Sócio do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), Eduardo Szazi também acredita que o prazo dado para a prestação de contas foi muito curto, o que pode criar uma situação de favorecimento de ONGs dentro dos ministérios. “Na pior das hipóteses, como a retomada da liberação de recursos depende da avaliação das prestações de contas, que estarão acumuladas ‘aos montes’, o decreto induz o aumento do ‘tráfico de influências’ nos gabinetes ministeriais”, disse.
Relatório das contas do governo em 2010, aprovado em junho pelo Tribunal de Contas da União (TCU), mostra que o principal problema na avaliação de convênios não está na omissão de entidades em prestar contas, e sim na lentidão dos gestores para avaliá-las. Enquanto 2.780 entidades deixaram de entregar documentação para análise, 42.963 convênios aguardavam fiscalização no final do ano passado, com um atraso médio de seis anos e dez meses para análise dos papeis.
Silvia Picchiono, representante do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Fboms), vê irregularidade no próprio decreto e diz que as entidades que representam as ONGs estão analisando a possibilidade de contestar a norma na Justiça. “O decreto tem caráter de ilegalidade porque está questionando um instrumento jurídico institucionalizado chamado convênio. Se tudo estava errado, como estão presumindo, como o convênio foi liberado?”, indaga.
Apesar da posição contrária à suspensão do repasse de verbas, os representantes de ONGs são favoráveis à devassa nas contas, pois acreditam que, de fato, há grupos que se escondem atrás dessas organizações para agir de forma ilegal. Uma das críticas diz respeito à falta de distinção entre as várias categorias de entidades sem fins lucrativos, como partidos, clubes recreativos e entidades comunitárias. “Essas ONGs picaretas, 99,9% são de partidos políticos ou de políticos. A devassa já deveria ter sido feita há mais tempo”, disse Picchiono.
De acordo com a representante da Fboms, a suspensão dos recursos colocou em suspeita a atuação de ONGs no momento em que elas se mobilizam para discutir o novo marco regulatório das organizações da sociedade civil. “Estávamos trabalhando em um seminário para novembro com a Presidência da República a fim de debater esse assunto. Queremos mais ética, e uma das coisas que defendíamos é a dupla criminalização de quem faz falcatrua com ONGs. Por exemplo, se a pessoa perde direitos políticos por oito anos, deveria perder por 16 anos. Esse decreto veio na contramão do movimento”, declarou.
Para o diretor executivo da Transparência Brasil, Claudio Abramo, o decreto do governo foi acertado, pois é uma maneira de adequar a forma como os convênios são feitos. “As regras são definidas de acordo com as vulnerabilidades que são encontradas. O papel principal de um decreto como esse não é falar 'pega ladrão', é identificar os problemas para sanar depois, regulamentando mais profundamente a questão do convênio”.
Ele também acredita que os órgãos de controle, como o TCU e a Controladoria-Geral da União (CGU), teriam muita dificuldade para fiscalizar os cerca de cem mil convênios, mas que para os ministérios esse não é um trabalho impossível.