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Parlamentares defensores da proposta de legalização dos jogos dizem que o projeto pretende proibir em definitivo os bingos e liberar a organização de cassinos em regiões específicas voltadas para atração de turismo de brasileiros e estrangeiros. A avaliação na Câmara é que o governo está mais sensível ao tema graças ao argumento de geração de emprego e arrecadação tributária em tempos de crise econômica internacional. Múcio já disse ser “pessoalmente” favorável, mas enfatiza não haver posição do governo sobre o tema. Segundo a Associação Brasileira dos Bingos (Abrabin), o setor tem potencial de gerar 300 mil empregos e arrecadar entre R$ 3 bilhões e R$ 10 bilhões por ano.
O líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO), é um entusiasta da ideia. Com uma argumentação cheia de números, ele cita exemplos bem-sucedidos de controle legal dos bingos em países como Itália, Argentina, Uruguai e a experiência do Canadá, que reverte parte do dinheiro arrecadado para o meio ambiente. “O jogo legalizado gera imposto, emprego. O momento de discutir já passou de hora, já tinha de ser colocado o projeto em votação. O entendimento de vários líderes é que está na hora de discutir”, disse o deputado goiano. Uma das ideias dos deputados, inclusive, é utilizar um percentual da arrecadação dos bingos para investimentos em saúde.
Anacrônico
O tema é tão pertinente no Congresso que os deputados demonstram estar afinados. Os argumentos favoráveis ao jogo são repetidos pelos mais diversos políticos e sintetizados pelo presidente da Abrabin, Olavo Sales da Silveira. “O Brasil tem uma posição anacrônica. Todos os 20 países mais desenvolvidos do mundo têm uma indústria do jogo”, disse Sales. Ele só critica a discussão de se proibir os bingos e legalizar os cassinos. “O bingo é uma atividade amena e urbana, cassino é mais agressivo, de apoio ao esforço turístico brasileiro. Não tem sentido legalizar uma coisa e proibir a outra”, acrescentou o dirigente.
Parlamentares e o representante do setor criticam o que chamam de hipocrisia da legislação brasileira. Em sites de internet localizados no exterior é possível fazer jogos, apostar em cavalo, em jogos de futebol internacional ou até mesmo no Campeonato Brasileiro. O ex-árbitro de futebol Edilson Pereira de Carvalho foi preso por participar do esquema da máfia do apito. Ele se aliou a investidores para garantir resultados e ganhar apostas virtuais. “O Brasil só tem ônus e não tem receita. Os navios nas costas brasileiras disponibilizam cassinos, há o jogo do bicho, há cassinos fronteiriços. Uma vez percebido isso, a medida é legalizar”, disse o presidente da Abrabin. Recentemente, a Polícia Civil de Brasília fechou um cassino ilegal que funcionava no Lago Sul, na Península dos Ministros. Até o castelo levantado pelo deputado Edmar Moreira no interior de Minas Gerais no valor de R$ 25 milhões tinha como objetivo ser um hotel-cassino.
Corrupção
O líder do PT, Cândido Vaccarezza (SP), repete o argumento favorável ao debate sobre os jogos e a necessidade de liberação. Eu acho que a legalização dos cassinos pode servir para atrair investimentos em áreas localizadas, arrecadar impostos, desenvolver o turismo e coibir atividades ilegais conexas, como o jogo clandestino, a corrupção de policiais. Ele acredita, no entanto, que o assunto ainda não é a prioridade no Congresso. “Quando o tema vier àtona, quero levar a discussão para a bancada do PT, que ainda não fez o debate. Mas as nossas prioridades são o tratamento da crise, as reformas tributária e política, a PEC do trabalho escravo e a redução da jornada de trabalho”, afirmou o líder petista.
Um dos argumentos dos entusiastas é também preparar um bom entretenimento e uma rede de turismo equipada para receber torcedores estrangeiros durante a Copa do Mundo de 2014. O líder do PR na Câmara, Sandro Mabel (GO), favorável à legalização do jogo, repudia esse argumento. “Melhor do que fazer as coisas ilegais, é fazer dentro da legalidade num projeto que torne o jogo organizado. Mas abrir (uma casa de jogo) em qualquer lugar , eu sou contra, assim como usar esse argumento da copa”, afirmou Mabel. A Abrabin já apresentou uma proposta sobre controle e fiscalização, levantando experiências de jogo de azar nos diversos países do mundo, ao Ministério da Fazenda.
Memória - Escândalos e liminares
A legalização das casas de jogos ronda o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde 2003. Havia um estudo para a regulamentação que foi arquivado quando surgiram denúncias de irregularidades cometidas pelo ex-assessor da Casa Civil Waldomiro Diniz. Ele foi flagrado cobrando propina do empresário do jogo Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
O fato acabou sendo alvo de uma CPI no Senado, instalada por determinação do Supremo Tribunal Federal, em 2005. Entre as diversas e amplas linhas de investigação da comissão, uma que se destacou foi a suspeita de a campanha de Lula, em 2002, ter sido financiada em parte com dinheiro de bingos. Waldomiro teria arrecadado R$ 1 milhão com casas de jogo em São Paulo e Rio de Janeiro. Empresários angolanos, Arthur José Valente de Oliveira e José Paulo Teixeira Cruz também teriam aplicado US$ 1 milhão na campanha do petista. Nenhuma denúncia foi comprovada.
Na época, a CPI também se debruçou sobre um suposto esquema de corrupção na renovação do contrato de R$ 650 milhões firmado entre a Caixa Econômica Federal e a Gtech, em abril de 2003, para administração de loterias. Segundo investigações da Comissão, o advogado Rogério Tadeu Buratti, ex-assessor do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, supostamente extorquiu a multinacional em R$ 5 milhões. Teria agido em conluio com Waldomiro.
O presidente Lula já reclamou publicamente do setor e chegou a defender que o Congresso discuta um projeto para proibir de vez ou autorizar a atividade dos jogos. Ele estava insatisfeito com o que chamou de “indústria de liminares” judiciais que permitia, em caráter temporário, a abertura de bingos.