Desonerar a folha de pagamento, eliminar impostos estaduais sobre as importações, aumentar a tributação para terras improdutivas e acabar com a guerra fiscal entre estados. Essas são algumas das propostas incluídas nos projetos apresentados no Congresso Nacional nos últimos 15 anos nas tentativas de implementar a reforma tributária. Ao todo, foram cinco textos elaborados pelo Executivo, todos com objetivos parecidos, mas com o mesmo desfecho: as propostas são reduzidas a pequenas mudanças pontuais que não resolvem os impasses do sistema tributário nacional.
“O principal problema é que ninguém quer perder recursos. Nem os estados nem a União. As propostas encaminhadas pelo Executivo definem a redução do ICMS dos estados, o que não é aceito pela maioria dos governadores, e a União também não cede em outros pontos. Por isso ficamos sempre em um grande impasse que já dura um longo período e não temos soluções concretas à vista”, alerta o auditor fiscal e vice-presidente da Federação Nacional do Fisco (Fenafisco), João Marcos de Souza.
No governo Fernando Henrique Cardoso, um projeto foi elaborado logo no segundo ano do mandato e as principais medidas estabeleciam a criação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Servidos (ICMS) federal e isenção de impostos sobre importações. O novo imposto previsto substituiria o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e passaria a incidir sobre produtos que até então não pagavam IPI, como energia elétrica, serviços de telecomunicação e combustíveis. As propostas não foram bem recebidas pelos governadores dos estados que utilizam diferenças nas alíquotas cobradas como forma de incentivar empresas a se instalarem em seus territórios. A falta de consenso fez com que o governo recuasse, deixando a reforma de lado. FHC chegou ao fim do mandato com um projeto chamado “minirreforma” tramitando no Congresso em 2002, com mudanças graduais previstas para poucos impostos.
O sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva, também não conseguiu vencer a batalha de interesses e nas três vezes que enviou propostas de reforma tributária ao Congresso – em 2003, 2004 e 2008 – sofreu derrotas. O discurso repetiu algumas propostas anteriores e buscava atenuar o excesso de impostos sobre a produção e consumo. O último projeto foi enviado como prioridade legislativa para 2008, porém,com a resistência de estados que se consideravam prejudicados com a perda de receita e ausência de uma opção diferente para a arrecadação dos estados, a proposta fracassou novamente, sem apoio de governadores e parlamentares.
Para João Marcos, os repetidos erros na elaboração dos projetos explicam a falta de consenso entre o Executivo federal e os estaduais. “Faltou aos dois presidentes apresentar uma proposta para que a União cumprisse uma das suas obrigações: fomentar o desenvolvimento das regiões menos desenvolvidas por meio de instrumentos como financiamentos e subsídios. Isso faz com que os estados tenham que buscar formas de fazê-lo, o que culmina em renúncia de impostos estaduais e criam uma briga entre eles. Se os benefícios fossem dados pela União, isso poderia ser evitado”, afirma o auditor.
Proposta atual
Os dois pontos principais da proposta elaborada pela presidente Dilma – apresentados em discursos e entrevistas em que a petista discute o tema – preveem a simplificação do ICMS – medida recorrente nas propostas apresentadas anteriormente – e a desoneração da folha de salários e investimentos empresariais. A intenção do governo federal é fortalecer as empresas, reduzindo os custos com funcionários e incentivando novos empreendimentos. No entanto, alguns pontos referentes à revisão na incidência da tributação não foram tratados na proposta e especialistas não perdoaram.
“Hoje, existem possibilidades de que alguns pontos sejam discutidos com mais consenso, mas a reforma integral não costuma entrar nem nas negociações. A proposta de Dilma trouxe apenas mudanças pontuais de forma incompleta e pouco detalhada até o momento. O que precisamos realmente é cobrar mais de quem ganha mais, por meio da taxação de renda e do patrimônio, e não apenas com ônus sobre o consumo, que acaba afetando todas as pessoa independentemente da classe econômica”, cobra o vice-presidente do Fenafisco.
Textos sem efeito
Fernando Henrique Cardoso (PSDB) – 1996 e 2001*
» Eliminação da incidência do imposto estadual sobre exportações
» Tributação maior das terras improdutivas
» Transformar o ICMS e o IPI em impostos sobre consumo
» Implementação do imposto de consumo, cobrando-o no local da produção, para evitar sonegação e redistribuindo automaticamente a receita para os estados de destino da mercadoria
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – 2003,2004 e 2008*
» Tributação do ICMS preponderantemente nos estados de destino sem aumentar a evasão
» Tributação seletiva, com alíquotas elevadas, de fumo e bebidas
» Implantação de um sistema de compensação entre as empresas para resolver o problema do acúmulo de créditos tributários
» Desoneração gradual dos investimentos, pela redução do prazo requerido para a apropriação dos créditos de impostos pagos na aquisição de máquinas e equipamentos
» Ampliação da desoneração da cesta básica
Dilma Rousseff (PT) – 2011*
» Em declarações durante a campanha e no primeiro semestre deste ano, a presidente afirmou que pretende enviar propostas fracionadas para uma reforma tributária, de forma que cada ponto seja mais bem discutido pelos parlamentares. Não existem, no entanto, detalhes sobre os projetos que serão levados ao Congresso, e o assunto ainda é tema de reuniões com governadores. O Ministério da Fazenda – procurado para comentar o assunto – preferiu não se manifestar ou informar em que pé estão as discussões sobre a proposta.