“Um sinal no espaço”
(...)
Transportado nos flancos da Galáxia, nosso mundo navegava além dos espaços longínquos, e o sinal lá estava onde o havia deixado para assinalar aquele ponto, e ao mesmo tempo assinalava a mim mesmo, trazia-o comigo, habitava-me, possuía-me inteiramente, intrometia-se entre mim e todas as coisas com as quais pudesse tentar relacionar-me.
À espera de voltar a encontrá-lo, podia tentar dele extrair outros sinais ou combinações de sinais, séries de sinais iguais e contraposições de sinais diversos.
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Era preciso tê-lo ali na frente, estudá-lo, consultá-lo, mas em vez disso estava ainda não sabia quão longe, porque o fizera exatamente para saber o tempo que levaria para reencontrá-lo, e enquanto não o tivesse reencontrado não poderia saber.
Um depoimento sobre o livro
Adriana Iozzi Klein
ESPECIAL PARA O PENSAR
“As Cosmicômicas refletem a paixão de Calvino pela imaginação, pela fantasia e pelas formas breves também. Há um enunciado ‘científico’, uma linguagem seca e, logo em seguida, a gente vê esse personagem que não tem uma definição. Ele não é uma pessoa, mas um ser que existe antes mesmo da criação do universo, do Big Bang, com o nome que é um palíndromo impronunciável, mas é uma espécie de olhar também.
E um olhar numa perspectiva antiantropocêntrica que é muito interessante. Uma figura que tem características humanas, do ponto de vista mental, de raciocínio, etc., mas que não se configura como um ser humano. Isso é muito leopardiano. As operetas e os opúsculos morais do Giacomo Leopardi têm uma proposta desse tipo: os personagens que ali aparecem dialogando são, muitas vezes, seres não-humanos.
Mas o que Calvino faz também é uma brincadeira com a ciência, a proposta é de inovação da matéria literária a partir de um experimento. O nome Cosmicômicas também é um neologismo que o Calvino inventa com a junção do cósmico e o cômico, mas existe outra intenção: usar a ideia dos comics, da história em quadrinhos.”
Adriana Iozzi Klein é professora do Departamento de Letras Modernas e do Programa de Pós-graduação em Língua, Literatura e Cultura Italianas da Universidade de São Paulo (USP), e autora do livro “A poética da reescritura em As cidades invisíveis de Italo Calvino” (Nova Alexandria)
Sobre o livro
Trecho de “Um sinal no espaço”, uma das histórias incluídas no volume “Todas as cosmicômicas”, de Italo Calvino, que acaba de ganhar edição no Brasil com ilustrações de Marcelo Cipis.
Reunião de dois livros da década de 1960, “As cosmicômicas” e “T = 0”, contém narrativas que começam com um enunciado científico (ou pretensamente científico) sobre as origens do universo e dos planetas e outros temas do passado cósmico remoto para dar, em seguida, a palavra para as reflexões de um personagem de nome impronunciável: Qfwfq.
“Todas as cosmicômicas”
- De Italo Calvino
- Tradução de Ivo Barroso e Roberta Barni
- Ilustrações de Marcelo Cipis
- 368 páginas
- R$ 129,90