A distribuição de títulos de utilidade pública também é um dos assuntos preferidos dos vereadores de Belo Horizonte. Pelo menos é o que mostram os números das últimas legislaturas. Do total de 1,7 mil projetos dos parlamentares que viraram lei nos últimos 11 anos, 532 foram para dar o título às entidades filantrópicas. É quase um terço do total. Só em 2011, 44% (26) das 59 propostas sancionadas pelo prefeito Marcio Lacerda (PSB) com origem no Legislativo tratam do tema. Na Câmara, o que se destaca não é o número de projetos com esse fim, mas o fato de alguns vereadores usarem o artifício para beneficiar suas próprias instituições.
Ao serem reconhecidas como utilidade pública municipal, as entidades ficam aptas a fazer convênios com o governo municipal. Em alguns casos, a declaração pode ser critério de desempate na disputa de recursos. Outra vantagem, válida para as organizações de assistência social e de educação infantil com a declaração, é a isenção do IPTU.
Para explicar o fato de ter se beneficiado, Miguel Corrêa alegou que a indicação da Mudança Já foi simbólica. “Nós fazemos parcerias apenas com empresas privadas que não exigem a declaração”, disse. Mas não foi só nele que despertou o interesse de usar o título em causa própria. O vereador Gunda (PSL) que mantém a Balanço Social e o ex-vereador e deputado federal Luis Tibé (PTdoB) fundador da Valorizar, também estimularam suas ONGs.
A declaração de utilidade pública, segundo o presidente da ONG Valorizar, Leandro Ramon Campos, é cobrada por alguns órgãos para liberar recursos. “Nós recebemos doações da Ceasa porque fomos reconhecidos como utilidade pública”, exemplificou. Fundada em 2007, hoje com sete sedes localizadas em Belo Horizonte e região metropolitana, a entidade apoiada por Luis Tibé – que oferece cursos de capacitação profissional – também está pleiteando o título na Assembleia de Minas. A assessoria do deputado não retornou a ligação e o vereador Gunda, que nega ter uma ONG, disse que prestigiou a Balanço Social por fazer trabalhos importantes à sua comunidade.
Toma lá As entidades que não têm representantes no Legislativo tentam buscar o título nos gabinetes dos parlamentares que recebem em troca apoio político. E as indicações, raramente questionadas, passam despercebidas pelo plenário. Elas contemplam desde entidades de tênis de mesa, de odontologia, clubes de futebol a creches e organizações ligadas à cultura. Dos 174 projetos apresentados de utilidade pública desde 2009, apenas cinco foram rejeitados, sendo que 10 estão em tramitação.
Uma das entidades prestigiadas nesta legislatura foi o Grupo Escoteiro do Ar Padre Eustáquio, que pratica diversas atividades, entre elas astronomia. Segundo o vice-presidente, Sérgio Luiz de Carvalho, o ex-vereador Anselmo Domingos, autor do projeto, não pediu apoio em troca da indicação. Ele ressalta, entretanto, que ao beneficiar a entidade é comum que pessoas ligadas a ela queiram votar no político. Sérgio ressaltou que o grupo, “além de complementar a educação do jovem, pratica ações de cunho social e ambiental”. Ele admitiu que o intuito de conseguir o título de utilidade pública foi para poder receber recursos públicos.
O mesmo objetivo teve a Federação de Triathlon quando requisitou o reconhecimento à vereadora Maria Lúcia Scarpelli (PcdoB). Entretanto, ao contrário do Grupo Escoteiro do Ar Padre Eustáquio, não faz trabalhos sociais, e segundo o presidente, Bruno Khowri, “organizar eventos de esporte é utilidade pública”.