A alteração do Código Florestal e a perspectiva de anistia a desmatadores são fatores que causam tensão e, por esse motivo, podem ser considerados ''pano de fundo'' do assassinato do casal de extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, mortos na semana passada no assentamento agroextrativista Praialta-Piranheira, em Nova Ipixuna, no interior do Pará. Dois dias depois, o agricultor Eremilton Pereira dos Santos foi encontrado morto no mesmo local. A opinião é do advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT), José Batista Gonçalves Afonso, que está na região para acompanhar as investigações. ''Não é a causa principal, [mas] esse momento de indefinição sobre a legislação e de pressão do setor ruralista, cria tensão e gera insegurança'', avalia Afonso, que acrescenta que as alterações propostas no Código Floresta são propícias ''para disseminar clima de violência''.
''Nesse contexto de alteração do Código Florestal, onde o setor [ruralista] procura mais espaço e mais liberdade para expandir os seus empreendimentos em direção à Amazônia, a situação torna-se mais tensa'', acrescenta o advogado. O engenheiro florestal Paulo Barreto, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), não faz relação direta entre a votação do novo Código Florestal e as mortes do casal de ambientalistas e do trabalhador rural, mas salienta que a anistia proposta a quem desmatou até 22 de julho de 2008, contida no relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB %u2013 SP) aprovado na Câmara dos Deputados, ''reforça o sentimento de impunidade generalizada''. De acordo com o texto de Rebelo, ''o proprietário ou possuidor não poderá ser autuado e serão suspensas as sanções decorrentes de infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008, relativas à supressão irregular de vegetação em áreas de reserva legal, áreas de preservação permanente e áreas de uso restrito''. Barreto crê que o perdão aos desmatadores alimenta a ideia de que o desmatamento poderá continuar ocorrendo porque no futuro ''virá um novo pacote''. O pesquisador lembra que com o esgotamento das áreas onde era possível retirar madeira e desmatar para fazer ocupações, as reservas, terras indígenas e assentamentos agroflorestais, como o de Praialta-Piranheira, transformam-se em alvos próximos para novos desmatamentos, que começa com a extração seletiva de árvores nas bordas das áreas protegidas pela lei. O advogado da CPT ainda chama a atenção para a vulnerabilidade dos assentamentos e para a ausência de policiamento, até mesmo dois dias depois das primeiras mortes ocorridas em Nova Ipixuna. ''As pessoas ligadas aos crimes poderiam estar intimidadas com a presença forte da Polícia Federal e da Polícia Civil, conforme anunciaram. Mas a realidade apareceu diferente, ocorreu um homicídio logo depois com características de pistolagem. Significa que quem vive dessa prática não se intimidou'', disse ao comentar que as polícias não percorrem todo o assentamento. As três mortes ocorridas no Pará e o assassinato em Rondônia, também na semana passada, fizeram com que o vice-presidente Michel Temer convocasse uma reunião hoje (30) pela manhã com representantes dos ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário para debater possíveis medidas.