Fazer hora extra sem muito esforço e aumentar o próprio salário em até 40% por mês é de encher os olhos de qualquer trabalhador brasileiro, mas está ao alcance de poucos, especificamente os 77 deputados estaduais mineiros. Mesmo recebendo R$ 1.002,12 por participação em reunião extraordinária, marcada pela manhã ou à noite, os parlamentares não têm esperado o fim dos trabalhos para deixar o plenário. Das nove reuniões já realizadas este ano, oito tiveram de ser encerradas porque não havia no local o número mínimo de deputados necessário para continuar a sessão.
Ao custo de R$ 604.278,36, os deputados votaram apenas dois requerimentos e cinco vetos do Executivo a leis aprovadas no Legislativo ano passado. Em uma delas, realizada no dia 5 deste mês, mesmo com a marcação de presença de 69 parlamentares, nada foi votado por falta de quórum. Na pauta estavam três requerimentos, oito indicações do governador Antonio Augusto Anastasia (PSDB) para cargos em órgãos públicos, um veto e dois projetos de lei. Em 15 de março, 67 presenças foram registradas, mas, durante a discussão de um veto, restavam menos que os 39 parlamentares necessários para votá-lo.
Se o trabalho foi pouco, a presença foi muita. Ao todo, nas nove reuniões extras, 603 registros. Em duas delas, ocorridas em março, apenas cinco dos 77 não compareceram. Em cada uma foi votado um veto e em seguida os trabalhos terminaram por falta de quorum. Pelas regras do Legislativo, basta bater o ponto eletrônico para ter direito à verba. Não há limite para a realização das sessões extraordinárias mas somente oito por mês podem ser remuneradas, número que nos últimos anos os parlamentares vêm seguindo à risca. A média de encontros realizados fora do horário tem sido historicamente de sete ou oito.
Nesta legislatura, eles têm um motivo a mais para manter a “assiduidade”. Com o reajuste de 61,8% que passou seus salários de R$ 12.384,07 para R$ 20.042,35, também a hora extra passou a render mais no bolso dos parlamentares – de R$ 619,20 passou a valer R$ 1.002,12. Com isso, cada deputado estadual pode engordar o próprio contracheque em até R$ 8.016,96 mensais. Em quatro anos de mandato, podem somar R$ 352.746,24 só de “hora extra”.
Privilégio particular
Alguns deputados já estão na lista dos que, nos primeiros meses, vão receber integralmente o benefício. Vinte e oito deles participaram de todas as nove extraordinárias realizadas em março e este mês. Outros 16 estiveram presentes em oito e 21 de sete. A Assembleia de Minas Gerais é uma das poucas do Brasil a pagar jeton pelas reuniões fora do horário. Dos estados do Sudeste, é a única. Na Câmara dos Deputados, o pagamento de hora extra foi extinto em 1988.
O secretário-geral da Mesa, José Geraldo de Oliveira Prado, argumentou que é comum e legítimo o encerramento de reuniões plenárias por causa da falta de consenso entre os deputados em torno de um projeto. “O que acontece é um consenso entre os deputados para abandonar o plenário e, formalmente, aparece como falta de quórum. Tão legítimo e importante quanto votar é não votar, no caso de um projeto que precisa ser melhorado ou sobre o qual não haja consenso. O Legislativo não é uma máquina de fazer lei”, disse.
Conforme o secretário, mesmo sem projetos de lei prontos para votação, a convocação de extraordinárias é uma estratégia para acelerar as discussões comuns entre os parlamentares da situação e oposição em plenário. Ele lembrou que essa legislatura começou com cinco vetos e 18 indicações de nomes para órgãos da administração pública, designados de maneira interina até obterem o aval dos deputados.
“Como as reuniões têm sido muito acaloradas entre situação e oposição, a maneira que encontramos para dar desdobramento às ações é fazer mais reuniões”, explica Prado. Na semana passada, foi votado o último veto que trancava a pauta. Com a liberação, estão prontos para votação cinco projetos de lei, nove projetos de resolução e 10 indicações para cargos na administração pública estadual.