O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, escondeu um encontro secreto que teve com o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda. A reunião sigilosa entre investigador e investigado, que durou pelo menos uma hora, ocorreu fora da sede da Procuradoria-Geral da República (PGR) e sem a presença dos advogados de Arruda. O teor da conversa foi o esquema de corrupção no Distrito Federal, mas Gurgel não o relatou nos autos do inquérito conduzido pela subprocuradora Raquel Dodge no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ela, aliás, foi excluída do encontro.
A reunião, inusitada dentro de uma investigação deste porte, ocorreu no dia 2 de setembro de 2010, às 8 horas, no gabinete do procurador Alexandre Camanho, no 11.º andar da Procuradoria Regional, um prédio que fica a cinco quilômetros da sede da PGR, em Brasília, onde trabalham Gurgel e a própria Raquel Dodge. O procurador Alexandre Camanho não tem qualquer ligação com a investigação. Por ser procurador regional, não tem atribuição de cuidar do assunto. Mesmo assim, participou do encontro como intermediário.
Arruda ainda não prestou nenhum depoimento oficial no inquérito que tramita no STJ e investiga o chamado “mensalão do DEM” no Distrito Federal. Quando foi ouvido na prisão, em março de 2010, o ex-governador permaneceu em silêncio. No encontro em setembro, Gurgel teria pedido uma ajuda informal ao ex-governador, mas nenhum dos presentes diz o que Arruda ganharia em troca.
Explicações
A reportagem procurou Gurgel, Camanho e Arruda, os únicos que participaram da reunião. Na versão apresentada pelo procurador Alexandre Camanho, Arruda o procurou para intermediar uma conversa com o procurador-geral da República. “O governador manifestou interesse em colaborar com as investigações e pediu para encontrar o procurador Roberto Gurgel. O procurador-geral perguntou onde estariam as provas e os documentos dessa colaboração e agradeceu. Nada além disso”, disse.
Camanho, que confirmou à reportagem a data do encontro em 2 de setembro, afirmou que em nenhum momento se discutiu um acordo de delação premiada, benefício que dá ao investigado o direito de colaborar com as investigações em troca de diminuição de uma eventual pena. Segundo ele, foi Arruda quem pediu para não levar os advogados. Dentro do Ministério Público, sabe-se que Camanho já havia procurado Arruda em julho, a pedido de Gurgel, para discutir uma ajuda às investigações.
A reportagem tentou falar pessoalmente com Gurgel para saber o teor da conversa com o ex-governador do DF, mas ele se negou a responder. Por intermédio da assessoria de imprensa, o procurador-geral da República disse que a versão dele é a mesma de Alexandre Camanho.
A reportagem indagou Gurgel por que aceitou conversar informalmente com Arruda, já que, segundo o próprio Camanho, não se discutiu a concessão da delação premiada. Gurgel disse, por meio da assessoria, que teve uma conversa “preliminar” com o ex-governador e que entendeu que não era “útil” transformá-la em depoimento. Por isso, afirmou Gurgel, o encontro não está nos autos do inquérito no STJ. Questionado se a procuradora Raquel Dodge foi informada sobre o encontro secreto, Gurgel não respondeu. Disse só que trabalha “em conjunto” com ela.
Já Arruda não quis falar sobre o assunto. Seus advogados, que ficaram de fora da reunião, dizem que “desconhecem” o encontro. Até hoje aguarda-se a denúncia à Justiça contra os envolvidos no escândalo, que estourou em 2009 na “Operação Caixa de Pandora” com base em depoimentos de Durval Barbosa, delator do esquema. Obrigado a deixar o DEM, Arruda foi cassado e passou dois meses preso.