O alerta veio em março deste ano e partiu do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ricardo Lewandowski: “Temo que a Lei Ficha Limpa possa ser questionada alínea por alínea por candidatos que venham a ser barrados nas eleições de 2012. É preciso que a Corte Suprema analise a lei como um todo e possa expungir uma eventual inconstitucionalidade que possa existir num ou noutro ponto da lei”. Sete meses depois, poderá ser posto o ponto final nas discussões sobre a lei de iniciativa popular que impede que políticos com condenação sejam candidatos em eleições. Os ministros devem voltar a discutir o tema no próximo mês, tratando agora da possibilidade de retroatividade da lei para abranger fatos da vida pregressa dos políticos e a possibilidade de um candidato ter o registro indeferido devido a condenação por um colegiado de juízes antes de esgotados todos os recursos.
Para Lewandowski, que também é ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), é preciso um posicionamento rápido do Judiciário para evitar que novas polêmicas apareçam durante o ano eleitoral. “Se o Supremo não decidir sobre a validade da lei, haverá uma verdadeira judicialização das próximas eleições municipais, pois para a Justiça eleitoral brasileira a Ficha Limpa é constitucional, e vários candidatos poderão ser barrados em função de sua aplicação”, afirmou. O ministro lembra também que diante da indefinição em torno da constitucionalidade da referida lei, muitos candidatos barrados poderão ingressar com recursos para rever decisões que lhes forem desfavoráveis.
Duas ações declaratórias de constitucionalidade (ADC) tramitam no STF pedindo a confirmação da validade da lei: uma encaminhada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a outra pelo Partido Popular Socialista (PPS). O presidente da OAB, Ophir Cavalcanti, espera que já nas próximas semanas os pedidos que abordam o tema sejam analisado, mas ressalta que para que a lei de iniciativa popular funcione de fato será preciso que o Judiciário seja mais eficaz. “Tivemos o compromisso do ministro Luis Fux, relator das ações, de que essa lei entrará na pauta de julgamentos de outubro. Então, a não ser que haja um pedido de vista, o que acho difícil, pois os detalhes já foram muito debatidos, creio que eles terão a sensibilidade para analisar essa questão de uma vez por todas. No entanto, não basta somente julgar a Ficha Limpa. Os processos que dizem respeito às elegibilidades de candidatos precisam de posições finais”, explica Ophir.
A definição é aguardada também nas esferas locais da Justiça Eleitoral. No mês passado, o apelo pelo julgamento da lei chegou a ser oficializado em um documento elaborado no fim do encontro dos presidentes dos tribunais regionais eleitorais (TRE), onde foi apresentada a preocupação com a indecisão sobre a questão. “Quando os juizes eleitorais de primeira instância e os tribunais forem analisar os pedidos de candidatura das eleições municipais de 2012, precisarão ter claro quais normas poderão ser aplicadas para definir se o postulante pode ou não ter sua candidatura registrada”, afirmou o presidente do TRE-MG, Kildare Carvalho.
O desembargador ressalta que, apesar de o prazo para a filiação partidária terminar em 7 de outubro para os candidatos que vão disputar o pleito de 2012, eles terão a confirmação da candidatura em junho de 2012 e somente nos meses seguintes os registros serão analisados pela Justiça Eleitoral. “O quanto antes for definida essa questão melhor para a Justiça e para os próprios agentes políticos, pois o quadro de instabilidade jurídica deve ser evitado ao máximo. O STF deve se manifestar acerca das novas situações previstas nessa lei”, diz.
Saiba mais - O mérito
O mérito da Lei Ficha Limpa ainda não foi julgado. O que o STF terá de decidir, ao analisar a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 29 e a ADC 30, é se a sua aplicação valerá para fatos ocorridos antes da vigência da norma. Há quem tome emprestado o princípio penal de que a lei não pode retroagir para prejudicar o réu. O argumento, entretanto, não é aceito por vários juristas: o princípio vale para a matéria penal, não para a matéria eleitoral, já que a elegibilidade é uma condição, não uma sanção. Dessa forma, a lei eleitoral estabelece as condições de elegibilidade que podem ser ampliadas de um pleito para outro.