Brasília – Nos canteiros das obras ligadas à Copa’ 2014, os cronogramas de execução permanecem em atraso, mas o Tribunal de Contas da União (TCU) se antecipa para apertar o cerco aos desvios de recursos e superfaturamento de contratos. Prevendo que o Brasil sofrerá os mesmos problemas enfrentados pelo último anfitrião na organização da competição, o TCU firmou acordo com a Auditoria-Geral da África do Sul para mapear todos os ralos por onde escoaram recursos públicos no país e assim tentar prevenir os erros na Copa que acontecerá no Brasil.
Com o argumento de fomentar as relações institucionais durante os jogos, entes do governo gastaram milhões na compra de entradas para os jogos, mas só depois da Copa os auditores detectaram a irregularidade. Atento ao problema africano, o tribunal já estuda medidas para alertar o governo sobre esse tipo de comportamento, quando 2014 chegar.
Auditoria realizada na África do Sul depois da Copa do Mundo identificou despesa de U$ 1,8 milhão da estatal de petróleo — com modelo administrativo semelhante ao da Petrobras — para a compra de mais de mil ingressos que seriam distribuídos aleatoriamente entre funcionários, clientes, autoridades e artistas.
Aditivos Para não ser pego de surpresa, o TCU também está interessado no plano de gestão dos empreendimentos da Copa realizado pela África do Sul. Relatos preliminares indicaram que o atraso nas obras gerou fator inesperado quando a data da competição se aproximava. Pressionadas pelo governo para entregar estádios e estrutura de transporte no tempo certo, as empresas contratadas ganharam poder de barganha para “trocar” a celeridade do trabalho por aditivos de contrato. O governo ficou refém da “chantagem” das empreiteiras, pois às vésperas da Copa não poderia correr o risco de parar a obra para selecionar outra empresa.
Em troca da radiografia feita pela órgão africano que corresponde ao TCU no Brasil, os ministros do tribunal se comprometeram a fechar acordo de cooperação para trocar métodos de auditagem de recursos públicos e apoiar a fiscalização.
O “encalhe” dos estádios construídos por meio de parcerias público-privadas também é um problema que preocupa auditores e administradores brasileiros. Na África do Sul, pelo menos cinco das 10 arenas construídas não tiveram viabilidade econômica para pagar o financiamento e se transformaram em onerosos fardos para o governo conservar.
Vigilância será modificada
O governo vai mudar a legislação que regulamenta a segurança privada para poder melhorar a fiscalização nos estádios da Copa. O Ministério da Justiça se reuniu com vigilantes para colher sugestões sobre o novo modelo de atuação das empresas de segurança, que hoje têm um efetivo maior que o das polícias estaduais e federal. A intenção é promover a integração entre o setor privado e público, principalmente na fiscalização de pontos considerados sensíveis, como no policiamento de ruas e na coleta de informações que possam auxiliar as forças governamentais.
A lei que regulamenta a segurança privada no Brasil vai completar três décadas e não acompanhou a modernização do setor, segundo o ministro da Justiça em exercício, Luiz Paulo Barreto. Na quarta-feira, ele esteve em um encontro com a categoria, onde foi discutido o novo modelo que será utilizado no Brasil, visando principalmente a Copa de 2014. Os estádios, por determinação da Fifa, terão vigilância de empresas particulares, enquanto que na área externa a segurança será do Estado. Mas as medidas que o governo pretende adotar devem ser mais abrangentes. “Temos que fazer uma regulamentação que reestruture a segurança privada, cuja lei ainda é de 1983”, observa Barreto.
Além disso, o Ministério da Justiça pretende mudar a grade curricular dos vigilantes, tornando os procedimentos mais rígidos. Hoje, além do curso de formação, os seguranças privados devem ter extensão e reciclagem, que incluem formação em equipamentos, escolta armada, defesa pessoal, entre outros. “A intenção também é acabar com a clandestinidade”, diz o ministro.
Monitoramento
Confira os problemas que a África do Sul enfrentou e o que o TCU pretende se antecipar e evitar a ocorrência de irregularidades:
- Aditivos
O atraso no cronograma das principais obras, de transporte e construção de estádios deu às empreiteiras responsáveis o poder de barganhar pelo pagamento de aditivos, aumentando o preço final do empreendimento. Como o governo da África do Sul não podia se dar ao luxo de suspender contratos ou abrir novas concorrências, ficou submetido à “chantagem” das empresas de engenharia.
- Elefante branco
No modelo de parceria público privada adotado, o financiamento das obras por parte dos estados veio de recursos públicos. Os entes, no entanto, tiveram que pagar a conta do financiamento depois da entrega dos estádios. A dívida pesou no orçamento e pelo menos metade dos estádios tornou-se um fardo para a administração pública sul-africana.
- Ingressos
Além de enfrentar os grandes “cambistas”, que compraram a maior parte dos ingressos antes mesmo das competições, a África do Sul teve problemas com gastos irregulares de recursos orçamentários por parte de estatais que investiram verbas públicas na aquisição de entradas para os jogos, para distribuir para funcionários ou em ações promocionais.