A festa dos funcionários públicos só ocorreu porque o ministério ignorou recomendações da própria pasta e dos órgãos de controle.Documentos obtidos pelo Estado de Minas revelam a preocupação de técnicos do ministério com o descumprimento da legislação, que estabelece a adoção de medidas para facilitar o acesso às atividades culturais. Por esses pareceres, o dinheiro público deveria financiar eventos culturais que encontram dificuldades de se bancar. Não foi o caso do Rock in Rio. A receita prevista do festival era de R$ 34,2 milhões.
Segundo os próprios organizadores, os números do evento, que aconteceu no mês passado no Rio de Janeiro, surpreenderam. Foram mais de 700 mil pessoas em sete dias. A Instrução Normativa 1 do ministério afirma que “os preços de comercialização dos ingressos devem ser estipulados com vistas à democratização do acesso”. Os valores acima de R$ 190 não se encaixam no perfil, segundo especialistas ouvidos pela reportagem.
Para o ministério, a democratização do festival ficou por conta da distribuição gratuita de 5.042 ingressos destinados a jovens e professores de escolas públicas do Rio de Janeiro, e das oficinas de música. Segundo o secretário Henilton Menezes, que foi ao festival, os ingressos não são considerados presente e, por esse motivo, não há violação da regra que não permite regalos acima de R$ 100. “É uma obrigação que o produtor envie para o ministério, e eles perdem a validade. Adotei então essa metodologia de qualificação. Coloco à disposição para que minha equipe participe do movimento cultural brasileiro. Foi uma decisão minha”, afirma, negando conflito de interesse. “Por que ele vai pagar se é doado por lei?” O secretário sustenta que a prática acontece corriqueiramente e que ele mesmo vai aos eventos – que têm apoio do Ministério da Cultura – de graça. “Sou o secretário de Fomento à Cultura”, disse.
Questionado se a ministra Ana de Hollanda tinha conhecimento da “política de distribuição interna” de ingressos para eventos culturais na pasta, Henilton respondeu: “Ela não sabe de tudo que acontece no ministério”, completando que tem um cargo de confiança que lhe dá esses poderes.
Fiscalização
O projeto do Rock in Rio, enquadrado como “música popular”, foi alvo de diligências desde agosto do ano passado. A equipe técnica encontrou irregularidades no projeto inicial apresentado pela empresa Dream Factory Comunicação e Eventos Ltda. No entanto, a captação de R$ 4,3 milhões foi autorizada em 29 de outubro. Os produtores conseguiram apoio das Lojas Leader, Sky Brasil, Rio de Janeiro Refrescos, Hurgus Comércio e Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, um dos maiores contribuintes, com R$ 1,2 milhão.
Na Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (Cnic), o parecer ressaltava outra irregularidade já apontada pelo TCU: a de que os projetos não apresentavam informações suficientes sobre a proposta. A Cnic apontava que grande parte do orçamento estava destinada à estrutura do evento, incluindo lojas, bares, restaurantes e entretenimento, e não às atividades culturais. Os conselheiros também alertaram que a proposta não apresentava todos os custos do Rock in Rio e incluía despesas proibidas, como passagens de primeira classe e refeições para pessoas que não estavam diretamente ligadas à produção do evento.
A reportagem entrou em contato com a produtora, mas não recebeu resposta até o fechamento desta edição.