Brasília – O Congresso mal voltou do recesso e já impõe dificuldades para o Palácio do Planalto. Embalada pelo discurso contundente e magoado do ex-ministro dos Transportes e atual senador Alfredo Nascimento (PR-AM), em que afirmou que seu partido não é lixo, a oposição chegou a obter nessa terça-feira as 27 assinaturas necessárias para instalar a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Transportes no Senado. Pesou também a insatisfação de parte da base com o governo federal: quatro dissidentes do PMDB, além de três senadores do PDT e dois do PP, apoiaram o requerimento. O senador Alvaro Dias (PSDB-PR) anunciou a obtenção das assinaturas no plenário à tarde, provocando a imediata mobilização do governo. À noite, o senador João Durval (PDT-BA), que integra a base governista, retirou a adesão ao requerimento. O fantasma da CPI, entretanto, continuava a rondar o Planalto, com a oposição em busca de uma nova assinatura, e o governo, na defesa, tentando convencer mais parlamentares a retirarem suas assinaturas do documento. Para criar uma CPI é necessário o apoio de um terço dos senadores, que são 81 no total.
Tão logo Alvaro Dias começou a anunciar a obtenção das assinaturas à tarde, uma reunião informal foi realizada no cafezinho do Senado. Preocupados, os líderes do PMDB, Renan Calheiros (AL); do PT, Humberto Costa (PE); do governo, Romero Jucá (PMDB-RR); e o senador Benedito de Lira (PP-AL) tentavam traçar estratégias para anular a derrota do Planalto. "Uma CPI nunca é boa para o governo", admitiu Jucá. Renan disse que era preciso ver quantas assinaturas existiam, se a CPI tinha fato determinado e como estava o requerimento. "Já tivemos muitas CPIs aqui no Congresso que não chegaram a lugar nenhum. Esse instrumento foi completamente banalizado nos últimos anos", ressaltou o peemedebista.
Mas as críticas ao passado não ajudaram a situação presente. No PMDB, os quatro dissidentes – Roberto Requião (PR), Pedro Simon (RS), Ricardo Ferraço (ES) e Jarbas Vasconcelos (PE) – apoiaram a criação da comissão. "Houve uma orientação clara à bancada para que não assinasse a CPI. Eu conversei hoje, pessoalmente, com o Ferraço", completou Renan. Ele saiu com essa missão após um almoço da cúpula do partido com o vice-presidente da República, Michel Temer. "São os mesmos quatro que assinaram a CPI do caso Palocci", acrescentou Renan.
O senador Benedito de Lira espera que o retorno nesta quarta-feira do líder do partido na Casa e presidente da legenda, Francisco Dornelles (RJ), consiga mudar o voto dos pepistas. Sobre os dissidentes, Lira admite que a senadora Ana Amélia (RS) sempre teve uma postura independente em relação à sigla e pouco falou de Reditário Cassol (RO), pai do senador licenciado Ivo Cassol: "Eu o conheço pouco".
Aposta na reação negativa de aliados
Com a coleta das assinaturas, Alvaro Dias estava exultante. O movimento do PSDB e do DEM no plenário durante o discurso de Alfredo Nascimento – além dos senadores, havia a presença de deputados de ambos os partidos – indicava que a oposição apostava suas fichas no estrago que o pronunciamento do ex-ministro dos Transportes poderia fazer. "Conseguimos as assinaturas porque há um espaço de insatisfação dentro da base aliada. Existe um modelo de corrupção no governo e essa CPI será importante para desmontar essa estrutura", declarou Alvaro.
O tucano tentou, mas não conseguiu, que o próprio Nascimento assinasse a CPI. "É a sua chance, senador Alfredo. O senhor concordou em ser investigado pela Procuradoria-Geral da República, apoie a CPI aqui no Senado!" Alfredo não se comoveu com a abordagem do colega. "Eu dei a autorização para me investigar. Por acaso a sua investigação é melhor do que a da PGR?", rebateu Nascimento.