatura brasileira e latino-americana", afirma Rosana. 

As publicações que inauguram o selo são "O rouxinol da mamãe" (Mama's Nightingale), de Edwidge Danticat, com ilustrações de Leslie Staub, e "Um dia feliz", da professora doutora belo-horizontina Patrícia Santana, com ilustrações de Carol Fernandes. 
 
Ilustração do selo Alegriô
(foto: Aletria/Divulgação)
Para celebrar o lançamento, também haverá a estreia do espetáculo literomusical "Mama África: contos afro-brasileiros", com narrativas de livros da Aletria e da Mazza Edições, com quatro histórias de origem africana explorando temas como criação do mundo, ancestralidade, identidade e resistência, a colonização do homem branco em terras africanas, escravização e diáspora, representatividade e esperança.

As contadoras de histórias e escritoras Madu Costa, Sandra Lane, Anna Lirah, além da própria Rosana, apresentam um conto cada uma. Além delas, compõem o espetáculo o percussionista Babu Xavier e o bailarino afro e coreógrafo Evandro Passos.
 

O novo selo coroa os 15 anos da Aletria. O embrião da editora foi em 2005, como uma escola de formação de contadores de histórias. Só em 2009 que Rosana e a filha, Juliana Flores, começaram a publicar livros de literatura infantil e juvenil. 

O primeiro livro foi um sucesso. "Bichos", de Ronaldo Simões Coelho, com  ilustrações e projeto gráfico de  ngela Lago, ganhou vários prêmios como o da Fundação Biblioteca Nacional e da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. A obra também constou no célebre catálogo "White Ravens" da Biblioteca de Munique, e foi divulgado na Feira do Livro Infantil de Bolonha, na Itália. Atualmente, são mais de 120 títulos no catálogo e diversas premiações. 

"Se quisermos atingir um outro degrau civilizatório, temos de investir na leitura, temos de formar leitores de boa literatura. Esse excesso de telas não ajuda a criar adultos pensantes, com apurado senso crítico. Pelo contrário, pode fragilizar as pessoas e afastá-las da vida real. Por isso aprender a ler, a praticar o que chamamos de 'leitura de fundo', é tão importante. A leitura, de fato, abre portas para um novo mundo. Os pais que sonham com um futuro melhor para seus filhos devem incentivar, dar exemplo e investir mais em livros do que em telas. O futuro pertence aos leitores", conclui Rosana.

SERVIÇO

Lançamento do selo Alegriô e espetáculo "Mama África: contos afro-brasileiros"

Dia: Sábado (30/9)

Horário:
14h

Local: Teatro Santo Agostinho (Rua Aimorés, 2679, Lourdes)

Grátis, com retirada de ingressos no Sympla.
 
Outra ilustração do selo Alegriô
(foto: Aletria/Divulgação)
 

ENTREVISTA

Rosana de Mont'Alverne
 
Se pudesse resumir a proposta do selo Alegriô em algumas palavras/frases, quais seriam?

R.: O Brasil é predominantemente preto. Então, que os pretos contem suas próprias histórias. E quem melhor do que os povos originários para contar os mitos de criação da nossa terra? O eurocentrismo, por séculos, desqualificou o pensamento dos sujeitos coloniais. Agora, é tempo de permitir novas formas de contar  e recontar as histórias, agregando valores e conhecimentos dos povos negros e indígenas. Essa é a proposta da Alegriô para promover um diálogo mais plural e diverso com a sociedade e os povos que formam a história do Brasil. 

Quais são os desafios de trabalhar com livros nos dias de hoje?

R.: É como a velha história do vendedor de sapatos que chega num país onde ninguém usa sapatos. Ele liga para o chefe e diz que vai voltar porque ali quem ia querer sapatos? O chefe manda outro vendedor que, ao constatar a situação, liga dizendo: "Chefe, tenho uma ótima notícia! Aqui ninguém usa sapatos! Vamos bater o recorde de vendas!" Trabalhar com livros no Brasil é mais ou menos assim: aqui metade da população nunca abriu um livro sequer. Então, há tudo por fazer, e um público leitor imenso a ser formado. Por isso é tão importante elegermos governos nas três esferas de poder - municipal, estadual e federal - que invistam em políticas públicas para o livro, a leitura, a literatura, as bibliotecas, livrarias, editoras, enfim, que ajudem a fortalecer o mercado editorial, a formar mediadores de leitura e realizar feiras literárias por todo o país. Está mais do que provado que só o livro de papel ajuda a fixar o conhecimento. Um estudo da pesquisadora Naomi S. Baron, professora emérita de Linguística da American University, aponta que quando lemos textos impressos - seja em livros, revistas, jornais etc - nossa mente retém mais informações do que ao ler um texto em dispositivo digital, como um smartphone ou notebook, por exemplo. O secretário de estado da Educação do governo de São Paulo recentemente voltou atrás na decisão de recusar os livros do PNLD e distribuir material digital. Se quisermos atingir um outro degrau civilizatório, temos de investir na leitura, temos de formar leitores de boa literatura. 


O lançamento do novo selo marca os 15 anos da Aletria. Qual a lembrança mais importante que você destaca? 

R.: Esses 15 anos foram intensos e desafiadores. Teve uma época que estávamos no buraco. Não tínhamos um único real para publicar livros e dispensamos os funcionários (ficamos só minha filha e eu numa salinha alugada na Praça Sete). Estávamos à espera de um milagre. Um belo dia entrou na nossa sala uma moça muito elegante, linda, parecia uma miragem. Ela se apresentou e nos falou que  ngela Lago havia dito a ela que se quisesse um livro bonito, que procurasse a Aletria. Nós amamos o texto dela, pedimos uma ilustradora que admiramos para fazer as ilustrações e mandamos imprimir uma "boneca" (expressão que damos a uma réplica do livro antes da impressão final). Saiu o edital do Itaú "Leia para uma Criança" e só tínhamos aquela "boneca" para inscrever. Enviamos sem esperanças, mas inscrevemos o livro. Afinal, grandes editoras de todo o país inscrevem milhares de títulos nesse edital. Algum tempo depois, recebo uma mensagem de WhatsApp. Era minha filha: 

- Mãe!!!
 
- Não vem com mais notícia ruim...
 
- Não, mãe!!! O Itaú, mãe!!!
 
- Que que tem o Itaú? 
 
- Nosso livro foi escolhido!!! 
 
- Não brinca com essas coisas que eu infarto... 
 
- É sério, mãe!!! Escolheram o "Tatu Balão"!!! 
 
- Quantos exemplares? Uns cem mil exemplares? Já dá pra gente começar a acertar umas contas... 
 
- Não, mãe!!! Senta pra não cair...
 
- Fala logo, menina! 
 
- Mãe, nosso livro vai estrelar a campanha do Itaú Leia para uma Criança! Vendemos 2 milhões e 200 mil exemplares, mãe!
E foi assim que o livro "Tatu Balão", texto de Sônia Barros, ilustrações de Simone Matias, chegou às mãos de crianças no Brasil inteiro. Só mesmo um "tatu" pra tirar a Aletria daquele buraco.


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