No Senado, a relatoria da Comissão da Verdade deve ficar com Aloysio Nunes (PSDB-SP), considerado um tucano da ala mais progressista por setores de esquerda. “O texto não deve sofrer alterações e caberá a nós acompanhar a prática efetiva da Comissão, para que mostre sua eficácia. Não há como ter imparcialidade frente à prisão ilegal, tortura, morte, desaparecimento de corpos, censura, covardia da repressão do Estado contra a cidadania”, argumenta o líder do PSOL, Chico Alencar (RJ). “Não há muita dificuldade, tivemos reuniões preliminares com os ministros e temos uma posição tranquila. É preciso agora acompanhar e denunciar se ela se transformar na comissão da mentira”, disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).
A Comissão da Verdade será formada por sete pessoas, nomeadas pela presidente Dilma Rousseff, e por outros 14 servidores para a estrutura administrativa. Oposição e familiares das vítimas cobram imparcialidade e criticam a concentração de poderes nas mãos da presidente. Entre os nomes cogitados para o grupo estão os do ex-vice-presidente da República Marco Maciel e do ex-governador de São Paulo Cláudio Lembo.
A comissão, definida por integrantes do governo como “não jurisdicional e não persecutória”, daria mais segurança aos militares para repassarem informações. O objetivo é o “resgate da memória histórica”. O grupo deve se debruçar sobre assuntos ainda pouco explorados, como o financiamento dos governos militares, o número de torturados no país e a Operação Condor. A localização dos restos mortais das vítimas do regime está entre as atribuições, mas o governo já intensificou as buscas para atendera a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O Grupo de Trabalho Araguaia começou nessa quinta-feira a terceira expedição em Xambioá, no Tocantins. Uma ossada já foi recolhida pelo grupo em um cemitério e está sendo analisada por peritos.
Alívio
No dia seguinte à aprovação do projeto que cria a Comissão da Verdade, a sensação de alívio do governo e a demonstração de força da oposição ficaram latentes. As negociações para que o texto passasse pelo crivo da Câmara se prolongaram durante horas, inclusive depois do início da apreciação do projeto. Enquanto diversas reuniões ocorriam simultaneamente nos corredores e gabinetes do Congresso, os protagonistas da noite de quarta-feira tiveram que se apertar dentro do banheiro da liderança do DEM para conseguir privacidade. Os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, fecharam o texto da emenda apresentada pelo PSDB com o líder do partido, Duarte Nogueira (SP), e o líder da minoria, Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), além do presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), no espaço de 1,5m por 2,6m.
Com o texto finalizado, os dois ministros correram para o banheiro da Presidência da Câmara e telefonaram à presidente Dilma Rousseff, em Nova York, para relatar o acordo. Com o aval de Dilma, correram de volta ao Plenário e conseguiram finalizar a votação.
O termo “imparcialidade”, considerado subjetivo pelo governo e pelos familiares de vítimas da repressão, foi inserido pelo DEM como emenda no início da noite. O acordo inicial previa uma outra redação textual, que teria desagradado à presidente Dilma.