Brasília – O governo conseguiu acordo para votar o projeto de lei que cria a Comissão da Verdade em uma semana. A ordem passada aos líderes governistas é não fazer alterações no texto original e rejeitar qualquer emenda. A data escolhida leva em consideração a pauta da Câmara, mas principalmente a agenda da presidente Dilma Rousseff. A expectativa do governo é de que as negociações permitam que a presidente abra a reunião da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), na quarta-feira, com um discurso em prol da transparência e dos direitos humanos.
O projeto de lei em tramitação na Câmara, apesar do apoio declarado de todos os partidos, está longe do consenso. Procuradores da República defendem alterações, sob risco de a Comissão da Verdade ficar só no papel. Em nota técnica, o Ministério Público Federal cobra a definição dos poderes de instrução e a autonomia financeira e orçamentária do grupo. Familiares e vítimas querem a abertura do debate e não a aprovação da matéria em regime de urgência. Já a oposição – que sinalizou ser favorável à proposta – quer discutir o “perfil” dos integrantes indicados para compor a Comissão da Verdade. Uma das exigências do DEM, que se reúne hoje com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para mais uma rodada de negociações, é a indicação de representantes do Congresso na Comissão.
“O DEM quer uma definição mais clara dos critérios para indicação dos integrantes. Não queremos que a comissão seja politizada e que sirva de palanque para radicalizações”, disse o deputado ACM Neto (DEM-BA). O deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), capitão do Exército Brasileiro, também cobrou mudanças no texto. Segundo ele, a presidente Dilma não tem isenção para nomear todos os integrantes. O parlamentar quer ainda segurança de que não haverá punição para os militares.
O Palácio do Planalto, no entanto, está decidido a não ceder à pressão e rejeitar todas as emendas. Teme que o debate volte ao ponto inicial e se arraste para 2012. “É positivo que uma matéria como essa não esteja na pauta em ano eleitoral. A palavra está com o Congresso”, afirmou a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário.
O líder do governo na Câmara, Cândido Vacarezza (PT-SP), afirmou que o pedido do DEM não é viável. “O DEM quer que dois dos integrantes sejam indicados pelo Congresso. O Parlamento representa a sociedade, o que abriria para o debate político e esse não é o objetivo.”
Indicados
Mesmo sem a aprovação do texto, o governo já começou a discutir o perfil da comissão. A proposta estabelece a nomeação pela Presidência da República de sete integrantes com “idoneidade, conduta ética e identificados com a defesa da democracia e dos direitos humanos”.
A presidente está decidida a não nomear representantes das partes – sejam eles militares ou militantes dos direitos humanos ligados às famílias. Entre os nomes que começam a surgir estão o do ex-vice-presidente da República Marco Maciel e do ex-governador de São Paulo Cláudio Lembo. O Ministério Público Federal e familiares criticam brechas para a escolha de militares no grupo. Integrantes do governo sustentam que a possibilidade é apenas para o quadro administrativo.
Uma tropa de choque formada pela ministra Maria do Rosário e por ex-ministros da Secretaria de Direitos Humanos desembarcou nessa terça-feira no Congresso. Em reunião com o presidente da Câmara, Marco Maia (PMDB-RS), eles cobraram apoio do Legislativo na aprovação da matéria e assinaram uma carta aberta de apoio à proposta do governo. Estavam presentes José Gregori, Gilberto Saboia, Paulo Sérgio Pinheiro, Nilmário Miranda, Mário Mamede e Paulo Vannucchi . “Nem todos os ex-ministros são do mesmo partido ou têm a mesma visão ideológica”, lembrou José Gregori, que ocupou a Secretaria de Direitos Humanos no governo Fernando Henrique Cardoso. “Este projeto encontrou um equilíbrio quase perfeito, é uma ourivesaria parlamentar”, disse.
Prioridade para a presidente Dilma, o projeto da Comissão da Verdade está sendo negociado desde o início do ano. Porém, o governo teve que arrastar a votação para o segundo semestre. A orientação é só colocar na pauta do plenário – em regime de urgência – quando houver garantia da aprovação. (Colaborou Denise Rothenburg)
Código Florestal incendeia Senado
Vários juristas apontaram nessa terça-feira inconstitucionalidades no Código Florestal aprovado na Câmara. Sem acordo, o relatório do senador Luiz Henrique (PMDB-SC) dificilmente será votado hoje, como previsto, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Audiência pública na Casa terminou nessa terça-feira em bate-boca. Defendendo o ponto de vista da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), que preside, a senadora Kátia Abreu (sem partido/TO) rebateu críticas ao modelo agrícola feitas pelo procurador da República Mário José Gisi. “Não vivemos numa ilha de preservação. Temos que produzir riquezas”, afirmou ela. “Esse modelo de produção é o da terra arrasada e do agrotóxico", rebateu Gisi. O senador Pedro Taques (PDT-MT) saiu em defesa de Gisi e a confusão começou, com troca de agressões verbais.