Duas semanas após a divulgação do vídeo em que Jaqueline Roriz (PMN) é flagrada recebendo dinheiro de Durval Barbosa, os ânimos na Câmara dos Deputados se inverteram. A temperatura que começou branda no caso agora virou brasa quente, que em pouco tempo pode queimar a carreira política da deputada federal de primeiro mandato. Quando as imagens vieram a público, os deputados não demonstravam interesse em transformar o flagrante da parlamentar do DF em um caso de repercussão no Congresso. Escoravam-se no fato de o malfeito ter ocorrido no passado, quando ela ainda não havia sido eleita. Pressionado com as fortes declarações do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que considerou as cenas “fortíssimas”, e pela própria opinião
pública, o Conselho de Ética da Casa se viu forçado a dar uma resposta. E rápida. As circunstâncias atuais apontam para uma possível cassação.Os deputados sabem que investigar as denúncias contra Jaqueline é abrir um perigoso precedente com potencial para expor mais parlamentares. O caso dela é parecido com o de políticos envolvidos no esquema do mensalão do PT, poupados em 2007 por uma interpretação jurídica feita sob medida para a crise na época: a de que o Congresso não tem legitimidade para apurar atos cometidos por parlamentares antes do mandato em curso. As cenas de Jaqueline ao lado do marido, Manoel Neto, pegando dinheiro das mãos do delator da Caixa de Pandora enfraqueceram os argumentos criados para dar sobrevida aos mensaleiros. Os deputados mudaram o discurso. Admitem não só investigar Jaqueline — o processo começou a tramitar na quarta-feira no Conselho de Ética —, como já incorporam discurso bem mais duro. “O sentimento da Casa é o de dar uma resposta à sociedade, mas respeitando o direito de defesa da deputada”, disse o corregedor da Câmara, Eduardo da Fonte (PP-PE).
A confissão de Jaqueline de que o dinheiro do vídeo é caixa dois de campanha serviu como combustível para o episódio. Era uma estratégia dos advogados para aliviar as complicações jurídicas que a deputada enfrentará. O problema é que a tática produziu o efeito colateral de aumentar o desgaste político para ela. Os colegas de Câmara se apegam a dois pontos para justificar a mudança de postura. Um deles, a própria declaração de culpa da deputada. O outro, que a situação de Jaqueline seria diferente da dos mensaleiros de 2007.
Indulto
Um dos argumentos usados pelo ex-deputado José Eduardo Cardozo, atual ministro da Justiça, quando indicou falta de competência da Câmara para processar deputados acusados de malfeitorias antes da legislatura em curso, é o de que os fatos eram de notório conhecimento público. Se os políticos, mesmo sob suspeição foram reconduzidos para a Câmara, significa que tinham sido absolvidos pelo próprio eleitor, ganhando uma espécie de indulto. No caso de Jaqueline, essa justificativa não se sustenta. O vídeo dela é de 2006, mas só agora veio a público. “Essa denúncia ficou debaixo do tapete. Se essa história tivesse vindo à tona antes da eleição, qual seria o comportamento dos eleitores?”, questiona o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PDT-BA).
Para Ricardo Izar (PV-SP), também integrante do Conselho, as provas da videoteca de Durval são graves. “Sinto que a vontade dos conselheiros é a de fazer a apuração correta, em cima dos fatos. Não acredito em pena alternativa. Ela será liberada pela brecha de o fato ter ocorrido antes do mandato ou será punida com a cassação.” Outro conselheiro, que prefere preservar a identidade para não indicar pré-julgamento, diz que o caso de Jaqueline será um marco da atual legislatura. “As cenas são determinantes, o tempo não apaga nenhuma imagem. O caso dela é típico de cassação.” Integrante do Conselho de Ética por indicação do PSC, Sérgio Brito acha que “apesar de haver jurisprudência contrária dentro da própria Câmara, os deputados devem levar o caso da deputada adiante”.