Brasília e Zurique — Se a Fifa começou o dia praticamente demitindo Orlando Silva do comando do Ministério do Esporte, a presidente Dilma Rousseff decidiu encerrar a sexta-feira anunciando que o ministro fica. Pelo menos, por enquanto. E foram vários os motivos que a levaram a agir nessa direção. Primeiro, ela não deseja brigar com o PCdoB, aliado histórico de seu partido, que cerra fileiras em favor do ministro e da tentativa de limpar o nome da sigla em meio às denúncias. Segundo, conforme definiu a própria Dilma, o governo “não condena ninguém sem provas e parte do princípio civilizatório da presunção da inocência. Não lutamos inutilmente para acabar com o arbítrio e não vamos aceitar que alguém seja condenado sumariamente”. Por último, veio a irritação dela com o dirigente da Fifa, Jérôme Valcke, que ontem, pela manhã, praticamente demitiu Orlando. “No meu governo, mando eu”, teria dito a presidente quando soube da declaração de Valcke.
A permanência de Orlando Silva não significa um passe válido por mais três anos e muito menos um sinal de que tudo vai bem no Ministério do Esporte. No Planalto, a permanência é tratada nos bastidores como o cumprimento do ritual, cujo desfecho depende de vários fatores. Durante todo o dia, o que mais se ouviu no Planalto foi que a presidente não agiria pressionada pela imprensa. Mas, na conversa com Orlando, segundo interlocutores do Planalto, Dilma deixou claro que o Esporte precisa de uma reestruturação. Não por acaso, a Controladoria-Geral da União (CGU) passa uma lupa em todos os contratos, em especial, aqueles com ONGs dentro do Programa Segundo Tempo.
Orlando expôs à presidente a mesma indignação que tem manifestado todos os dias a respeito das denúncias de irregularidades e de cobrança de propina: “É inaceitável para mim conviver com qualquer tipo de suspeição. Manifestei para a presidente minha indignação, minha revolta diante desses fatos e ela me sugeriu serenidade e muita paciência, mas afirmou a confiança que tem no nosso trabalho”, disse o ministro. “Ela fez recomendações para que nós continuássemos a trabalhar, continuássemos cumprindo os compromissos e a agenda do ministério”, completou. Orlando não gostou, quando lhe perguntaram se continuaria no cargo, disse que não entendia o motivo da pergunta, uma vez que as denúncias contra ele são “especulações”.
Incógnita
Dilma pretende agora dar o que seus assessores chamam de “uma acalmada” no PCdoB. Desde a semana passada, quando saíram as primeiras reportagens da revista Veja com denúncias de irregularidades no Esporte, o partido deflagrou um movimento em defesa do ministro. E também reagiu de forma veemente, quando surgiu qualquer especulação de tirar o partido do ministério sob a suspeita de corrupção. Todas as reuniões têm se tornado ato de desagravo, como ocorreu ontem no Rio de Janeiro. Hoje, o destino dos dois está praticamente atrelado: se Orlando sair, a tendência da presidente é tirar o ministério do partido.
Se Orlando vai conseguir se firmar nos próximos dias, ainda é uma incógnita dentro do próprio Planalto. Há quem diga que ele tem agora que restabelecer laços e agir rápido na reformulação do Esporte, sacrificando nomes do próprio
PCdoB na estrutura. E ainda melhorar a relação com a Fifa. A declaração de Valcke, secretário-geral da Fifa, ontem em Zurique, foi considerada uma demonstração explícita de oposição à permanência de Orlando Silva no Ministério do Esporte ou, no mínimo, como o responsável por assuntos relacionados à Copa de 2014. Dilma não gostou, mas sabe que não pode manter no comando da Copa alguém sem diálogo com a dona do Mundial.
Valcke parabenizou a presidente Dilma Rousseff por ter escolhido um novo interlocutor do governo brasileiro para tratar dos assuntos relacionados ao Mundial. Ele anunciou ainda que estará em novembro no Brasil para nova rodada de reuniões sobre ajustes na Lei Geral da Copa e conhecer o suposto novo representante da presidente Dilma nas discussões. Deixou claro que considera Orlando Silva carta fora do baralho no que se refere ao principal tema na área esportiva dos próximos três anos. “Em novembro, vou me encontrar com a presidente Dilma e com o novo representante dela que será o novo interlocutor”, afirmou Valcke.
O secretário-geral da Fifa considerou a substituição correta, “independentemente do que acontecer com o ministro”. Na situação de fragilidade de Orlando Silva, bombarbeado por denúncias de corrupção no Programa Segundo Tempo, a declaração, se não ocorreu de forma deliberada para exibir a opinião da Fifa, foi no mínimo um constrangimento para o titular do Esporte.